O Anti-semitismo da Ação Integralista Brasileira (A.I.B.)

O Perigo Judaico: Os “Protocolos” para a dominação mundial

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O Anti-semitismo não é um tema que seja consensual entre os ideólogos integralistas. Dentre os ideólogos do integralismo, Gustavo Barroso foi o principal difusor das idéias anti-semitas, sua obra é praticamente voltada para a questão “judaica”, contudo, sua obra não possui o caráter teórico de Plínio Salgado e Miguel Reale.

Embora a maioria dos ideólogos do integralismo criticassem a posição de Barroso em relação ao “problema judeu”, invariavelmente não renegavam a “questão judaica”, e sim o radicalismo em que Gustavo Barroso baseava seu anti-semitismo. Pode-se afirmar, ainda, que em maior ou menor grau, todas as correntes do integralismo apontavam para a questão judaica, seja como “conspiração” mundial promovida pelos judeus para a dominação do mundo (como afirmava Barroso), ou apenas como membros da especulação internacional de capitais (como a encontramos em citações de Plínio Salgado e Miguel Reale).

Aparentemente estas diferenças “teóricas” sobre a questão judaica não geravam desarmonia entre a posição de Barroso e os demais intelectuais. Trindade aponta a publicação de um texto de Plínio Salgado, que faz frente ao radicalismo de Barroso, em que desconsidera o anti-semitismo dentro do integralismo. Contudo, Gustavo Barroso continua publicando obras com conteúdo anti-semita. Na mesma época da “carta aberta” de Salgado em que supostamente vai contra o radicalismo de Barroso, são publicados textos no jornal A Offensiva com conteúdo explicitamente contra os judeus. Além disso, Salgado publica uma matéria em que faz referências aos Protocolos dos Sábios de Sião, traduzido por Barroso.

Mas como já afirmamos, Gustavo Barroso é o principal anti-semita do movimento. Roney Cytrynowicz nos dá uma visão sobre o posicionamento deste líder integralista:

O anti-semitismo é elemento central presente de forma central nos textos integralistas de Barroso. A denúncia contra uma suposta conspiração que dominaria o mundo e manipularia todos os acontecimentos repete-se permanentemente em quase todos os livros dele no período. Mais do que comparecer como mais um tema, como o anticomunismo e anticapitalismo, a idéia da conspiração é o que dá nexo, inteligibilidade às idéias de Barroso.

Em quase todos os livros e artigos publicados por Barroso durante o período em que foi membro da AIB (1933-1937), aparecem referências a essa suposta conspiração judaica e também ataques do autor aos judeus. Além disso, Gustavo Barroso foi o tradutor do livro Os Protocolos dos Sábios de Sião, considerado a “bíblia” antisemita, que tem por tema básico a hipótese da conspiração judaica para dominar o mundo.

Esse livro foi editado no final do século XIX, pela polícia do Czar da Rússia. É dirigido à direita russa, à aristocracia fundiária contra as reformas modernizantes do Czar da Rússia. Os “Protocolos” pretendem ser um documento apresentado por uma organização judaica secreta a uma reunião de judeus. Seus capítulos supostamente detalham os meios que devem ser utilizados para conseguir o domínio do mundo. Os primeiros nove capítulos são uma “descrição” dos métodos a serem empregados através da economia, da política, da ciência e da imprensa. Os outros quinze capítulos mostram como seria o mundo sob esse “controle judaico”.

A tradução feita por Barroso, a partir da versão do escritor francês Roger Lamberlin, acrescenta três partes aos “Protocolos” originais: “A autenticidade dos ‘Protocolos dos Sábios de Sião’, por W. Creutz”, “O perigo judaico, por Roger Lanberlin” e “O grande processo de Berna sobre a autenticidade dos ‘Protocolos’ – Provas documentais por Gustavo Barroso”.

No capítulo acrescido por Barroso, o autor defende a autenticidade do documento, atacando e acusando aqueles que duvidassem da autenticidade dos “Protocolos”. “A autenticidade dos ‘Protocolos’ não pode ser impugnada por perícia alguma, salvo que seja feita por judeu ou pessoa de má fé”.

Barroso, para provar a autenticidade do documento, utiliza os acontecimentos mundiais ocorridos entre 1901 e o período de sua tradução como comprovações de suas afirmações.

Ora, basta ler os ‘Protocolos’ e passar em revista os acontecimentos mundiais daquela data até hoje para se ver que todos coincidem com o que está escrito. Como os ‘Protocolos’ não podiam adivinhar o que se ia passar, sobretudo a guerra e o desemprego, é lógico que tudo isso foi preparado pelos judeus.

Não há necessidade de prosseguir apresentando dados apresentados pelo autor, pois eles seguem a lógica de que “tudo que for contra os ‘Protocolos’ é uma ação judaica e por isso não merece crédito”. O que interessa desta obra é a influência que exerceu sobre Gustavo Barroso em toda a sua produção literária nos anos de 1930, principalmente na questão da “conspiração para a dominação mundial” por parte dos judeus.

Para Gustavo Barroso, tanto o comunismo quanto o capitalismo, eram táticas utilizadas pelos judeus para destruir a pátria e os valores cristãos, ou seja, não passariam de ardis criados pelo suposto complô judeu para dominar o mundo.

No livro A palavra e o pensamento integralista, Barroso nos mostrou sua visão sobre o comunismo.

O comunismo marxista não passa hoje de simples doutrina de exportação, propagada por alguns judeus em vários países com o fito de levá-los à ruína e à desordem, como se vê em Cuba. Enquanto isso, os especuladores vão ganhando nas altas e baixas das bolsas e da produção, sem a menor piedade para os cristãos espoliados, até que se estabeleça a famosa ‘ditadura do proletariado’, por traz do qual o capitalismo judaico, tornado capitalismo de Estado, exercerá o poder.

Coloca como inimigos do povo e da civilização ocidental o liberalismo, o capitalismo internacional e principalmente o comunismo em conjunto com o suposto complô judeu e maçom.

Mas qual era a origem do comunismo? Para Gustavo Barroso, era uma questão de “escala evolutiva”:

Existe o comunismo porque o socialismo o permitiu; que o socialismo apareceu porque o liberalismo lhe abriu as portas; que o liberalismo nasceu do enciclopedismo e o enciclopedismo veio da reforma e do renascimento [...]. E sabe mais que, na raiz desta árvore genealógica da filosofia moderna, em função das organizações político sociais, está oculto o sapo do judaísmo, babando a baba destruidora sobre o mundo cristão.

Ou seja, para a “corrente” do integralismo de Barroso, a origem de todos os “males que afligem o mundo” cristão é o judaísmo, que a partir dos seus “tentáculos” exerceriam a sua influência “malévola” pelo mundo.Os “malévolos” judeus supostamente estavam sempre agindo nas sombras contra o povo cristão e contra o Brasil, sempre ligados à destruição, a guerras e a crimes. Criava-se todo o imaginário do perigo judeu. Acusava-se as ações comunistas como tendo sido arquitetada por judeus, como é o caso da “Intentona Comunista” em 1935, da qual “pode-se aduzir o libelo do ministro Goebbels, que o chefe de Luis Carlos Prestes, de Agildo Barata e dos revolucionários de novembro de 1935, no Brasil, era o judeu Harry Berger”.

Além de Barroso, uma parte significativa dos integralistas considerava que todos os adversários do integralismo formavam um bloco sob a dominação judaico-comunista. Essa tendência “anti-semita/anticomunista” embora não seja dominante entre os teóricos do integralismo por razões de princípio ou tática política, era, no entanto, muito difundida entre os militantes de base em função da simplicidade de seu esquema explicativo: desde as revoluções francesa e soviética, até o controle das finanças internacionais, tudo era dirigido pela ação judaica.161 O pensamento de Barroso não é predominante no conjunto teórico do movimento, mas podemos encontrar intelectuais influenciados por sua obra, como é o caso de Anor Butler Maciel, no Rio Grande do Sul, e Oswaldo Gouvêa, no Rio de Janeiro.

Nos jornais, o anti-semitismo representou 8,17% das matérias e referências. Embora esse dado não seja expressivo se comparamos com antiliberalismo e anticomunismo, ele está presente, mesmo que de forma diluída em todos os títulos de jornais.

Grande parte das matérias seguem o “padrão” da obra teórica de Barroso, sobre a conspiração para dominação mundial. Contudo, a forma mais comum que encontramos foi a vinculação do judaísmo à questão do cinema, principalmente o norte-americano. O autor do livro Os judeus do cinema, Oswaldo Gouvêa teve um papel de destaque nos principais jornais integralistas, como A Offensiva, A Razão e Século XX, onde possuía uma coluna de uma página inteira, além ter a propaganda de sua obra publicada de forma sistemática.

Dentre os órgãos de imprensa integralistas, aquele que teve a maior influência anti-semita foi o jornal Século XX
, do Rio de Janeiro, com circulação apenas local. Gustavo Barroso é o autor de muitos textos, assim como Oswaldo Gouvêa."

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Fonte:
Rodrigo Santos de Oliveira: “Perante o Tribunal da História”: o anticomunismo da Ação Integralista Brasileira -1932-1937". (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História da Pontifícia Universidade Católica d Rio Grande do Sul - PUC, como requisito parcial e último para a obtenção do grau de Mestre em História, sob a orientação do Professor Doutor René Ernaini Gertz). Porto Alegre - RS, 2004.

Nota
:
O título e a imagem inseridos no texto não se incluem na referida tese.
As referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada.

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