O conceito de João Calvino sobre as riquezas



"Com a Reforma, e principalmente pela influência de João Calvino, é que a cristandade propôs-se a retornar à interpretação bíblica acerca do uso das riquezas. Desta forma, André Biéler (1970, p. 34, 35), pastor e doutor em ciências econômicas pela Universidade de Genebra, em seu livro O Humanismo Social de Calvino diz que:

A Fé e o Mundo não são mais dois domínios separados, o religioso e o profano. A preocupação pela cidade temporal torna-se para o cristão reformado a expressão direta de sua fidelidade cristã. É o que se nota quando se estuda o pensamento de Calvino sobre o dinheiro, a riqueza e a propriedade.

O trabalho
Dentro da perspectiva de Calvino, para que o homem exerça sua plena humanidade e seja um homem realizado e autêntico, ele precisa de trabalho. Essa é a sua vocação. O ser humano que não trabalha, não responde à sua vocação, pois, para isso ele foi chamado desde a Criação. No Antigo Testamento o trabalho é um mandato da criação (Gn 1.27). Essa foi a condição outorgada ao homem. Ele deveria cultivar a terra, dominá-la, sujeitá-la, exercer senhorio sobre todas as criaturas, trabalhar.

“Ainda hoje o trabalho é um ponto de confrontação entre a civilização medieval e o mundo presente;” a evolução do trabalho é responsável pelas principais mudanças de nossa sociedade (LE GOFF, 2005b, p. 93, 94).

Como diz Gerard van Groningen (2002, p. 499) “cada grupo familiar se tornou possuidor; cada família se tornou participante na “posse” abençoada e na “responsabilidade de cuidar dela. Na verdade, as famílias receberam o privilégio e a tarefa de amar, cuidar e fazer da terra um lugar de vida, amor, beleza, paz e prosperidade”.

Todo trabalho honesto é louvável. Deus criou o trabalho. O trabalho é o meio para se adquirir riquezas, e manter a humanidade. Ele não apenas criou o mundo, mas providencialmente ainda o preserva e o mantém em ordem. Cuida particularmente de cada detalhe em toda sua criação, e especialmente “guarda e mantém abrigados debaixo de sua mão os fiéis” (BIÉLER, 1990, p. 514). O trabalho é para todos; pois, “seis dias trabalharás...”, diz o mandamento. Negligência e preguiça não é bem vinda (Pv 6.6-8).

Porém, em conseqüência à Queda, o pecado entrou no mundo e com ele a corrupção da humanidade, a depravação total. Então a bênção e graça divina que acompanhavam o doce labor do trabalho saem de cena para entrar a dura maldição, imputando ao trabalho um teor penoso e doloroso. Os homens “foram criados para empregar-se em fazer alguma coisa e não para estarem ociosos e indolentes. Verdade é que esse labor era bem alegre e agradável, longe de todo enfado e insatisfação” (BIÉLER, 1990, p. 523).

O trabalho do homem foi corrompido por causa do pecado, “e desligado da obra de Deus, torna-se fonte de problemas, de ansiedade, de injustiça e de opressão”. Para que o trabalho recobre seu sentido original, de dignidade, de trabalho verdadeiro, dequadamente cumprido, para que seja serviço e não fonte de opressão, para que encontre nele satisfação é necessário que se reintegre e ajuste-se ao trabalho de Deus (BIÉLER, 1970, p. 51).

Calvino ao comentar o relato das conseqüências da maldição na Queda nos ensina que, antes, o trabalho era como que “um brinquedo”, agora, uma “maldição”:

Da terra comerás com trabalho todos os dias de tua vida. Pela expressão “comer da terra” entende Moisés viver dos frutos que provêm dela. O termo hebraico que nós traduzimos como “trabalho” significa também “enfados” e “insatisfações”. É o oposto do labor agradável em que se ocupava Adão anteriormente, de tal modo que lhe era como um brinquedo ou passatempo, pois que não havia sido criado para nada fazer, mas para ocupar-se em alguma coisa. Por esta razão, o Senhor o instalara no jardim para cultivá-lo, mas nesse labor não tinha senão prazeroso deleite; agora, lhe impôs um trabalho servil, tal como se condenado fosse às galés (CALVINO [CD-ROM] Gn 3.17, p. 103).

A ordem de cultivar a terra nos foi dada antes da Queda, como uma graça, um dom, uma bênção de Deus. Com a Queda e, conseqüentemente, a entrada do pecado no mundo – a terra, a mulher, o parto, a serpente, e, inclusive, o trabalho – foram amaldiçoados. Essa maldição sobre o trabalho tem um caráter pedagógico que produz arrependimento. Através do arrependimento o homem mortifica a sua carne e, assim, Deus lhe diminui o peso da maldição do pecado.

Mas, graciosamente, Deus preservou suas dádivas de bondade, pois ainda assim, permitiu que, mesmo caídos, tivessem filhos, mas ainda aumentou as dores do parto. Porém, mesmo como criaturas caídas, ele nos permitiu a bênção do trabalho, porém, agora, com fadigas e angústias. Finalmente, Cristo, segundo as Escrituras, através do seu sacrifício, aboliu a maldição do pecado. Logo, ele é o libertador da penalidade do trabalho. Como diz Salomão no Salmo 127:

Que os outros se levantarão bem de manhã e se deitarão bem tarde, e comerão o pão de angústia (Sl 127.2); o Senhor, porém, dará descanso a seus bem-amados, a saber, até onde o que havia sido corrompido por Adão é restaurado pela graça de Cristo; os fiéis sentem a Deus mais generoso para com eles e gozam do sulçor de sua paterna indulgência. (CALVINO [CD-ROM] Gn 3.19, p. 106).

Bênçãos são decorrentes de obediência à Palavra de Deus; por outro lado, as maldições são decorrentes da desobediência. Sucesso material através do trabalho é igual à bênção. Esta é uma relação com Deus. Muito embora, a bênção real pode claramente ser realizada na pobreza, e o sucesso material pode muito bem, nos vir como maldição.

Disto impõem-se concluir que nada nos faltará e que abundância de fruto colheremos, se a Deus nos voltarmos. E se pobreza e indulgência sofremos, isto resulta de falta nossa, porque rejeitamos a bênção de Deus mediante nossa maldade (CALVINO [CDROM] Is 30.23, p. 703).

Assim, pela graça de Cristo, hoje, podemos ter alegria e prazer no trabalho. Se, pela fé, obedecermos a Deus, ele nos torna uma bênção real. O trabalho nunca deixou de ser uma bênção divina. Infelizmente, o conceito atual de felicidade está sempre ligado a deleites, riquezas, conforto e ociosidade. O reformador esclarece dizendo que

A graça de Deus, mercê da qual os fiéis desfrutarão de seu labor, é oposta à maldição a que sujeitos estão os homens [...] Os filhos de Deus são bem-aventurados alimentando-se de seu labor [...] Ademais, o Profeta admoesta-nos brevemente a estimar a felicidade de maneira diferente da que a estima o mundo, que põem a vida feliz na ociosidade, nos deleites, nas honrarias, e nas grandes riquezas [...] Quem, se a escolha lhe é dada, deseja viver de seu labor ou o considera um bem singular? Assim que os termos “alegria” e “felicidade” são proclamados, de pronto se desborda cada qual à intemperança, de tal modo é a cobiça do homem um abismo insaciável. Ordena-nos, então, o Profeta disto somente contentar-nos; que sejamos confortavelmente sustentados do valor de nossas mãos, sob Deus nosso mantenedor, como disse no Salmo 34.10: “Os leõezinhos sofrem necessidade e passam fome, porém aos que buscam o Senhor bem nenhum lhes faltará” (CALVINO [CD-ROM] Sl 128.2, p. 676).

Se o trabalho é uma bênção, conseqüentemente ele não é um obstáculo à vida e crescimento espiritual. O trabalho não tem valor ou fim em si próprio. É um sinal do Reino vindouro. Deve, então, ser “considerado como uma atividade transitória que nos encaminha para o único alvo da existência: a vida eterna” [...] “aguardando a vinda definitiva do Reino, todo trabalho exprime a inquietude laboriosa da criação até a volta de Cristo”. Por isso é preferível o país celestial do que este mundo terreno. Preferir o país celestial é viver neste mundo, como que estrangeiros, com a mente, afeições e vontade voltadas para o Reino dos céus (BIÉLER, 1990, p. 526).

Trabalhar livremente é executar o trabalho divino, é quando deixamos de lado a vontade da carne e nos sujeitamos somente à vontade de Deus. A partir da obediência a ele é que vêem as boas obras, que são os frutos que o Senhor requer de nós. Sendo assim, pode então, o pecador, justificado pela fé, tornar seu trabalho útil e eficaz para o serviço de Deus no mundo. Após Deus nos ter reconciliado com Cristo, agora, honra e considera nossas obras aceitáveis; muito embora, elas ainda sejam imperfeitas e viciosas (BIÉLER, 1990, p. 515).

A oração de Calvino para o trabalho nos mostra, em suas próprias palavras o seu pensamento a respeito desse dom de Deus – o trabalho:

Nosso bom Deus, Pai e salvador, uma vez que a ti te aprouve ordenar que trabalhemos para podermos atender à nossa indigência, por tua graça, de tal modo abençoa nosso labor que tua bênção estenda até nós, sem o que ninguém poderá prosperar no bem, e que tal favor nos sirva para testemunho de sua bondade e assistência mercê da qual reconheçamos o paternal cuidado que tens de nós. Ademais, Senhor, que te apraza assistir-nos por teu Santo Espírito, para que possamos exercer fielmente nossos múnus e vocação sem qualquer dolo ou engano, pelo contrário, que tenhamos antes o propósito de seguir tua injunção que satisfazer o desejo de enriquecer-nos; que se, não obstante, a ti te apraz prosperar nosso labor, que também nos dês a disposição de proporcionar a assistência àqueles que estão na indigência, segundo os recursos que nos houveres dado, retendo-nos em toda humildade, a fim de que nos não elevemos acima daqueles que não hajam recebidos tal abundância da tua dadivosidade. Ou, se nos queres tratar em maior pobreza e indigência do que desejaria nossa carne, que te apraza fazer-nos a graça de acrescentar fé em tuas promessas, para fazer-nos seguros de que nos haverás de, por tua bondade, prover-nos sempre o sustento, de sorte que não caiamos na desconfiança; antes, pelo contrário, esperemos pacientemente que nos cumules não somente de tuas graças temporais, mas também de suas graças espirituais, para que tenhamos sempre mais amplo motivo e ocasião de render-te graças e descansar inteiramente em tua só bondade. Ouve-nos, Pai de misericórdia, por Jesus Cristo, teu Filho, nosso Senhor” (CALVINO [CD-ROM], Jr 31.13, p. 298).

O homem não vive tão somente do seu trabalho, mas sim, vive única e exclusivamente da graça divina. Pois tudo é dádiva de Deus, inclusive o alimento que compramos com o, suposto, “nosso” salário. A vida humana não se resume em apenas conquistar, ganhar, vencer, possuir; mas, principalmente, em confiar plenamente em Deus, “aquele que é contemplado no dia de descanso” (BIÉLER, 1990, p. 520).

Confiança em Deus se dá, também, pelo fato de o Criador se preocupar e cuidar de todos os detalhes de nossa vida cotidiana, comer, vestir, sorrir. Sua providência se estende até às pequenas coisas, as que nos parecem supérfluas ou sem importância. Por isso, Cristo, no Sermão do Monte nos censura quando nos preocupamos demasiadamente no que precisamos comer ou vestir. A advertência é para não estarmos ansiosos por coisa alguma, devemos repousar tranqüilamente confiantes na providência divina. Esta é uma verdadeira prova de fé, quando reconhecemos que somente Deus é o autor e o provedor dos bens materiais (BIÉLER, 1990, p. 520).

A Parábola do Servo Inútil nos ensina que, se o trabalho não pode ser um fim em si mesmo, pessoal ou social para o homem, “nem por isso deixa de ser um dos mais importantes aspectos de sua vocação, de sua obediência e de sua fidelidade”. “Quem conhece a participação de Deus na vida econômica longe está de poder fazer de seu trabalho um fator primordial da existência. É o que a parábola do servo inútil põe evidência” (BIÉLER, 1990, p. 520). Comentando a parábola, Calvino diz:

Impõe-se-nos deter nesta sentença de Cristo, de que nada fazemos para com Deus que não tenhamos a obrigação de fazer, que, porém, nos mantém ele sob seu domínio, com a estipulação de que lhe somos devedores de tudo o que temos e de que tudo deve ser posto ao seu serviço [...] Assim, pois, lembre-se cada um de que foi criado por Deus a fim de trabalhar diligentemente e de entregar-se à sua tarefa e isto não por um tempo, pelo contrário, até à morte e, mesmo, não somente para viver, mas ainda para morrer para Deus (CALVINO [CD-ROM] Lc 17.10, p. 147).

A esta ordem social confiada aos homens não é permitida a desonestidade nos negócios; pois, segundo Calvino, não é somente uma falta moral, mas um sacrilégio, um roubo contra os bens e serviços que o Criador providenciou à manutenção de seus filhos. Deus exige honestidade nos contratos, pesos e medidas, especulação e monopólio. Ele nos adverte a quaisquer medidas que provoquem a desorganização econômica e social. Comentando o texto de Amós, Calvino, diz que

A estes ladrões e assaltantes que lhe parecia deterem o poder de oprimir a gente pobre e o pequeno trabalhador; uma vez que eram eles que tinham grande abundância de trigo e grãos; como hoje vemos diante da carestia que haverá. [...] Os quais terão seus celeiros fechados; é o mesmo como se cortassem a garganta aos pobres, quando os fazem assim sofrer fome (CALVINO [CD-ROM] Am 8.5, p. 213).

As profissões

Como responder à vocação de Deus? A escolha profissional é de Deus ou pertence aos homens? Deus nos chamou para o trabalho, desde a criação – é nova vocação. Qualquer um realizará com satisfação e entusiasmo, a obra pela qual Deus lhe deu. Se o nosso trabalho não for aquele pelo qual ele nos chamou, será inútil, não é senão pura agitação vã. Não basta exercer qualquer função, temos que levar em conta o querer de Deus. Portanto, escolher uma profissão não deve ser em função de maiores ganhos, nem para agradar os pais, e, sim, de que tipos de serviços você prestará a Deus e aos homens. Vocação também quer dizer “chamado”. Deus jamais nos chamará para fazer algo que contraria a sua própria Palavra. Por isso a escolha da própria profissão deve vir de Deus, que nos chamou para tal. Nenhuma profissão será aprovada por Deus se ela não for útil a si e ao próximo (BIÉLER, 1990, p. 528, 529).

Deus chama a cada um para uma função particular com o fim de servir a sociedade como um todo. Esta divisão do trabalho é “um dos fatores da solidariedade humana sobre a qual se fundamenta a vida social”. Essa associação e ajuda entre os seres humanas, através dos dons, no final, cumpre a plena vontade de Deus.

Cada um é chamado por Deus, conforme a sua vocação, para uma tarefa particular. Deus o torna dependente do trabalho e do serviço de outrem. “A divisão do trabalho corresponde, pois, o desígnio de Deus e manifesta a interdependência de suas criaturas, chamadas a viver em sociedade. É a expressão concreta, visível e necessária de sua solidariedade. Ela pressupõe o intercâmbio contínuo entre os indivíduos, a reciprocidade que os liga uns aos outros.” (BIÉLER, 1970, p. 58).

Enquanto, na Antigüidade era conferido o trabalho nobre aos homens livres e o trabalho manual aos escravos, Calvino ensinava que as Escrituras proíbem qualquer diferença social ou preconceito entre os homens. Não há ocupações indignas. De forma clara e objetiva, evidencia a participação do trabalho humano na obra divina. Conferiu ao labor humano dignidade e valor espiritual. Esse fato, segundo Biéler, irá influenciar para o desenvolvimento econômico das sociedades calvinistas.

Na Idade Média, o trabalho era visto apenas como um dever terreno, sem qualquer relação espiritual ou com a fé ou ética. Tirando todo o prestígio e valor espiritual das atividades profissionais e dando prioridade à vida contemplativa. Haviam estabelecido certas hierarquias entre as ocupações mais legítimas.

Todo trabalho é digno perante Deus. Pois é Deus quem o capacita a trabalhar. “Quem é que dá a prudência, a destreza do corpo, a força para trabalhar, as aptidões, e os meios, não é Deus que tudo põe em suas mãos?” Ora, “nenhum artesão do mais baixo mister que seja, não é excelente em seu desempenho senão na medida em que o Espírito de Deus nele opera”. A secularização do trabalho é um pecado tão grave quanto sua divinização. Há um certo equilíbrio, pois na medida “em que o trabalho é relacionado com o Deus, na fé e na obediência, é ele acompanhado de bênçãos”. Entretanto, ao trabalho divino, lhe é atribuído “a mais eminente dignidade”, ou seja, o trabalho espiritual está acima do profissional (BIÉLER, 1990, p. 523).

O comércio e as trocas são o complemento necessário para a ordem social intencionada por Deus e confiada aos homens. Deve aliviar o homem de suas privações e tornar a sua vida mais agradável. A fraude e a desonestidade causada pelo pecado – que deturpa o comércio da sua real função – impossibilitou e solapou as relações econômicas. Não é apenas um pecado contra a moral, é um sacrilégio contra Deus.

O homem do campo, segundo Calvino, é o trabalhador que mais, visível e imediatamente, está sujeito às ações divinas. Tanto as adversidades como as bênçãos podem ser sinais da graça ou ira de Deus, respectivamente. Tudo isso tem um caráter didático para o homem, prosperidade ou penúria, fome ou riqueza, saúde ou doença, boas ou magras colheitas. Essas situações podem, muito bem, ser provações ou castigo para aumentar a fé dos fiéis (BIÉLER, 1990, p. 560).

Devido à natureza humana corrompida, a desordem natural pode ser um sinal da advertência de Deus. Por outro lado, a harmonia natural, também, pode ser sinal da graça de Deus. Muito embora Deus dá sol aos bons e maus (Mt 5.45), não deixa de punir o seu povo ou um indivíduo em particular com tempestades ou outro juízo. Tudo isso tem um caráter pedagógico de Deus (CALVINO [CD-ROM], Gn 4.12, p. 132).

Levando em consideração que o que temos pertence a Deus e que não temos direito pleno e absoluto sobre nossos bens, por conseguinte, não podemos esbanjar. Como desperdiçar aquilo que, na verdade, não nos pertence? O patrimônio de Deus deve ser administrado por nós para servir as necessidades e não para o desperdício econômico fútil. O Criador não quer que exploremos de maneira desregrada a ponto de esgotar as riquezas de sua natureza somente pensando no lucro econômico momentâneo e egoísta. Essa exploração intensiva e esterilizante dos recursos naturais, fornecida para a subsistência da humanidade, é uma ofensa à providência de Deus.

Não somente o trabalho do homem do campo é diretamente agraciado por Deus, mas também qualquer outro serviço que ele nos confiou para o bem da sociedade. Cientistas, trabalhadores braçais ou intelectuais são pessoas dotadas de dons dados por Deus para servir ao gênero humano. Cada um dará conta de si perante o tribunal de Cristo daquele ou daqueles dons que recebeu.

Não importa quais sejam os dons que o Senhor nos dá, devemos depositá-lo como dinheiro a um banco, para termos lucro dos juros. Enterrar e não aplicar para obter ganho seria um sacrilégio para Deus, pois ele nos recomenda a darmos bons frutos (CALVINO [CDROM], Lc 19.13, p. 328).

A Escolástica havia preservado a hierarquia moral das profissões. Dando primazia à agricultura e um certo menosprezo às profissões liberais como comerciantes e banqueiros. Biéler, fazendo uma análise crítica da doutrina conclui que

Foi seguramente essa noção calviniana e evangélica da eminente dignidade do trabalho, e mais ainda do trabalhador, que em todas as outras gerações suscitou o zelo reformista do protestantismo social. Onde quer que o Calvinismo permaneceu fiel ao princípio de base de seu fundador, que prescreve contínua renovação da fé, e da doutrina, e da vida, em contato com as Escrituras, foi ele fecundo em iniciativas sociais tendentes a dar a todos os trabalhadores o sentido e a dignidade de seu labor, contra todas as formas de alienação e de opressão (BIÉLER, 1990, p. 540).

Reconheçamos que nem todos exercem sempre a profissão que desejariam, nem todos se sentem realizados profissionalmente. Portanto, é necessário conduzir-se pacientemente em confiança e, constantemente, com a própria condição, até que Deus nos dê o privilégio de consagrarmos em nosso trabalho desejado (BIÉLER, 1990, p. 529).

Ademais, é preciso notar-se que há diferentes modalidades de trabalho. Quem quer que ajude e produz o benefício à sociedade humana através do seu labor, seja governando a própria família, seja administrando negócios públicos ou particulares, seja aconselhando, seja ensinando a outros, ou de qualquer outro modo que seja, não deve esse ser contado entre os ociosos (CALVINO [CD-ROM], 2 Tss 3.10, p. 44).

Sua arte e profissão devem redundar em servir ao próximo, no proveito comum de todos. Calvino jamais condenou a profissão, mesmo de mercador, comerciante ou financista, pelo contrário, lutou contra os abusos e os excessos dos mercantilistas de sua época. Buscava ele estabelecer na sociedade certa moral econômica, baseada nas Escrituras.

O salário
Tudo pertence a Deus. O homem não tem direito a nenhuma remuneração da parte de Deus. Ele não pertence ao empregado e nem ao patrão, ambos devem ter consciência disto. O salário é fruto da sua imensa graça, bondade, amor e misericórdia, para a nossa subsistência. É o sinal de sua providência que assiste nossas necessidades vitais. Sendo assim, o salário do próximo, também, não nos pertence. Deve ser estabelecido de comum acordo, justo e livremente em plena consciência de sua responsabilidade, em busca de suprir as necessidades reais do trabalhador. Esse é o significado espiritual do salário (BIÉLER, 1970, p. 56).

Se tudo pertence a Deus e estamos cumprindo uma ordem do Criador, conseqüentemente não merecemos recompensa, pelo contrário, nós é que somos devedores de tudo que temos e somos, tudo deve ser empregado a seu serviço. É isso que nos diz a Parábola do Servo Inútil.

É o que Cristo entende, quando diz que somos servidores inúteis, isto é, uma vez que Deus nada recebe de extraordinário de nossa parte, antes, recolhe apenas o rendimento ordinário e os deveres que de direito lhe pertencem, a título de senhorio. Impõem-se, portanto, estes dois pontos a serem bem esclarecidos: que Deus, naturalmente, nada nos deve e que por todo serviço que lhe prestamos não merecemos sequer uma palha (CALVINO [CD-ROM], Lc 17.7, p. 145).

Entretanto, Deus, não sendo devedor de nada, mesmo assim, pela sua graça e bondade infinitas, ele nos sustenta abundantemente, e nos suprindo em nossas necessidades – sejam elas quais forem. Assim, todo salário ou remuneração é fruto da liberalidade, benevolência e amor paterno. “Apesar de sua recusa em legitimar a revolta dos assalariados explorados e de seu recurso à violência, o reformador admite que Deus se serve amiúde da sua desobediência para julgar os que os exploram. Não se opõe aos protestos não-violentos nem à guerra.” (BIÉLER, 1970, p. 56).

Antes da Reforma, com a alta dos preços e a defasagem salarial, alguns trabalhadores (para defender seus interesses) se organizam em confrarias clandestinas, criando “uma espécie de proletariado não raro turbulento”. Surgem algumas greves, como é o caso da greve dos gráficos em Lion, 1539, motivados pela insuficiência dos salários e por não concordarem com a distribuição dos horários de trabalho. Em Genebra, 1559, o Conselho da cidade fixa o limite máximo do salário dos operários e em seguida priva-os do direito de coalizão. Tal repressão da liberdade desemboca, sob a iniciativa dos pastores, em descontentamentos e debates entre operários, patrões e autoridades. É exemplar a atividade social que o reformador, e seus colegas, desenvolveram na busca da paz e justiça salarial, principalmente entre os gráficos e docentes; contribuindo, assim, para o desenvolvimento sócio econômico de Genebra (BIÉLER, 1970, p. 57).

Para Calvino, o salário tem um valor extraordinariamente elevado, pois é um sinal da graça e paciência de Deus. Ele valoriza nosso labor nos oferecendo galardão e bênçãos. É o penhor do seu amor testificado através da providência de Deus em manter suas Escrituras. Por isso, o salário não pertence a nós e sim a Deus, só ele o pode dar. Logo, o patrão faz, senão, encaminhar ao próximo, aquilo que Deus lhe presenteou. Deus não dá o direito de extorquir ou atrasar o salário, ou parte dele. É graça de Deus para o sustento de seus filhos. Recompensem àqueles que Deus colocou em nosso caminho para nos ser canal de bênçãos. Rendamos graças a Deus e aos que trabalham para nós, pois Deus os pôs em nosso benefício.

E ainda, quanto ao salário justo que se deve pagar ao trabalhador, que não tem outro modo de se sustentar e nem outro emprego. É um sacrilégio, quando o patrão, o constrange a trabalhar por menor salário ainda, menos que o suficiente para sua subsistência. Isso não é apenas cometer injustiça social, opor-se à ordem divina, subtraindo o sustento do próximo. “A exploração dos assalariados é um crime que pede a vingança de Deus.”

Aquele que de um homem pobre arrancou o trabalho e, por assim dizer, lhe sugou o sangue, se, depois, o despede nu e indigente, é isso mais malévolo e monstruoso do que se a vida tirasse a um desconhecido. [...] Se um rico mantém, como se diz, o bico na água a um pobre trabalhador da terra ou a um trabalhador braçal, após ter abusado de seu trabalho, é isso quase lhe cortar a garganta, privando-o de seu sustento regular. A suma é que tal humanidade se guarde que ninguém seja lesado, nem sofra prejuízo por ser mal pago. [...] Quando os pobres que tenhais empregado em obra vossa, e que tenham posto seu labor, seu suor e seu sangue a vosso serviço, não tenham sido assalariados como convém, e não os tenhais confortado e sustentado; se a Deus vingança pedem contra vós, quem vos será procurador, ou advogado, que vos possa livrar? (CALVINO [CD-ROM], Jr 22.13, p. 951; Lv 10.11, p. 156; Dt 22.4, p. 47).

Principalmente àqueles que não tem quem ou como se defenderem. A estes, o próprio Deus os defenderá.

Deus ouvirá os gemidos dos aflitos que aqui não acham advogado nenhum, nem procurador. E de fato, quanto mais aquele que foi pilhado e roubado é resignado em sofrer a injustiça, tanto mais cedo estará Deus pronto a manter-lhe a causa (CALVINO [CD-ROM], Dt 24.14, p. 92).

O salário não pode ser fixado por um determinado cálculo com exatidão para todos os trabalhadores. Deve, sim, antes, ser visualizado e levado em consideração: as necessidades materiais dos trabalhadores e da dignidade de serem filhos de Deus, considerando mais o amor que a lei.

O Descanso
Para compreendermos melhor a noção bíblica sobre o trabalho, nos faz necessário observar, também, o verdadeiro significado do descanso. Em comunhão com Deus e pela mediação de Cristo é que poderemos reintegrar o justo sentido do trabalho. Também há necessidade de descanso; por isso Deus criou o sábado, o dia de repouso, o dia de santificação, o dia de ter acesso ao labor divino.

Enquanto repousam, no repouso sabático, sentem necessidade de Deus em sua vida. A santificação restabelece-o na ordem e na ação de Deus. Seu trabalho volta a ser parte do trabalho de Deus. “Ao mesmo tempo, o homem restaura justas relações sociais com o seu próximo. É a razão por que o mandamento sobre a santificação do dia de descanso faz menção das relações de trabalho, e das relações entre senhores e servos” (BIÉLER, 1970, p. 51).

Le Goff relata que a guarda deste dia de descanso, apesar de lutas milenares, foi determinante para alavancar a economia ocidental:

O ritmo dos sete dias e a sacralização do Domingo (sobre o modelo da Criação), até hoje objeto de lutas sindicais, deu uma atenção particular ao trabalho e ao descanso (o respeito ao repouso dominical foi objeto de uma rigorosa regulamentação na época carolíngia). Essa divisão determina um ritmo de atividade econômica que, penso, foi muito favorável à boa produtividade do Ocidente medieval (LE GOFF, 2005b, p. 133, 134).

O Ócio
O homem foi criado para trabalhar. O trabalho realiza o destino do homem aqui na terra. Por outro lado, a ociosidade é uma forma de alienação humana, contrária à natureza humana. “Significa a recusa pelo homem de sua vocação divina, sua ruptura com Deus, uma ofensa a Deus.” O trabalho traz a bênção divina enquanto o ócio trás a sua maldição.

“Tenhamos vergonha de ficar ociosos.” Aquele que não trabalha não é digno de ser alimentado. Bem-aventurado é aquele que come do seu próprio labor. A bênção do Senhor está sobre as mãos daquele que trabalha, por outro lado, a ociosidade e a indolência são malditas por Deus.

A Bíblia condena, com extremo rigor, aqueles que vivem do trabalho alheio. São tidos por vadios e inúteis os que vivem do suor alheio, em nada contribuindo para a humanidade. “É, pois, razoável que os que querem se isentar da lei e regra comum seja também privados de sustento, que é o salário do labor.” [...] “Os indolentes constituem um flagelo à sociedade; são tão prejudiciais aos outros quanto a si mesmos” (CALVINO [CD-ROM], 2 Tss 3.10, 11, p. 44, 45).

O ócio é um vício grave. É um sinal de impiedade e de desobediência à ordem divina para o trabalho. Ele recusa, despreza e esbanja os dons que Deus lhe deu para servi-lo e ao próximo. Cristo, no juízo final, nos pedirá conta dos dons que recebemos, e não haverá escusas para os que sufocam seus dons e vivem preguiçosamente (Cf. Mateus 25.27).

Os vagabundos: decretado que se faça proclamação pública de que todos os vagabundos estrangeiros, que não tenham meios de ganhar a vida, sejam obrigados a deixar a cidade em três dias e os outros todos da cidade devem trabalhar, cada um em sua profissão, sob pena de serem postos em prisão (BIÉLER, 1990, p. 222).

Os reformadores, em seu tempo, condenando a ociosidade, atacavam diretamente ordens religiosas e monges que viviam às expensas da caridade pública. Denunciavam a interpretação, segundo eles, “equivocada e abusiva” dos pobres do Evangelho. Calvino relata que:

Qual é esta bela maneira de vender tudo de que se vangloriam os monges? A maior parte deles, porque não tinham eles de que alimentar-se em suas casas, se encafuaram em mosteiros como se em possilgas bem abastecidas. Tanto é que todos dão boa ordem à sua conveniência que engordam as expensas dos outros, sem trabalharem. Certamente aí está uma bela troca: isto é, em lugar do que nos é ordenado, dar aos pobres o que possuímos, justamente estes, não contentes com o seu, arrebanham os bens dos outros (CALVINO [CD-ROM] Mt 19.21, p. 297).

O Desemprego
Deus condena severamente aqueles que, tendo condições financeiras de empregar alguém, privá-os de trabalhar. Isso é uma ofensa, um flagelo ao ser humano e também a Deus. Tirar o trabalho do homem é privá-lo de ser homem, é tirar-lhe a própria vida. O trabalho é o sangue do trabalhador. Principalmente se este for um pobre. Pior é “haver espoliado um homem pobre do labor de suas mãos; pois que, já o temos dito, não dispõe ele de outra fonte de renda nem herança e, ademais, não poupa ele seu trabalho, nem seu sangue para ganhar a vida.” (CALVINO [CD-ROM], Dt 24.14-18, p. 92).

O ganho do trabalhador pobre serve-lhe apenas para ganhar a vida, pois não tem rendas, propriedades, nem poupança para sua segurança; “ora, porque assim Deus lhes pôs a vida nas mãos, isto é, em seu trabalho, quando são privados dos meios necessários, é como se a garganta deles fosse cortada. Reitero que a vida deles está no seu labor” Cf. Dt 24.1-6 (BIÉLER apud CALVINO, 1990: 534). E ainda:

Deus dará descanso àqueles a quem ama; enquanto os outros sofrerão grande labuta, deitarão tarde e levantarão cedo de manhã, terão de comer pão de rala e beber água da angústia, nada lhes aproveitará, ao invés de progredirem, retrocederão, enquanto os filhos de Deus prosperarem em todos os seus feitos. É, pois, a pura e graciosa bênção de Deus que sustenta os homens, como vimos anteriormente que Moisés dizia: Não pensarás que seja a tua diligência, nem o labor de tuas mãos, que te sustenta e te deu sustento, sabe que é teu Deus que tem agido e estarias desprovido de tudo, não fosse que ele o haja providenciado. Impõem-nos indubitavelmente, reitero-o, ter isto por plena conclusão. Vemos aqui, no entanto, que Deus atentou para o trabalho; quando falou da vida dos homens, levou em consideração a ordem que estabelecera, isto é, que um homem se dedique ao trabalho de suas mãos; Deus fez a promessa: Abençoarei o labor de tuas mãos quando cumprires com a tua obrigação. Ainda que, pois, recebamos nosso sustento da mão de Deus, ordenou ele que trabalhemos. É o trabalho vedado? Eis posta abaixo a vida do homem CALVINO [CD-ROM], Dt 24.1- 5, p. 74).

Da mesma forma, também, é um crime tomar como penhor os instrumentos de trabalho. Deus proíbe tomar tudo quanto é necessário aos pobres para ganharem a vida e se manterem.

Essa gente trabalhadora não pode prescindir em sua atividade regular, como se alguém tirasse pela força de um lavrador a charrua, a gradeadora e outros equipamentos, ou fechasse a oficina de um sapateiro, ou de um oleiro, ou de qualquer outro, de tal modo que não mais pudesse exercer sua arte, estando desprovido de seus instrumentos e ferramentas, o que se vê pelo fio do texto, quando se diz que a vida está engajada com as mós. Aquele, pois, que toma como penhor o que sustenta a vida de uma pessoa pobre é cruel, como se arrancasse o pão da boca de um homem esfaimado, até mesmo como se a vida lhe tirasse, por isso que é ela cerceada, se forem suprimidos os meios de seu sustento (CALVINO [CD-ROM], Dt 24.6, p. 99).

Não devemos abusar do trabalho de outrem, pelo contrário, Deus quer e declara que devemos ter atenção especial para com os pobres e especialmente com os indefesos.

Nos é necessário tratar com tal humanidade aqueles que trabalham para nós, que não sejam gravados além dos limites; antes, que possam permanecer servindo e tenham motivos de render graças a Deus por seu trabalho. Dúvida nenhuma há de que Deus tenha aqui desejado corrigir a crueldade que caracteriza os ricos, que empregam em seu serviço a gente pobre e não recompensam devidamente o seu labor (CALVINO [CD-ROM], Dt 25.1-4, p. 39).

A aplicação dessa doutrina em Genebra foi um exemplo da prática vivida por Calvino. Algumas medidas já haviam sido tomadas antes de sua chegada: “o domingo fora declarado feriado, ao passo que outros dias de festa tinham sido supridos. Proibira-se também a vadiagem, exigindo-se que cada um tivesse alguma ocupação com que ganhar a vida.” (BIÉLER, 1970, p. 51).

Outras medidas emergentes foram criadas, pelo reformador, com chegada à cidade de inúmeros refugiados. Formação profissional aos jovens, readaptação dos adultos a novos empregos, ocupações remuneradas provisórias aos que ainda não haviam encontrado emprego na sua profissão. Também criou novos empregos e novas profissões. “Calvino entrevêm junto ao Pequeno Conselho para que, este, crie a indústria de tecelagem. Um dobador de seda lionês é incumbido de instruir os jovens internados no hospital público (hospital que abrigava indigentes). Mais tarde, certo Lucquois estabelece manufaturas de tecidos de seda. Outros refugiados, não satisfeitos em trabalhar na indústria, introduzem a cultura da amoreira e a criação do bicho-da-seda.” (BIÉLER, 1970, p. 52).

No trabalho, o homem se realiza na obediência a Deus. No desemprego, o homem é privado de sua própria humanidade, é um flagelo social, um verdadeiro crime. Da mesma forma é um crime explorar o trabalhador. O trabalho gera a riqueza. O dinheiro representa a riqueza do homem. Pode utilizá-lo para si ou para o bem comum. Tudo vai depender do significado e do valor que este lhe dará”

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Fonte:
CLÁUDIO CÉSAR GONÇALVES: "O USO SOCIAL DA RIQUEZA EM JOÃO CALVINO". (Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Ciências da Religião da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Ciências da Religião. Orientador: Prof. Dr. Hermisten Maia Pereira da Costa). São Paulo, 2006.

Nota
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Para uma compreensão mais ampla do tema, recomendamos a leitura da tese em sua totalidade.

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