Sousa também buscou em teorias fora dos estudos de comunicação, idéias que podem auxiliar no entendimento dos fatores que influenciam na construção, como a antropologia, que alimenta a questão dos padrões culturais do ambiente do jornalista. Dessa maneira, também se inclui outra faceta, a da construção do imaginário.
As limitações explicativas da ação pessoal e da ação social seriam ultrapassadas pela adição da ação cultural – as notícias seriam vistas não apenas como um produto das pessoas ou um artefato produzido por organizações sociais, mas também como um artefato que, mesmo involuntariamente, se apóia e faz uso de padrões culturais pré-existentes para ser realizado e para produzir sentido (por exemplo, na nossa cultura, notícia é, de alguma forma, o que é novo, a resposta a questão “Que novidades há?”(SOUSA, 2002, p.38).
Schudson (1995) argumenta que as notícias são importantes construtores de um mundo de símbolos utilizados por todos:
A notícia tem uma democrática função vital, independente se há alguém escutando ou não. As notícias constroem um mundo simbólico um certo tipo de prioridade, uma certificação de grande importância legítima. E esse mundo simbólico, putativa e praticamente, por sua acessível disponibilidade, em seu comum cotidiano, em sua descartável forma material, torna-se propriedade de todos nós. Esta é uma lição da própria democracia. Isso faz da notícia um recurso quando o povo está pronto para tomar uma ação política, quer sejam essas pessoas cidadãos comuns ou lobistas, líderes de movimentos sociais ou juízes federais. Trata-se da necessidade e da promessa do conhecimento público que chamamos de notícia e da cultura política de que é parte essencial (SCHUDSON, 1995, p.33).
São esses padrões, estereótipos etc., que formam a imagem da imprensa perante o público e as imagens que essa imprensa publica e veicula. Nesse caso, podemos observar que um conjunto de experiências e vivências constroem imagens e personagens, nem sempre fiéis ao real, mas vistos como real através das visões individuais. Essas tradições seriam formuladas, “criadas e perpetuadas pelas leis, pelos constrangimentos econômicos, processos políticos e pressões políticas, bem como pelas dinâmicas sociais na cultura em que essas relações aparecem” (GAUNT, 1990, p.20).
Philippe Malrieu, em A construção do imaginário, relata como surgem os comportamentos de imaginação de uma sociedade, que muito bem se encaixam com as construções de imagens no jornalismo:
(...) o modo como numa determinada sociedade, e mediante a influência de um sistema coletivo de crenças pré-existente, são construídos os comportamentos individuais da imaginação, por meio dos quais o sujeito estabelece relações entre as coisas e os seres formando uma rede de significações que, ao contrário das que se formam durante o sonho, se revelam fortemente estruturadas e dotadas de estabilidade (MALRIEU, 1996, p.51/52).
Sendo assim, mesmo mantendo algumas características individuais, os jornalistas, o exemplo mais próximo nesse estudo, possuiriam imagens e personalidades possivelmente muito parecidas, independente da cultura e local que vivessem. Schudson (1995) fala das convenções que ajudam a determinar padrões de comportamento e imaginário, sendo a notícia como algo não ficcional, mas convencional (p. 55). Para o autor, as notícias são feitas de maneira a adaptar o mundo social dos leitores ao mundo de quem as redige. “Sua função é menos de aumentar ou diminuir o valor de verdade das mensagens transmitidas do que estreitar a gama de tipos de verdades que podem ser ditas” (SCHUDSON, 1995, p.55).
Wolf afirma: “(...) a temática dos efeitos se identifica com a perspectiva dos processos de construção da realidade” (1999, p.141). Seriam a comunicação e os veículos importantes personagens na construção da realidade dos indivíduos, agindo como a “moldura” que define o enquadramento que cada um faz da sociedade em que participa.
Roberts (1972) apresenta de maneira ampla o papel dos meios na construção da realidade: “A influência dos mass media é admitida sem discussão, na medida em que ajudam a estruturar a imagem da realidade social, a longo prazo, a organizar novos elementos dessa mesma imagem, a formar opiniões e crenças novas” (p.377). O autor também recorre à importância dos standards apresentado pelos meios de comunicação na construção de imagens do indivíduo:
Na medida em que o destinatário não é capaz de controlar a precisão da representação da realidade social, tendo por base um standard exterior aos mass media, a imagem que, por intermédio dessa representação, ele forma , acaba por ser distorcida, estereotipada ou manipulada (ROBERTS, 1972, p.380).
Schudson (1995) revela que os meios de comunicação auxiliam a prover materiais que informem e participem da construção do cidadão, mas eles não criam o cidadão informado. “O cidadão informado aparece na sociedade onde estar informado faz sentido, porém isso não se classifica como função do caráter individual ou dos meios de comunicação, mas de cultura política” (p.171).
Noelle-Neumann (1984) defende que ao se utilizar facilitadores como padrões e convenções, automaticamente o homem está distorcendo, de maneira involuntária, sua percepção da realidade, para manter em harmonia o mundo que enxerga. “Em segundo lugar está apenas a necessidade de reduzir a complexidade cognitiva, e a percepção seletiva torna-se uma inevitável fonte de distorções da percepção da realidade e da maneira como a relatamos9” (p.147).
Ponte (2005) denomina o repertório de padrões da mente como memória, dividida em memória pessoal e memória social, que variam de acordo com diferentes biografias e universos aos quais o sujeito está inserido. A autora define as subdivisões da memória da seguinte maneira:
A memória pessoal, ou episódica, é uma memória de descodificação, processamento e interpretação de inputs sensoriais, a parte da memória que reúne crenças sobre experiências concretas (fatos, eventos, situações) em que participamos, que testemunhamos ou que recebemos pelo discurso dos outros. A memória social, também designada por memória semântica, reúne conhecimentos gerais, atitudes, ideologias, normas e valores que partilhamos com membros dos grupos, organizações ou cultura a que pertencemos (2005, p.111).Sendo o imaginário constituído de diversos aspectos de influência e definição, é possível afirmar que todo e qualquer tipo de produto desenvolvido pelo homem é resultado de uma colagem de aspectos, vivências e memórias. Assim, o jornalismo, como produto dessa sociedade em formato de colcha de retalhos, só pode refletir visões com multiperspectivas, como escreve Charaudeau:
Se são um espelho, as mídias não são mais do que um espelho deformante, ou mais ainda, são vários espelhos deformantes ao mesmo tempo, daqueles que se encontram nos parques de diversões e que esmo deformando, mostram, cada um à sua maneira, um fragmento amplificado, simplificado, estereotipado do mundo (2009, p.20).
Segundo Lang-Lang, “uma pessoa pode ser, ao mesmo tempo, um ídolo e um vilão, mas para diferentes pessoas” (1978, p.4), de acordo com o significados de imagem que essa pessoa carrega consigo e de qual ambiente ela está inserida. “Em última instância, existe uma tendência de acordo sobre se determinada pessoa merece homenagens ou escárnio”.
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Fonte:
BRUNA DO AMARAL PAULIN: "A CONSTRUÇÃO DAS IMAGENS DAS BANDAS THE BEATLES E THE ROLLING STONES ATRAVÉS DOS JORNAIS THE TIMES E THE GUARDIAN". (Dissertação apresentada como requisito para obtenção do grau de Mestre pelo Programa de Pós-Graduação
Nota:
A imagem (Revista “Ba-Ta-Clan”, 1867 – Biblioteca Nacional Digital) inserida no texto não se inclui na referida tese.
As notas e referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.
O texto postado é apenas um dos muitos tópicos abordados no referido trabalho.
Para uma compreensão mais ampla do tema, recomendamos a leitura da tese em sua totalidade.
Disponível digitalmente no site: Domínio Público
A Construção do Imaginário
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