As idéias integralistas de Plínio Salgado

“Após a Primeira Guerra Mundial, surgiram movimentos autoritários na Europa. Já em 1922, Mussolini assumiu o poder na Itália; Stalin foi construindo o seu poder absoluto na União Soviética; o nazismo se tornou vitorioso na Alemanha, em 1933. Essa crise concorreu para o desprestígio da liberal democracia, associada ao plano econômico do capitalismo, que trazia uma promessa de igualdade e de oportunidades mas, devido à crise do sistema, trouxe empobrecimento, desemprego e desesperança. Isso se refletiu em nosso país, fazendo com que surgissem pequenas organizações de direita já na década de vinte. Em outubro de 1932, nasceu em São Paulo um movimento tido como expressivo, a Ação Integralista Brasileira, de Plínio Salgado.

O integralismo se definiu como uma doutrina nacionalista, cujo conteúdo era mais cultural que econômico. Sem dúvida, combatia o capitalismo financeiro e pretendia estabelecer o controle do Estado sobre a economia. Mas sua ênfase maior se encontrava na tomada de consciência do valor espiritual da nação, assentados em princípios unificadores: “Deus, Pátria e Família” era o lema do movimento.

Como já antecipamos, nos estudos realizados sobre o fenômeno do integralismo, duas matrizes se contrapõem: de um lado, uma corrente faz a leitura de que mesmo não havendo condições históricas similares ao caso europeu, houve uma espécie de mimetismo, portanto, uma cópia do movimento aos moldes do que acontecia na Itália, com Mussolini à testa - um movimento fascista. De outro lado, a análise de talhe ontológico de José Chasin, tenta especificar o movimento no contexto histórico brasileiro, afirmando “que as condições do capitalismo hiper-tardio que temos aqui, propiciaram o surgimento deste movimento”. José Chasin mostra o fenômeno integralista como uma utopia reacionária, como forma de crítica romântica à miséria brasileira. Segundo ele, o fascismo combinava expansão econômica com regressão social. Ele interpretou o integralismo como sendo uma forma reacionária de tentar frear a expansão das forças produtivas materiais, com o lema “Rumo à terra”. O sonho integralista era o de constituir um país de pequenos proprietários rurais, que expressassem a vocação agrária, mantendo, ao mesmo tempo, o sentido cristão.

Durante a instalação e consolidação da AIB, a atuação política de Plínio Salgado pautava-se por um paradoxo. Ao mesmo tempo em que enfatizava o declínio do sistema político liberal e defendia um novo sistema, baseado no unipartidarismo e no autoritarismo, o movimento criado por ele participava do processo político liberal. Natália dos R eis coloca que; “no entanto, pode-se considerar que a contradição existente entre a prática política do partido e sua ideologia autoritária, fazia parte da estratégia de fortalecimento da AIB junto a sociedade.”

Tudo leva a crer que a prática liberal seria deixada de lado, assumindo a forma de autoritarismo, quando o partido conseguisse alcançar o poder do Estado nacional.

Esse pensamento autoritário era correspondido pela Igreja, pela LCT e em outros setores da sociedade brasileira, que ao confluírem, geraram a AIB. Sob esse lema abrangente - Deus, Pátria e Família - se instalou no nosso solo, levando a bandeira do sigma aos incompreendidos. É claro que a AIB não surgiu como um movimento católico. Nos referimos aos seus princípios de reconhecimento do mundo, defendido por seus ideólogos, na tentativa de explicitar as bases de seu pensamento autoritário.

Plínio Salgado elaborou uma série de teorias dos movimentos humanos, visualizando quatro etapas na história da humanidade, as quais denominou de: adição, fusão e desagregação. Ele explicitava que na primeira etapa, se referia ao momento humano em que prevalecia o politeísmo “com a multiplicação dos deuses, dos clãs e das províncias; na segunda, a humanidade passou ao monoteísmo, na qual todos esses elementos se fundem em uma idéia de cunho totalitário, que abarca toda a compreensão do Universo e todos os elementos humanos”; na terceira etapa, veio o ateísmo, causador da desagregação social, “por causa do abandono dos valores religiosos e do apego extremado à razão e à ciência”. A quarta etapa estaria por vir e segundo ele, “seria a época da síntese e da recuperação dos valores cristãos e da espiritualidade.” O Centro D. Vital foi o canal de aproximação dos dois movimentos – A LCT e da AIB. Com uma concepção espiritualista do mundo, a AIB se apresentou como um movimento globalizante, em que o político era apenas um elemento da Ordem nacional, que pretendiam instalar com a transformação radical da sociedade.

Sobre o político submetido à ordem nacional, José Chasin questiona o projeto apresentado por Plínio Salgado, que o justificava por imaginá-lo como a decorrência necessária que se poderia opor às verdades articuladas ao nível das realidades do homem e de seu meio natural. Essas decorrências não dependeriam da atividade humana, enquanto a experiência real sofreria o condicionamento desta. Não haveria como hesitar entre o certo e o errado: acerto seria harmonizar a ação política às verdades essenciais da terra e da raça. Erro seria qualquer outra alternativa. Apontava Salgado que não se poderia falar em criação política, mas numa ajustagem às verdades permanentes que independem do agente social. Chasin finaliza mostrando que para Plínio Salgado, o político não poderia transformar as realidades profundas - sua ação ou possibilitaria que estas realizassem suas verdades imanentes irrecorríveis ou frustraria sua efetivação e causaria dano.

Plínio Salgado, ao redigir o Manifesto Doutrinário de outubro de 32, estava convencido da oportunidade e conveniência de explicitar suas convicções religiosas. Com o passar do tempo, ele buscou intensamente identificar -se com o cristianismo. Para entender o pensamento pliniano a partir de sua obra, suas idéias foram divididas da seguinte forma: idealismo filosófico e romantismo político; massa e elite; nacionalismo; campo e cidade; doutrinação integralista. Nestes textos, revela-se o seu modo de pensar a partir de sua formação. “Deus dirige os destinos dos povos. O homem deve praticar sobre a terra as virtudes que o elevam e o aperfeiçoam”. Quanto ao amor a Terra dentro da concepção pliniana, podemos observar a relação da emoção individual, com o cenário e a associação de idéias entre “paisagem/ fato ocorrido”. Para Eliana Dutra, a paisagem como testemunha das emoções alegres ou tristes, sedimentaria o amor pela terra que, estendido a outros lugares e outros grupos humanos que falam a mesma língua e compartilham a mesma religião e costumes, ampliaria e transformaria um sentimento que era apenas local, isto é, a Pátria. Para Salgado, a Pátria era uma ‘fatalidade humana’. Para o termo Nação, na sua análise, seria para Salgado a consciência da diferenciação dos demais grupos nacionais, fundadas na tradição própria, na vocação e no temperamento do povo. Ele via a Nação como o termo étnico que se referia a um grupo que é a um só tempo biológico, cultural e afetivo.”

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Fonte:
EMÍLIA CARNEVALI DA SILVA: "O HOMEM NO ESPELHO: REFLEXÕES SOBRE A DISSIDÊNCIA INTEGRALISTA DE SEVERINO SOMBRA - 1931 – 1937". (Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de mestre em História Política, sob a orientação do Prof. Doutor Antonio Rago Filho). São Paulo – 2006.

Nota
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