Violações de direitos humanos

"Os direitos humanos são definidos como os direitos essenciais do ser humano, à medida que são imprescindíveis para o exercício da condição humana. A concepção de direitos humanos se funda ainda na idéia de dignidade humana (PIOVESAN, 2004a, p. 133; COMPARATO, 1999, p. 44), segundo a qual se deve respeitar e proteger a vida humana.

Esta concepção foi desenvolvida após a Segunda Guerra Mundial, em virtude das atrocidades cometidas pelo nazismo, que levaram à descartabilidade do ser humano. Conseqüentemente, no mesmo período, acentuou-se o processo de internacionalização dos direitos humanos, que difundiram a sua importância e procuraram estabelecer padrões mínimos de respeito ao ser humano (PIOVESAN, 2004a, p. 131-133).

Este processo culminou na celebração da Carta Internacional de Direitos Humanos, formada pela Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, pelo Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e pelo Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ambos de 1966 (PIOVESAN, 2004a, p. 131-164; COMPARATO, 1999, p. 42), a qual englobou direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais na categoria dos direitos humanos.

Nesse sentido, vale mencionar que os direitos humanos compreendem: os direitos civis e políticos, que têm como fundamento a liberdade, e foram incorporados nas primeiras constituições ocidentais; os direitos sociais, econômicos e culturais, que têm como fundamento a igualdade, e foram incorporados nas constituições do Estado Social no século XX; e os direitos coletivos, que têm como fundamento a solidariedade e a fraternidade, como os direitos ao desenvolvimento, à paz, ao meio-ambiente, dentre outros (PIOVESAN, 2004a, p. 149-150; BONAVIDES, 1983, p. 474-482 apud PIOVESAN, op. cit., p. 149-150).

Analisando-se as definições de refugiado e de direitos humanos, observa-se que o indivíduo passa a se inserir na categoria de refugiado, após ter seus direitos fundamentais ameaçados ou concretamente violados (MOREIRA, 2005, p. 52).

De acordo com a Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951, está-se diante de um refugiado
quando os seus direitos civis (como as liberdades de pensamento, consciência e religião, de opinião e expressão, e os que se referem à raça, nacionalidade e filiação a certo grupo social) se encontram em risco (DONNELLY, 1986, p. 599-642 apud ALVES, 2003, p. 46; ALVES, op. cit., p. 51-52).

De outro lado, conforme a Declaração de Cartagena sobre os Refugiados de 1984, configura-se um refugiado quando o indivíduo teve sua vida, liberdade ou segurança ameaçada pela violação massiva de direitos humanos (dentre outros fatores). Isso significa que foram perpretadas violações em larga escala, afetando os direitos humanos consagrados na Declaração Universal ou em outros instrumentos internacionais (FRANCO, 2003, p. 29-30).

Dessa forma, observa-se que o país de origem ameaçou violar ou de fato violou tais direitos do indivíduo ou, ainda, revelou-se incapaz de protegê-los, impulsionando-o a procurar a proteção de outro Estado.

Ademais, o que fundamenta o direito de buscar a proteção estatal de outro país é o direito de asilo, consagrado no artigo 14 (1) da Declaração Universal dos Direitos do Homem da ONU, que segue transcrito abaixo:

“Toda pessoa, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países”
(ONU, 2004, p. 345).

No entanto, vale salientar que o direito do indivíduo perseguido em seu país de origem de buscar asilo, dirigindo-se a outro Estado e solicitando-lhe proteção, não se confunde com o direito ao asilo, ou seja, à concessão desta proteção pelo Estado solicitado (ANDRADE, 2001, p. 100). Tanto assim que a Declaração Universal de 1948 reconheceu o direito do indivíduo de procurar asilo, mas não a obrigação dos Estados de concedê-lo (NASCIMENTO E SILVA, 2001, p. 12). Isso porque a concessão do asilo (ou refúgio) é um ato soberano do Estado (ACNUR, 1992, p. 46; GOODWIN-GILL, 1983, p. 225).

Além deste direito de buscar asilo, tem se assinalado também o direito do indivíduo de permanecer no país de origem (ou de não ser deslocado dele), enfatizando a responsabilidade estatal
em garantir os direitos essenciais de seus nacionais e a necessidade de abstenção de práticas ou ações estatais que possam levá-los a abandonar seu país (TRINDADE, 1996, p. 91; ACNUR, 1997, p. 62; GOODWIN-GILL, 1983, p. 229).

Por outro lado, o direito de permanecer, que desloca o enfoque para os países de origem, com o objetivo de prevenir futuros fluxos de refugiados, não deve ser utilizado como justificativa pelos países de acolhimento para a denegação
do direito ao asilo (ACNUR, 1997, p. 63).

Dessa forma, quando chega em outro país, ao qual solicita refúgio, o indivíduo deve ter os seus direitos humanos respeitados (principalmente a fim de satisfazer suas necessidades básicas e de resguardar sua segurança), enquanto lá permanecer (ACNUR, 1998, p. 199; PITA, 2003, p. 87).

Por fim, conclui-se que o respeito aos direitos humanos dos indivíduos em seus países de origem se revela uma forma de prevenir os movimentos de refugiados (ACNUR, 1997, p. 55; PITA, 2003, p. 87) – o que evitaria também outros problemas, tais quais conflitos entre Estados, movimentos xenófobos ou nacionalistas pela população local e maiores encargos sociais e econômicos aos países de acolhimento. Ao mesmo tempo, estes não podem se eximir da responsabilidade de assegurar os direitos humanos dos solicitantes de refúgio e dos refugiados enquanto estiverem em seu território."

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Fonte:
JULIA BERTINO MOREIRA: "A QUESTÃO DOS REFUGIADOS NO CONTEXTO INTERNACIONAL - DE 1943 AOS DIAS ATUAIS”. (Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS JULIA BERTINO). Campinas, 2006.

Nota
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