Darwin e seu materialismo filosófico


Quem já leu "A Origem das Espécies" deve ter notado que ali Darwin passou comodamente ao longe das implicações de sua teoria com o homem. Contudo, em “A Origem do Homem” e "A Expressão das Emoções em Homens e Animais" neste ele penetra na questão e, aí, suas opiniões deixam pouca margem de dúvida”. A ideologia materialista entrou de vez no "cardápio indigesto" de Darwin.
Muitas pessoas, talvez por não terem tido a oportunidade de conhecer esse "outro Darwin" sem louros e auréolas, ou mesmo por puro dogmatismo, imaginam que o naturalista inglês elaborou seus conceitos sem conceitos pré-estabelecidos, o que é uma tremenda inverdade. Stephen Jay Gould, por exemplo, escreve abertamente sobre isto, em seu "Darwin e o Grandes Enigmas da Vida". Darwin aplicou o seu materialismo filosófico cabalmente, sem reservas, cousa que Wallace jamais ousou fazê-lo. Vejamos o Gould:
“Dois extraordinários livros de anotações de Darwin podem conter a resposta para texto e comentários mais extensos (veja H. E. Gruber e P. H. Barrett, Darwin on Man). Os chamados M e N notebooks foram escritos em 1838 e 1839, enquanto Darwin reunia as notas que formariam a base para seus ensaios de 1842 e 1844. Neles se acham os pensamentos de Darwin sobre filosofia, estética, psicologia e antropologia. Ao relê-los, em 1856, Darwin classificou-os como "cheios de metafísicas sobre a moral". Muitas de suas declarações mostram que esposava mas temia expor princípios de algo que sabia ser muito mais heretico que a própria evolução: o materialismo filosófico — o postulado de que a matéria é tudo na existência e de que todos os fenóômenos mentais e espirituais são subprodutos dela. Nenhuma noção poderia ser mais inquietante para as arraigadas convicções do pensamento ocidental do que a declaração de que a mente — por mais complexa e poderosa que seja — é um simples produto do cérebro.
As notas provam que Darwin se interessava por filosofia e que estava ciente de suas implicações. Sabia que a principal característica a distinguir sua teoria de todas as outras doutrinas evolucionistas era seu inflexível materialismo filosófico. Outros evolucionistas falavam em força vital, dirigismo histórico, luta orgânica, e na irredutibilidade essencial da mente — uma armadura de conceitos que a cristandade tradicional podia aceitar como meio-termo, já que permitia a um Deus cristão trabalhar pela evolução, e não pela criação. Darwin falava apenas em variação ao acaso e seleção natural. Nas notas, Darwin aplicou resolutamente seu materialismo à teoria da evolução de todos os fenômenos da vida, inclusive ao que ele próprio chamou de "a própria cidadela" — a mente humana. [...] Num de seus llvios sobre transmutação, ele escreveu:“Amor pelo efeito deificador da organização, ó materialistas! ... Por que o pensamento, sendo uma secreção do cérebro, é mais maravilhoso que a gravidade, uma propriedade da matéria? Por nossa arrogância, por nossa auto-admiração."
Essa crença era tão herética que Darwin chegou a contorná-la em The Origin ofSpecies (A Origem das Espécies, 1859), onde aventurou-se apnas ao crítico comentário de que "a origem do homem e sua história será esclarecida". Só trouxe suas crenças à luz quando não pode escondê-las mais, em Descent of Man (A Descendência do Homem, 1871) e em The Expression of the Emotions in Man and Animais (A Expressão das Emoções em Homens e Animais, 1872).Alfred Rusell Wallace, o co-descobridor da seleção natural, nunca foi capaz de aplicá-la à mente humana, por ele considerada como a única contribuição divina à história da vida".
Fonte:
Stephen Jay Gould. “Darwin e os Grandes Enigmas da Vida". Editora martins Fontes. São paulo, p. 13, 14.

É claro! Isso não implica em dizer que Darwin elaborou suas premissas sobre evolução apenas mediante conceitos filosóficos, no entanto, fica mais que evidente a intenção dele em incluir no bojo da "ciência" sua visão pessoal da vida e de tudo que a ela se relaciona. Pode-se, portanto, desconhecer tal fato, porém, ignorá-lo não pode ser menos indícios de ignorância.

É isso!

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