Newtonianismo

“A disseminação da idéia de Ciência Aplicada na Inglaterra do século XVIII, entre diversos segmentos sociais, esteve vinculada através da atuação de professores itinerantes de Filosofia Mecânica e Experimental Newtoniana e da divulgação desta perspectiva de conhecimento em manuais e roteiros de cursos e aulas, elaborados por estes docentes. A idéia de Ciência Aplicada, relacionada às necessidades das atividades industriais e ao bem estar da população do país, constituiu-se num dos mais importantes aspectos da Ilustração inglesa e numa poderosa alavanca intelectual que possibilitou a emergência da Revolução Industrial, a partir dos anos 1780.

Em meados do século XVIII, verificou-se na Inglaterra uma grande onda de “fascina ão” pela Ciência Aplicada, que, segundo o historiador Paul Langford, chegou a caracterizar o movimento ilustrado naquele país como uma “Ilustração de mentalidade prática”:

“Se existiu uma Ilustra ão Inglesa, ela se deu talvez neste sentido: uma ilustração da mentalidade prática. A fascinação de meados do século XVIII não se relacionava nem com polêmicas teológicas nem com especulações filosóficas, mas contrariamente com tecnologia aplicada”.

O segmento dessa nova corrente filosófica que se baseia na investigação da natureza em consonância com a matemática delimita um caminho prático e aplicável nos processos e produtos do cotidiano teve inúmeros seguidores e divulgadores, sendo o newtonianismo considerado até mesmo uma moda para a época, pois noséculo XVII, a Filosofia Natural atingia um grupo privilegiado de pessoas, restringido-se a membros de classes abastadas da sociedade, ou seja, o conhecimento era para poucos, sendo uma fonte de contemplação e inspiração para a elite intelectual.

Entretanto, no início do século XVIII, a Grã-Bretanha experimentou uma significativa mudança na educação das pessoas, pois houve um aproveitamento das aplicaçõespráticas da nova filosofia de Newton em cursos ocorridos fora da universidade e que eram incrementadas com aparatos experimentais.

A valorização da Filosofia Natural, como produto cultural e suas aplicações práticas, aproximou-a de grupos de pessoas, tais como construtores de instrumentos, tecelões, relojoeiros, ferreiros, entre outros. Isso esteve muito relacionado com o desenvolvimento da tecnologia no período, pois grandes investimentos foram feitos para que as pessoas soubessem aplicar na prática diversas teorias, a fim de aprimorar, por exemplo, técnicas de navegação. Sendo assim, cresceu um clamor entre a sociedade para que o conhecimento, advindo da Filosofia Natural, atingisse várias camadas da população.

Esse propósito de difundir o conhecimento impulsionou um dos principais fatores para a ampla propagação das idéias de Newton em solo britânico e europeu de uma forma geral: as conferências de filósofos naturais. Imersas nesse contexto de transformações, elas proporcionavam um caminho para o contato superficial com as teorias newtonianas e, conseqüentemente, com Filosofia Natural de um modo geral.

Por meio de experimentos de fácil manuseio e entendimento, as conferências populares apresentavam a Filosofia Natural como um conjunto de verdades indubitáveis sobre a natureza. Idéias muito complicadas não eram discutidas, apenas aquelas com forte apelo sensorial e bastante impressionantes eram exploradas. Nesse cenário, as conferências proferidas por Desaguliers desempenharam um papel fundamental.

Jean T. Desaguliers, por sua vez, chegou a ser considerado como o Newtoniano mais famoso entre os anos 1720 e 1730 e obteve grande parte do seu conhecimento teórico e pr tico como “experimentador oficial” da Royal Society, deixando esta função por outra mais lucrativa, que era ministrar cursos de 12 a 16 aulas ou de dez semanas – em sua casa em Channel-Row, Westminster (Londres) ou em cidades não muito distantes da capital.

Adepto e importante defensor das idéias de Newton, Desaguliers incorporou em suas conferências informações práticas da filosofia natural– como o uso de lentes para corrigir a visão bem como discussões sobre o funcionamento da natureza. Seus cursos eram frequentados por vários tipos de pessoas, entre clérigos, artesãos, nobres, e outros; e tornaram-se modelo para as conferências populares naquele período, conforme relata Sarmento em sua Theorica:

“(...) para ajudar, e facilitar o juízo, a perceber a verdade, e certesa desta Theorica; a qual he tam infallivel, e clara, e tam certos, e demonstráveis os Principios, em que se funda, que depois de toda Ella impressa, sahio a luz meu bom amigo, e sócio (F.R.S. “Fellow of the Royal Society”) o Dr. Desaguliers, em outubro deste presente anno de 1737, com hum Instrumento Mechanico, em que se mostra a os olhos a variedade das Mares, e todos seus Phenomenos, e que a sua construcçam he deduzida dos mesmos Principios. A primeira vez que fez publico, e eu vi, e examinei com o maior gosto este curiosíssimo Instrumento, foy nos Banhos, ou Caldas Bathonienses, noventa milhas distante de Londres, adonde dito Doutor o explicou a huma grande parte da nobresa, a quem estava lendo hum Curso de Philosophia Experimental, e Mechanica; e as demonstrações que se fazem com dita Maquina, tem lugar, e confirmam a seguinte Theorica, quer seja o Sol o que se move, quer a Terra.”

Sarmento entusiasmado com a nova filosofia de aplicação em experimentos observáveis e não afirmando enfaticamente qual é o corpo celeste (Sol ou Terra) que move no firmamento, faz o relato de uma máquina que confirma os pressupostos estabelecidos por ele na Theorica, que de acordo com sua afirmação, é apresentada pela primeira vez, sendo, portanto, descrita nos trabalhos de Desaguliers após essa data.

A apresentação do aparelho mecânico para a confirmação do fenômeno em que apresentava a variação das marés é um fator relevante que não poderemos analisar aqui, pelo motivo de que a digitalização da obra de Desaguliers oferecida para a leitura publicada em 1745, conforme a descrição de Sarmento, obviamente a data de publicação deveria ser após 1737, sendo que Desaguliers publicou em 1734 uma edição anterior a essa, algumas poucas figuras se encontravam na sua integrapara a visualização outra não aparecem e em especial aquelas onde estão indicadas as figuras desse aparelho mecânico, não estava totalmente aberta.”

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É isso!

Fonte:
LUCIANO LUZ ANGELUCI: “Estudos de um pensador português do século XVIII Preocupado em divulgar os conceitos newtonianos: Difusão do conceito de atração gravitacionalrelacionado às marés”. (Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em História da Ciência, sob orientação do Professor Doutor José Luiz Goldfarb). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC. São Paulo, 2010

Nota:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese.
As referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.

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