ISOLAMENTO E ADPATAÇÃO EM EUCLIDES DA CUNHA
“Não tive intuito de defender os sertanejos, porque este livro não é um livro de defesa; é, infelizmente, de ataque”. Em Notas à 2ª edição de Os Sertões (1902), Euclides da Cunha responde aos críticos de forma veemente sobre o teor mais geral do livro que não fazia muito escrevera. O sucesso do livro, inesperado até para o próprio Autor, mostra o clima em que fora recebido à época retrato tão revelador do que acontecera em Canudos. Passava-se a limpo um dos acontecimentos mais contundentes da sociedade brasileira, a qual revelava o lado mais chocante de seu atraso. A campanha de Canudos fora assim vista como uma missão, tomados por todos aqueles que se incubiram de derrotar o que teria de mais retrógrado nessa sociedade, como se na degola daqueles fanáticos, expediente de horror comum durante a guerra, como nos narra Euclides da Cunha, sucumbisse também a cultura por eles encarnada. Não à toa, o massacre pelo qual ficou conhecida a guerra de Canudos (1896-1897), quando já finda esta, tomou em cheio a opinião pública, entre políticos, integrantes das forças armadas e estudantes. “É essa reviravolta de opinião que Os Sertões expressará cinco anos mais tarde, quando de sua publicação, vindo a ser o maior mea culpa da literatura brasileira” (Galvão, 2009: 33).
O cotidiano chocante da guerra vivido de perto não poderia deixar de impressioná-lo, vendo na resistência do sertanejo sinal eloqüente de sua vitalidade: se por um lado, filia-se aos paradigmas científicos baseados na raça para definir a “moralidade rudimentar” para definir o sertanejo, por outro lado, toma-o como representante maior de nossa nacionalidade, “inegavelmente, o tipo de uma subcategoria étnica já constituída” (Cunha, 2001: 199-200). Espécie de tensão permanente no texto, expressando ao mesmo tempo uma peculiaridade da narrativa e um movimento do contexto intelectual da época (Abreu, 1998; Lima, 1997; Lima, 2002), “Euclides não podia deixar de sofrer os influxos de sua época, isto é, de ter a consciência dividida entre as tendências de um romantismo imaginativo e as de um naturalismo ainda pululante. Colhido pelas tensões e conflitos irresolúveis desses dois mundos díspares, o escritor procura diminuir os efeitos dessa aparente contradição optando por uma conciliação entre eles” (Bernucci, 1998). O resultado é uma narrativa que se integra de modo conflitivo, fazendo com que as diferentes referências intelectuais tomadas pelo Autor sejam sempre relativizadas sem, no entanto, se anularem. “Tudo se passa sob as espécies de um simpósio cujos convivas estão ausentes mas em que suas idéias em entrechoque os substituem em presença viva nas páginas do livro. Às vezes controlando-as, às vezes perdendo o controle delas, a todas essa vozes sobrepõe-se a voz do narrador na primeira pessoa de um plural majestático” (Galvão, 2009: 37).
O recurso discursivo do texto é a intertextualidade, marca desse polifonismo que faz com que o narrador lance mão de diferentes teorias e idéias de forma não-conclusiva. Sentidos de categorias opostas se invertem, resultando, de forma surpreendente, num retrato cheio de planos cruzados, em que, no maior deles, o horror caracterizado pela tomada de Canudos é elucidativo das maiores atrocidades da civilização. Civilização se transmuta em barbárie. Condenada à civilização, Canudos se tornara símbolo de resistência, de valores mais altos; de bárbaros à expressão de nossa nacionalidade.
Tomando então este recurso estilístico de Os Sertões, não resta dúvida de que o empreendimento de que nos propomos para a atual seção, qual seja, a de perscrutar a caracterização do Sertão e do sertanejo em Euclides da Cunha, imiscui-se assim a uma série de problemas. Alguns deles nos remetem à própria imbricação de diferentes idéias e teorias reunidas numa linguagem científica muito própria, na qual raça, clima, morfologia, compõe um quadro complexo, ambíguo, mas ao mesmo tempo elucidativo da vida do sertanejo. No entanto, a meu ver, - e sem com isso querer esvaziar de conteúdo qualquer determinismo da obra -, Euclides da Cunha formula uma interpretação em que a ciência não caminha sozinha, unindo-se a uma visão mais estética de composição argumentativa, na qual “a ilusão das coisas enriquece o texto pela sua capacidade sugestiva” (Bernucci, 2001: 24). E, ainda que sua dupla inserção, científica e literária, tenha “distintas eficácias”, há de se considerar “que os desenvolvimentos centrais não podem ser deslocados e considerados senão em sua ordem integral e condicionadora (...), ao passo que as passagens-ornatos podem-se desviar de sua inserção original e, sem aparente prejuízo, ser transferidas para alguma seleta de literatura pátria” (Lima, 1997: 140). Assim, ao contrário do que se poderia argumentar, ao invés de tomarmos os fundamentos da “ciência poetizada” (Zilly, 1999) empreendida por Euclides da Cunha, e de sua linguagem polifônica, como empecilhos de uma discussão de alguns aspectos de sua “sociologia desconcertante” (Lima, 2002), tomamos como uma perspectiva complexa, que confere mesmo força à uma análise extremamente sugestiva. Por isso, e tida como obra paradigmática de um esforço primeiro de compreensão sociológica do mundo rural (Candido 2006; Jackson, 2003; Pereira de Queiroz, 1973a), propomos retomá-la na tentativa de elucidar alguns aspectos analíticos pertinentes em trabalhos sociológicos posteriores – ainda que alçados a um status de trabalhos científicos.
Em que pese o valor atribuído à raça e ao meio por Euclides da Cunha na estrutura argumentativa de Os Sertões, permanece de elucidativo a sua original análise da formação de uma população que, esboçada no interior do país, isolada do litoral e da influência e afluências do mundo civilizado, formatou uma notável adaptação ao meio a partir de um tipo étnico e social bem específico: o sertanejo, “núcleo de força da nossa constituição futura, a rocha viva da nossa raça” Cunha, 2001: 788). A composição de Euclides da Cunha do homem do sertão é uma simbiose delicada entre raça, clima e geografia, que permanece viva desde o assentamento dessa população no interior, deixando no homem sua marca de origem. Origem instável que se revela mesmo no processo de ocupação e adaptação à região, e nos seguidos cruzamentos raciais entre, principalmente, o índio e o branco português colonizador, cuja origem “nos liga à vibrátil estrutura intelectual do celta” (Ibidem: 153).
A começar pela terra, onde “o regime desértico ali se firmou, então, em flagrante antagonismo com as disposições geográficas: sobre uma escarpa, onde nada recorda as depressões sem escoamento dos desertos clássicos”. Sua exploração é uma aventura a uma “terra ignota”, sacrificada pela instabilidade do clima, poderoso adversário do assentamento de grupos humanos. Paroxismos de calor e frio no transcorrer das horas “num intermitir inaturável de dias queimosos e noites enregeladas” (Ibidem: 103), torna-se um flagelo para aqueles que se aventuraram a explorar e habitar esta região. Nela tudo se revolve em direções contrárias, em permanente conflito. Assim como os homens, assegura Euclides da Cunha, a fauna e flora do Sertão também devem lutar para sobreviver:
A luta pela vida que nas florestas se traduz como uma tendência irreprimível para a luz, desatando-se os arbustos em cipós, elásticos, distensos, fugindo ao afogado das sombras e alteando-se presos mais ao raios do sol do que aos troncos seculares – ali, de todo oposta, é mais obscura, é mais original, é mais comovedora. O sol é inimigo que é forçoso evitar, iludir ou combater (Ibidem: 177)
É a seca representativa e resultado desta destemperança e instabilidade. Além da geologia, da movimentação dos ventos e do próprio clima inóspito, o homem, “agente geológico notável”, que apegado ao nefasto “legado indígena” do fogo, “assumiu, em todo o decorrer da História, o papel de um terrível fazedor de desertos” (Ibidem: 138). Ausente um “regime contínuo, favorecendo flora mais vivaz” (Ibidem: 138), a natureza e o homem se deprimem até no horizonte surgirem nuvens volumosas fazendo precipitar “a tormenta”. Desse instante, nutrem-se flora e fauna, restabelecendo a vida, “mutação de apoteose” (Ibidem: 127). O Sertão combalido pelas suas próprias forças ressurge em “Paraíso”, “ao sobrevir das chuvas, a terra (...) transfigura-se em mutações fantásticas, contrastando com a desolação anterior” (Ibidem: 135); “da extrema aridez à exuberância extrema ...” (Ibidem: 137). Este desafogo, que se diga, tão esperado e tão temido: as chuvas ao mesmo tempo em que fazem reviver o Sertão o debilita, o desabriga dos verões seguintes, desnuda a terra “mal protegida por uma vegetação decídua”, que não retêm a água e não faz do instante de vida trazido pela tormenta fato contínuo. “O regime decorre num intermitir deplorável, que lembra um círculo vicioso de catástrofes” (Ibidem: 146).
Conjunção de fatores que fazem daquela região uma habitat hostil e desolador, em que “a natureza se compraz em um jogo de antíteses” (Ibidem: 135), difícil de ser solvido, que combali o homem e faz da sua existência uma luta:
ampla, abrangendo a economia geral da Vida. Nasce do martírio secular da Terra ... (Ibidem: 147)
“Martírio” que marca a relação entre homem e natureza, e das forças que colocam em movimento cada elemento do Sertão. Clima, geografia e homem: três fatores que se coadunam e estabelecem - poderíamos dizer – uma civilização do sertão, onde até mesmo fatores naturais refletem aquele tipo de experiência instável mais geral que marca a fundo o sertanejo. Afrontado pelas forças naturais, poderio contra o qual luta para fazer frente, “o sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral” (Ibidem: 207). Em conseqüência disso, poder-se-ia dizer, o sertanejo desenvolveu um tipo próprio de organização social no embate dessas forças, criando um vínculo com a terra, talvez vínculo único no Brasil. Sem poder controlar “essa espécie de força catalítica misteriosa que difundem os vários aspectos da natureza”, o sertanejo na sua astúcia soube com elas lidar, fixando-se ao solo e, ao contrário do que se poderia imaginar, formatando uma “civilização autóctone”, distante do litoral, e por este abandonada. Abandono que teve por fim uma função benéfica, pois, nas palavras do Autor, “libertou-os da adaptação penosíssima a um estádio social superior, e, simultaneamente, evitou que descambassem para as aberrações e vício dos meios adiantados” (Ibidem: 203); daí ser o sertanejo, na avaliação de Euclides da Cunha, um retrógrado, não um degenerado. Sua cultura e organização é força, imposição mesmo do meio que o circunda. Sem poder dominá-lo, o que o faria incluir na marcha do progresso, soube o sertanejo ao menos tirar do meio força para sobreviver, estipulando uma relação precária e marcada por solavancos de crise.
Alia-se, assim, num movimento cheio de tensões e desequilíbrios a adaptação do sertanejo ao Sertão. Adaptação favorecida basicamente pelo isolamento sócio-econômico que no transcorrer da formação e organização do grupo sertanejo significou também um isolamento cultural. Nesse intercruzamento de fatos e circunstâncias históricas ressalto a importância que o isolamento, como condicionante de adaptação do homem ao Sertão, significa na elaboração condizente da organização social.
Em suma, podemos dizer que o isolamento, tomado menos pelos seus efeitos estilísticos e como recurso retórico e mais pela chave cognitiva de interpretação da formação do sertão, teve assim uma dupla função, e de certa forma, de conseqüências favoráveis ao homem sertanejo: primeiro, que o forçou ao contato íntimo com a morfologia e o clima desta zona às vezes tão inóspita, elaborando meios próprios de adaptação às suas intempéries, criando, com isso, uma organização sócio-econômica mínima para sobreviver (Candido, 2002). “A população inicialmente heterogênea do sertão, de três raças de origem, fundiu-se, através de um processo de múltiplos cruzamentos, para formar um povo relativamente unido, sem ser perturbado” (Zilly, 1999), tornando possível inclusive a ocupação permanente daquela região. Segundo: o isolamento os privou de um contato, dada a fragilidade dessa adaptação, de todo maléfico com a civilização artificial do litoral, que os levaria invariavelmente a degenerescência moral. Nesse longo processo de adaptação, o contato com o litoral se converteria em mais um obstáculo, senão em impedimento completo do estabelecimento do sertanejo.
Alguns outros fatores concorreram para esse isolamento. Historicamente, segundo Euclides da Cunha, contingências políticas e demográficas próprias do empreendimento colonizador português não fizeram da nova colônia, num primeiro momento, um atrativo econômico, o que fez com que a distribuição da população no território se desse de modo errático, seguindo os rumos da exploração. E mesmo posteriormente, quando o Brasil se tornou a principal colônia, a exploração e povoação do território não foram uniformes. O movimento populacional continuaria sendo guiado exclusivamente pela aferição de lucros, fazendo a Metrópole sua presença mais marcante nas regiões de maior produção. A feudalização do território e o descaso da política metropolitana, absorta num primeiro momento com a “Índia portentosa”, teve como conseqüência não só o isolamento do sertanejo, mas a divisão, ressoante na história do Brasil, entre o Norte e o Sul, cada qual estabelecendo uma relação com a terra e uma organização social específica.
No entanto, deixada a Colônia seguir seus próprios desígnios de exploração do território, e sem qualquer tipo de planejamento central, inverte-se esse primeiro movimento de colonização da Metrópole, e o que antes seguia um rumo, distanciando Norte e Sul, agora os une por meio de entradas território adentro. Na figuração utilizada por Euclides da Cunha o Tiête – representando, com sua imponência, a penetração colonizadora paulista – e o São Francisco – lócus da fixação do jesuíta e do vaqueiro no sertão -, são expressão maior daquela fixação à terra e de formação social que representou a divisão do Brasil em Norte e Sul e os tipos humanos originários de cada uma das regiões. A intensificação das entradas e expedições pelo interior adentro, possibilitaram a integração étnica entre o paulista e o vaqueiro do sertão, fortificando e ressaltando as características mais viris e aventureiras do sertanejo; e até mais que isso, forneceu condições – sociais e étnicas - mínimas para a sua estabilidade e permanência no sertão. As linhas traçadas pelos exploradores de cada pólo do território brasileiro haviam, assim, segundo o Autor, de se cruzar no sertão, e ali formar e constituir uma “subcategoria étnica”, com traços e rasgos sócio-psíquicos distintos e até contraditórios.
O que de início era apartado por motivos exclusivamente políticos da Metrópole ia-se condensando em configurações étnicas e sociais no sertão. Da junção do Tietê com São Francisco retira-se do paulista bandeirante e do vaqueiro características que possibilitaram, mesmo que de modo precário, o surgimento, e mais adiante, o estabelecimento do sertanejo. É no sertão que desembocam paulistas e baianos, dando origem a um homem depositário da experiência das duas etnias.
Abrindo aos exploradores duas entradas únicas, à nascente e à foz, levando os homens do Sul ao encontro dos homens do Norte, o grande rio [São Francisco] erigia-se desde o princípio com a feição de um unificador étnico, longo traço de união entra as duas sociedades que não se conheciam (Ibidem: 186).
Daí a máxima de que “os jagunços”, frutos de uma união do Norte e do Sul, são “colaterais prováveis dos paulistas”. Do entrechoque de caminhos vindos do Sul e de caminhos traçados do Norte se fixa e se estabelece uma sociedade nascente, cujos caracteres extraídos de cada tipo humano que a forma se complementam: o empreendimento que a princípio poderia não ter grandes conseqüências, ganha na figuração de Euclides da Cunha – junção do Tietê com o São Francisco – a importância real e a medida desse contato: energia e tenacidade, do paulista bandeirante; fixação ao solo, do sertanejo.
E não nos demasiamos em arrojada hipótese admitindo que este tipo extraordinário do paulista, surgindo e decaindo logo no sul, numa degeneração completa ao ponto de declinar no próprio território que lhe deu o nome, ali renascesse e, sem os perigos das migrações e do cruzamento, se conservasse prolongando, intacta, ao nosso tempo, a índole varonil e aventureira dos avós.
Porque ali ficavam, inteiramente divorciados do resto do Brasil e do mundo, murados a leste pela Serra Geral, tolhidos no Ocidente pelos amplos campos gerais, que se desatam para o Piauí e que ainda hoje o sertanejo acredita sem fins. *O meio atraí-os e guardava-os.
As entradas de um e outro lado da meridiana, impróprias à dispersão, facilitavam antes o entrelaçamento dos extremos do país. Ligavam-nos no espaço e no tempo. Estabelecendo no interior a contigüidade do povoamento, que faltava ainda em parte na costa, e surgindo entre os nortistas, que lutaram pela autonomia da pátria nascente, e os sulistas, que lhe alargaram a área, abastecendo-os por igual com as fartas boiadas que subiam para o vale do rio das Velhas ou desciam até as cabeceiras do Parnaíba, aquela rude sociedade, incompreendida e olvidada, era o cerne vigoroso da nossa nacionalidade (Ibidem, 189-190, grifos no original).
A longa citação se justifica pois nela pode-se apreender os diferentes sentidos emprestados à categoria de isolamento em sua argumentação, e o que nos afigura mais importante, a própria relação entre isolamento e adaptação, entendido aqui em termos de estabelecimento de uma organização sócio-cultural sertaneja. O primeiro deles, como vimos, torna-se como que um imperativo do meio. “Inteiramente divorciados do Brasil” não restava outra opção àquele tipo étnico que ali surgia a não ser a adaptação como elemento primordial de sobrevivência. Não existiria o sertanejo sem essa adaptação. Veremos mais adiante que embora o significado mais específico de adaptação remeta a uma solução da relação entre o homem e o meio, ainda assim, a meu ver, o significado lato remete a uma solução também no nível das relações entre os homens, ou seja, no nível da organização social.
O segundo sentido, a que também já nos referimos, a categoria isolamento se constrói na argumentação em contraposição à sua avaliação da civilização litorânea. O isolamento protegeu “aquela rude sociedade” dos descaminhos da civilização cosmopolita do litoral: “o meio atraí-os e guardava-os”. A expressão sintetiza os dois primeiros sentidos que aqui frisamos: a caatinga exercia uma espécie de força imanente na fixação do sertanejo ao Sertão, “atraí-os”. Ao mesmo tempo, em que desempenhava uma função de toda salutar para a permanência daquela aventura, afastando-a do perigo representado pelo litoral.
O terceiro sentido vem assim de encontro aos dois primeiros. Isolamento aponta também para um certo revigoramento de duas etnias que pareciam decaídas. A relação entre esses dois tipos étnicos – o paulista e o baiano – dá origem a uma sub-etnia que, embora na condição de mestiço, unem caracteres que, por outras influências, complementam-se. Mais do que o resultado da extração do que de melhor há no paulista e no baiano, o sertanejo é fruto de um cruzamento possível. Com “possível” pretendo dizer que o sertanejo, na análise de Euclides da Cunha, é muito mais resultado de diferentes condicionantes – meio, clima, etnias – do que poderia sugerir nossa análise dos diferentes sentidos emprestados à categoria isolamento, mantendo-se, dessa meneira, a contingência da inter-relação entre esses fatores.
Assim sendo, se na argumentação do Autor isolamento e adaptação parecem ser categorias que se conectam na projeção de um sentido dado ao Sertão e ao sertanejo, esse sentido como pretendo discutir mais a fundo na próxima seção parece residir também na avaliação da organização social ali originada. Em outras palavras, o sertão não é somente um lugar delimitado e prescrito pelo seu clima e morfologia, e também não o é pelas características atávicas que carregam consigo o sertanejo. O sertão denota também organização social e cultural, portada e sustentada pelo homem sertanejo. Lugar de vaquejadas, de trabalho, de Antonio Conselheiro e de Canudos.
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Fonte:
Lucas Correia Carvalho: “TRANSIÇÃO E TRADIÇÃO: MUNDO RÚSTICO E MUDANÇASOCIAL NA SOCIOLOGIA DE MARIA ISAURA PEREIRA DE QUEIROZ”. (Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia, do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Sociologia (com concentração em Antropologia). Orientador: Prof. Dr. André Pereira Botelho). Rio de Janeiro, 2010.
Nota:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese.
As notas e referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.
O texto postado é apenas um dos muitos tópicos abordados no referido trabalho.
Para uma compreensão mais ampla do tema, recomendamos a leitura da tese em sua totalidade.
Disponível digitalmente no site: Domínio Público
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