Algumas concepções de ciência

“Segundo Marilena Chauí (2000), historicamente tem sido três as principais concepções de Ciência ou de ideais de cientificidade: a racionalista, a empirista, e a construtivista.

A concepção racionalista que se estende dos gregos até o final do século VII, tem como modelo de objetividade a matemática. Assim, afirma que a ciência é um conhecimento
racional, dedutivo e demonstrativo, capaz de provar a verdade necessária e universal de seus enunciados e resultados, sem deixar qualquer dúvida possível. A ciência é formada por um conjunto de postulados, axiomas e definições, que determinam a natureza e as propriedades de seu objeto. Ela se dá através de demonstrações, que provam as relações de causalidade que regem o objeto investigado.

O objeto científico é uma representação intelectual e universal, necessária e verdadeira, das coisas representadas e corresponde à própria realidade, porque esta é racional e inteligível em si mesma. As experiências científicas são realizadas apenas para verificar e confirmar demonstrações teóricas e não para produzir o conhecimento do objeto, pois este é conhecido exclusivamente pelo pensamento. O objeto científico é matemático, porque a realidade possui uma estrutura matemática.

A concepção empirista, que vai da medicina grega e Aristóteles até o final do século XIX, afirma que a ciência é uma interpretação dos fatos baseada em observações e experimentos que permitem estabelecer induções, e que, ao serem contempladas, oferecem a definição do objeto, suas propriedades, e suas leis de funcionamento. A teoria científica resulta das observações e dos experimentos, de modo que a experiência não tem simplesmente o papel de verificar e confirmar conceitos, mas tem a função de reproduzi-los. Assim, esta concepção se caracteriza pela crença de que a observação é o ponto de origem do conhecimento e que esse se encaminha a partir dos fatos à teoria, do particular para o geral. Daí a importância de se registrar o maior número de dados possíveis sobre o mesmo fenômeno que se quer investigar. Por isso, nesta maneira de fazer ciência, sempre houve um grande cuidado para estabelecer métodos experimentais rigorosos, pois deles dependia a formulação da teoria e a definição da objetividade investigada. Considerando que o conhecimento se origina da experiência, os empiristas partem dos fatos concretos e, portanto, consideram que a origem do conhecimento está no objeto. Para eles, a partir de observações neutras, é possível alcançar a verdade. Esta concepção de ciência é uma reação à tendência racionalista, que negligenciava a experiência e é defendida, geralmente, por cientistas naturais.

De acordo com Chauí (2000), as concepções de cientificidade racionalista e empirista possuíam o mesmo pressuposto, embora o realizassem de maneiras diferentes. Ambas
consideravam que a teoria científica era uma explicação e uma representação verdadeira da própria realidade, tal como esta é em si mesma. A ciência era uma espécie de raio X da realidade. Enquanto a concepção racionalista era hipotético-dedutiva, isto é, definia o objeto e suas leis e a partir daí deduzia suas propriedades, efeitos posteriores e previsões, a concepção empirista era hipotético-indutiva, isto é, apresentava suposições sobre o objeto, realizava observações e experimentos e chegavam à definição dos fatos, às suas leis, às suas propriedades, seus efeitos posteriores e previsões.

O positivismo lógico, tendência filosófica hegemônica, a partir do século XIX, e base
de todas as ciências naturais, para Chalmers (1993) foi uma forma extrema de empirismo, já que através da experiência, opunha-se ao primado da razão. Assim, objetivamente, o conhecimento científico era tido como válido, metódico, preciso, progressivo e cumulativo, desinteressado e impessoal, útil e necessário, uma combinação de raciocínio e experiência, hipotético, explicativo e prospectivo. A doutrina do positivismo lógico considera que as leis são imutáveis e seria papel da ciência formular essas leis, sem questionar as causas e razões dos fenômenos, sem apresentar juízos de valor e com neutralidade. O conhecimento científico é estabelecido através de procedimentos conhecidos como método experimental, que apresenta passos determinados (observação, formulação de hipóteses, experimentação e estabelecimento de leis) (BORGES, 1996).

Vale ressaltar que, apesar das críticas à concepção empirista,

livros-textos, vários projetos curriculares de Ciências, ainda se caracterizam pela valorização do método científico, que é tido como um conjunto de passos rígidos a serem seguidos para elaboração do conhecimento científico, com destaque para a observação e a experimentação.(LEITE, 2004, p.31).

Lemgruber (2000), em sua pesquisa, nos mostra que a prevalência da concepção empirista-indutivista, no Brasil, foi estimulada, pelos projetos curriculares da década de 1960. Muitas teses e dissertações da área de Educação em Ciências, do período de 1981 a 1995, buscaram a substituição da visão empirista-indutivista presente no ensino, recorrendo à Psicologia Cognitiva e às concepções epistemológicas históricas e culturais.

Por outro lado, a concepção construtivista, iniciada no século XX, considera a ciência uma construção de modelos explicativos para a realidade e não uma representação da própria realidade. Esta concepção propõe que o conhecimento é construído mediante as relações de interação estabelecidas entre sujeito e objeto, portanto, esta relação não é neutra. As observações são precedidas e influenciadas pelas teorias, e assim, a ciência é entendida como um processo dinâmico que pode ser alvo de mudanças. Nela, o cientista combina dois procedimentos: um vindo do racionalismo e outro do empirismo, e a eles acrescenta um terceiro, vindo da idéia de conhecimento aproximativo e corrigível.

Como o racionalista, o cientista construtivista exige que o método lhe permita e lhe garanta estabelecer axiomas, postulados, definições e deduções sobre o objeto científico. Como o empirista, o construtivista exige que a experimentação guie e modifique axiomas, postulados, definições e demonstrações. No entanto, porque considera o objeto construção lógico-intelectual e uma construção experimental feita em laboratório, o cientista não espera que seu trabalho apresente a realidade em si mesma, mas ofereça estruturas e modelos de funcionamento da realidade, explicando os fenômenos observados. Não espera, portanto, apresentar uma verdade absoluta e sim uma verdade aproximada que pode ser corrigida, modificada, abandonada por outra mais adequada aos fenômenos.

Apesar das divergências, a maioria dos filósofos das ciências atuais contesta a postura
empirista, o positivismo, a neutralidade da ciência e é partidária à visão construtivista do conhecimento (JUSTINA, 2001). No entanto, a visão de ciência que circula nas escolas é distante da concepção construtivista adota por filósofos contemporâneos, estando de acordo com a concepção empirista. No próximo tópico, baseada na revisão bibliográfica, procuro apresentar as visões de ciência veiculadas nas escolas através da educação científica.”

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É isso!

Fonte:
GLÁUCIA CASTELO BRANCO DE FRANCISCO: “ENSINO DE GENÉTICA: UMA ABORDAGEM A PARTIR DOS ESTUDOS SOCIAIS DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA – ESCT". (Dissertação apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Educação, ao Programa de Pós-Graduação, Mestrado em Educação, do Centro de Ciências da Educação da Universidade Regional de Blumenau (FURB). Orientador: Prof. Dr. Adolfo Ramos Lamar). Universidade Regional de Blumenau (FURB). Blumenau, 2005.

Nota:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese.
As referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.

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