O fenômeno das migrações



O fenômeno das migrações: em busca de uma explicação

"O fenômeno migratório é algo típico do ser humano, enquanto ser que procura sobreviver e transcender-se. Assim, a história da humanidade sempre esteve relacionada com tal processo. Encontramos exemplos nos povos primitivos caçadores e coletores – que migravam sempre que escasseavam frutas e víveres. A bíblia narra este fenômeno, através da busca da “terra prometida”, isto é, a terra leva o ser humano à mobilidade.

Neste sentido, o enfraquecimento do solo, a sua escassez e os fatores climáticos – catástrofes naturais – provocam a falta de alimentos e forçam a migração. Ainda, as pressões demográficas, fruto da incompatibilidade entre o crescimento populacional e o ambiente humano são, sem dúvida, outro fator do processo migratório. Por fim, a história tem -nos mostrado uma relação entre a migração e a fuga por causa de inimigos, ou seja, o ser humano migra toda vez que não suporta pressões físicas ou morais.

Fausto Brito, tratando sobre as migrações, analisa-as sob o ponto de vista do desenvolvimento do capitalismo. Assim, inicialmente, ele afirma que “uma das características da história do capitalismo tem sido a intensa mobilidade espacial da população”. Porém, na fase comercial capitalista, por ser de expropriação, houve a acumulação de capitais na Europa e, a partir do século XVIII, acontece a revolução industrial, o que provocou mudanças no campo e na cidade. Tal mudança está relacionada, acima de tudo, com a utilização da máquina e com o cercamento dos campos, o que, aliás, vai provocar contradições: por um lado, melhorar o padrão de vida do europeu, provocando um crescimento populacional e, de outro, a incompatibilidade entre o contingente populacional e o espaço. Como decorrência, assiste-se a emigração européia em massa. Nesse mesmo sentido, Martin Dreher afirma:

Dois foram os motivos que provocaram essa emigração: a existência de vastas regiões com baixa densidade populacional e a explosão populacional européia. De 1750 a 1914, a população européia praticamente triplicou. De 140 milhões, em 1750, passou para 452 milhões, em 1914. No mesmo período, além disso, o número de europeus e descendentes instalados no além-mar passou a ser de 160 milhões. Causa principal desse êxodo considerável foi a invenção da máquina e a revolução econômica e social a ela ligadas.

No que se refere à doutrina liberal, Adam Smith foi o primeiro a acenar para as contribuições econômicas do processo migratório. Posteriormente, os liberais passam a defender as migrações, tanto para livrar as pressões demográficas como para criar um mercado consumidor, fora da Europa. Assim se refere Maria Beatriz Rocha Trindade:

Outros liberais do século XIX, entre os quais Stuart Mill (1806- 1873) defendiam por isso que a emigração para as colônias era vantajosa para a economia das metrópoles. Para além de constituir um mercado para as manufaturas nacionais e de promover o investimento estrangeiro, permitia o alívio das pressões provocadas pela sobre população.

Este novo pensamento sobre as migrações ecoou na América. O fato é que existe um pensamento filosófico e ideológico na Europa, favorável às migrações, bem como um mundo concreto, fruto da evolução do capitalismo, forçando o europeu a migrar.

A partir da segunda metade do século XIX, principalmente depois de 1870, o mundo vai assistir o fenômeno das migrações em massa. Fausto Brito, apoiado em Hobsbawm, nos traz dados que mostram a existência de tal fenômeno:

Estima-se que, entre 1850 e 1914, aproximadamente 30 milhões de pessoas emigraram da Europa para a América, principalmente para os Estados Unidos, Brasil e países da Bacia do Prata. Até aquele período, este foi o maior movimento migratório internacional da História dos povos. Entre 1846 e 1875, 9 milhões de pessoas, quatro vezes a população de Londres, deixaram a Europa. Só das Ilhas Britânicas, no período 1851/1880, saíram aproximadamente 5,3 milhões de pessoas, sendo que 3,5 milhões para os Estados Unidos, 1 milhão para a Austrália e 800 mil para o Canadá. Calcula-se que, na década de 80, do século XIX, 700 a 800 mil europeus emigraram por ano e, na década seguinte, 1 a 1,4 milhão por ano.

O acirramento das migrações está relacionado com o desenvolvimento do capitalismo. A revolução industrial e agrícola produziu uma reserva demográfica. Soma-se a isso a corrida imperialista, provocando uma certa crise econômica e política e o desenvolvimento tecnológico, que facilitou o deslocamento, diminuindo as distâncias. Porém, se são vários os fatores das migrações, relacionados ao desenvolvimento capitalista, não podemos nos reportar somente a ele para explicarmos o fenômeno, pois houve migrações, mesmo neste período, em países pré-capitalistas, como é o caso dos asiáticos que migraram para outros países da própria Ásia ou outros continentes.

Por ora, pensamos ter destacado alguns elementos que contribuem para explicar o fenômeno migratório, mesmo que não tenhamos estudado as migrações no século XX, por fugir ao recorte temporal de nosso estudo. Passamos agora nossa análise para um recorte espacial mais particular, que é o caso da imigração alemã para o Brasil, procurando identificar e analisar os fatores da emigração e imigração.”

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Fonte:
WILSON OLKOSKI: "HISTÓRIA AGRÁRIA DO MÉDIO ALTO URUGUAI – RS: COLONIZAÇÃO, (RE)APOSSAMENTO DAS TERRAS E EXCLUSÃO - 1900/1970". (Dissertação apresentada como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em História, na área de Estudos Históricos Latino-americanos, pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos. Prof. Orientador: Dr. Marcos Justo Tramontini). São Leopoldo, 2002.

Nota
:
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