A origem do projeto político



A criação do projeto político de Platão teve origem, antes de tudo, nas decepções do filósofo com os modelos de governo baseados na democracia e nas ações dos governantes de seu tempo. O ponto culminante dessa criação foi a condenação e morte de Sócrates.

Após terminar o serviço militar, Platão passou a compor a Eclésia, e foi durante esse período que começaram suas decepções com os regimes políticos de Atenas. Sócrates fazia parte da bulé de Atenas e em 406 assistiu à sessão onde foram condenados à morte os generais que venceram a batalha de Arginusas, ilhas do Mar Egeu, vizinhas a Lesbos. Platão passou a admirar mais ainda seu mestre Sócrates, ao vê-lo ficar contra o regime democrático de Atenas, quando não apoiou tal condenação. Logo a democracia ateniense se tornou oligarquia, os governantes passaram de quinhentos para trinta. Entre estes trinta oligarcas estavam Crítias e Cármides, parentes de Platão, que votaram pela condenação de Sócrates.

O filósofo dos Diálogos, inicialmente, preferiu a oligarquia ao modelo de governo que o antecedeu, a democracia, mas logo percebeu os abusos dos governantes. Porém, tinha suas obrigações militares com a pólis, e por esta razão fez parte das assembléias convocadas pelos oligarcas, ainda que não aceitasse participar ativamente dos atos do governo oligárquico.

A oligarquia caiu em 403, voltando a vigorar a democracia em Atenas. Porém, quando Platão estava conformado com este retorno, Sócrates foi julgado e condenado à morte, e uma das razões para tanto foi o fato de ter feito oposição ao governo oligárquico. Mas as questões envolvendo Sócrates eram maiores. O mestre de Platão era considerado um contraventor, por sua proposta educacional crítica, que muito se diferenciava da educação tradicional, que ia além de questões religiosas, pois também ele era acusado de tentar introduzir novos deuses na religião ateniense. Por isso, Sócrates foi considerado um corruptor da juventude.

Platão tentou demover os governantes democratas, buscando modificar a condenação à morte em multa, mas sua tentativa foi vã. Em Apologia de Sócrates, podemos ler sobre a imagem que ficou de Sócrates para a sociedade ateniense. Segundo Platão, as impressões eram muito ruins, devido a Aristófanes e à comédia As nuvens. Possivelmente vem do momento da morte de Sócrates a idéia de Platão, defendida na República, de que o governo deve ser realizado por filósofos e não por homens comuns.

A morte de Sócrates levou Platão ao questionamento sobre a ignorância dos governantes, em especial os déspotas, pois o ímpeto individualista que os guiava não permitia que enxergassem o que havia de mais essencial para o governo da cidade segundo o projeto político de Platão: a noção de pólis, de coletividade. A questão não deve ser compreendida como uma possível teoria comunista. Para Platão, assim como para boa parte dos gregos da época, a pólis estava acima da individualidade, mas a democracia, para aqueles que governavam sob sua égide estava desvirtuando os caminhos governamentais, com o individual se sobrepondo à pólis. Os governantes dispunham do poder a partir de suas necessidades individuais e da necessidade de se manterem de forma autoritária no mando. O poder tirânico se mostrou em Atenas quando Sócrates foi condenado, e, mesmo, após a queda do governo dos trinta, quando foi mantida a condenação.

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Fonte:
Ana Alice Miranda Menescal: “A IDÉIA DE JUSTIÇA E A FORMAÇÃO DA CIDADE IDEAL NA REPÚBLICA DE PLATÃO”. (Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado Acadêmico em Filosofia da Universidade Estadual do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Filosofia. Orientador: Dr. Jan Gerard Joseph ter Reegen). Fortaleza, 2009.

Nota
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