Sêneca: a identidade de uma vida com suas obras

A MORTE DE SÊNECA II

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SÊNECA: A IDENTIDADE DE UMA VIDA COM SUAS OBRAS

Sêneca foi uma pessoa preocupada com os valores morais, como também um homem que tentou adequar sua conduta às bases filosóficas adquiridas ao longo de toda a sua vida. Buscou demonstrar essa sua maneira de viver em várias de suas obras.

A apreciação da vida e das obras de Sêneca permite que se veja a importância dada à filosofia por esse pensador. A filosofia de Sêneca é prática, no sentido de que constitui uma reflexão sobre um modo de vida possível.


A vida de Sêneca: orador, político, filósofo e preceptor
Lúcio Aneu Sêneca nasceu na cidade de Córdoba, na Espanha, no ano 1 a.C. Esta cidade fora fundada por volta do ano 150 a.C., e sob o reinado de Augusto (63 a.C-14 d.C.) recebera o título de colônia romana, o que significava que seus habitantes passaram a adquirir os direitos de cidadãos romanos.

Os pais de Sêneca se casaram no ano
5 a.C., na cidade de Córdoba. O pai, Marco Aneu Sêneca, tinha então 51 anos, e a mãe, Hélvia Albina, 16 anos. Ali tiveram três filhos. O primeiro deles foi Marco Aneu Novato (4 a.C.), que se tornou orador reconhecido e procônsul, e alguns anos mais tarde recebeu o nome de Galião, por ter sido adotado por Júnio Galião, retórico cordobês e amigo de seu pai. O segundo foi Lúcio Aneu Sêneca, sujeito central deste estudo. O terceiro foi Marco Aneu Mela (1 d.C.), que foi procurador Imperial e pai do poeta Lucano (39 - 65 d.C.), sobrinho de Sêneca (ASTRANA MARÍN, 1947).

A
mãe de Sêneca, Hélvia, de origem rica, teve grande importância em sua vida, pois a ela o filósofo dedicou um de seus livros, Consolação a Hélvia. De seu pai, sabe-se que era um grande escritor e retórico que conquistou o respeito dos intelectuais e políticos de sua época.

A
família de Sêneca, por acreditar que a ascensão social se dava pela cultura, transferiu-se para Roma após o nascimento do terceiro filho, pois achava que a capital do Império apresentava melhores condições educacionais. Em Roma, Sêneca, entre seus sete e doze anos, teve aulas de leitura e escrita e adquiriu noções básicas de matemática. Depois, dos treze aos dezessete anos, passou a ter aulas de gramática.

Sêneca,
por querer fazer carreira política, passou a frequentar as aulas de declamação, onde aprendeu retórica. Esta continuava a ser o ápice da cultura, pois perante os tribunais, no Senado ou diante do público, o importante era manter-se respeitavelmente amparado por uma sólida base retórica (OLIVEIRA, 1998).

Paralelamente
aos seus estudos de retórica, Sêneca identificou-se também com a filosofia, com a qual o primeiro contato se deu por meio de Sócion de Alexandria (séc I), que ensinava uma filosofia de marcada inspiração pitagórica. Segundo os filósofos pitagóricos, para se obter a salvação fazia-se necessário identificar-se com o divino, afastando da vida os conflitos. O caminho para se chegar a isso era a contemplação teórica, que, para além dos conflitos, identificava a harmonia.

A
partir desse primeiro contato Sêneca nunca mais se afastou da filosofia, por acreditar que por meio dela encontraria as respostas para os problemas que atormentavam o homem. O filósofo teve como mestre também o cínico Demétrio (séc. I d.C.), o qual acreditava que falar e escrever eram práticas inúteis e que o melhor a fazer era abandonar o convívio social e viver somente em contato com a natureza.

Outros
dois mestres estoicos contribuíram para sua formação filosófica: Papírio Fabiano (séc. I) e Átalo (séc. I). Estes fizeram Sêneca conhecer o Estoicismo, cujo sistema filosófico melhor se ajustou aos seus projetos políticos (ASTRANA MARÍN, 1947). Tendo concluído seus estudos por volta do ano 20, Sêneca estava preparado para entrar na vida pública. A partir daí, sua vida foi profundamente marcada pela alternância entre a ação política e a dedicação à filosofia (PEREIRA MELO, 2007b).

No ano de 25 d.C. Sêneca teve que interromper sua carreira política para tratar de
sua saúde e empreendeu uma viagem ao Egito. Dirigiu-se à casa de um tio que ocupava o posto de prefeito do Egito. Em Alexandria fixou residência, pelo fato de a cidade ser um centro efervescente de vida cultural e religiosa, onde gregos, judeus e egípcios conviviam em constante troca de ideias. Aproveitou esse tempo para estudar as condições e os costumes da região.

Com a saúde restabelecida, em 31 d.C. voltou para Roma, onde retomou sua vida de
filósofo, literato, poeta e orador, assumindo o cargo de questor por influência de amigos. Entrou para o Senado, onde rapidamente obteve grande notoriedade, por seu talento em retórica e filosofia (LI, 1993). Sêneca cada vez ganhava mais prestígio e admiração, mas tornava-se também objeto de inveja, em particular do imperador Calígula (12-41).

Ao pronunciar, em 39 d.C., um discurso em público de cujo conteúdo não se tem
conhecimento, Sêneca causou grande irritação no imperador Calígula, que estava presente. A raiva do imperador era tanta que decidiu condenar o filósofo à morte; Porém deixou de lado esse projeto, pelo desgaste político que, em face da popularidade de Sêneca, essa execução poderia lhe trazer (ASTRANA MARÍN, 1947).

Calígula
foi assassinado, e quem subiu ao poder, eleito pelo exército pretoriano, foi Cláudio (10 a.C – 54), tio de Calígula, em uma decisão que o Senado teve que acatar. Sob o governo de Cláudio, no ano de 41 Sêneca foi exilado para a ilha de Córsega. A condenação teve como motivo a acusação de Messalina (15-48), esposa do imperador Cláudio, de que Sêneca manteria relações adúlteras com Júlia Livilla (? – 41), irmã de Calígula; porém o verdadeiro interesse da imperatriz era livrar-se dos membros da família imperial que eram contra as influências por ela exercida sobre o imperador, e por outro lado, livrar-se também de Sêneca, que tinha muito prestígio e popularidade.

A jovem Júlia Livilla foi condenada à morte sem que fosse provada a sua culpa ou que lhe fosse concedida a defesa. Sêneca foi castigado com o exílio de oito anos na ilha de Córsega,
que naquele tempo era habitada por populações quase selvagens. “Entre os quarenta e os cinquenta anos, quando podia não só consolidar, mas aumentar sua glória de homem político, de literato e de estudioso, ele vive na desventura do desterro e na solidão de um país bárbaro” (LEONI, 1957, p.17).

Sêneca aproveitou esse período para se dedicar aos estudos científicos e filosóficos, concluindo que a sua condenação e o seu exílio nenhum mal lhe haviam feito, pois para o filósofo estoico o sábio suporta todas as dores sem sofrer; dessa forma mostrava a todos a coerência entre o seu discurso e a sua prática.

Longe dos seus, o desterrado não perdeu tempo. Procedeu a elucubrações sobre a história da ilha; estudou o povo e seus costumes;dedicou-se a pesquisar Astronomia, Geografia, meteoros e marés [...]. O retiro (otium) permitiu-lhe dedicar-se à Filosofia que negligenciara um tanto, por causa de suas ocupações políticas anteriores
(ULLMANN, 1996, p.11).

Em
49, com a morte de Messalina, que foi condenada pelo próprio imperador, Sêneca volta a Roma por intervenção de Agripina (15-59), que se tornaria a nova esposa de Cláudio. Esta tinha o objetivo de tornar Sêneca o preceptor do filho de seu primeiro casamento, Lúcio Domício Enobarbo (37-68), então com onze anos, o qual, ao ser adotado por Cláudio, passou a se chamar Nero.

Com
a adoção de Nero, Cláudio o colocou na linha de sucessão ao trono, pois Britânico (41-55), seu filho legítimo, era três anos mais novo. Quando o imperador, arrependido, fez entender que iria revogar esse ato de adoção, morreu envenenado, em 54. Nesse tempo Sêneca foi a um segundo matrimônio com Pompéia Paulina, jovem de uma rica família senatorial. Sobre o seu primeiro casamento se sabe que teve um filho chamado Marco, que nasceu em 39 e morreu em 41.

A
partir de fins de 49, Sêneca passou a exercer a função de preceptor de Nero, tendo como grande preocupação preparar o jovem príncipe para romper com as bases tirânicas que particularizavam os imperadores romanos e formá-lo com as características de rei-filósofo (PEREIRA MELO, 2007b).

Com
a morte de Cláudio, Nero subiu ao poder aos dezessete anos e Sêneca continuava a seu lado, não mais como pedagogo, mas como conselheiro, ajudado por Lúcio Afrânio Burro, preparador militar e prefeito do Pretório. Sêneca e Burro converteram-se nos homens mais influentes de Roma, ganhando Sêneca o título de amicus principis.

Sêneca
começou por colocar seus amigos nos postos mais importantes da administração imperial e no Senado. Em 55 Agripina foi afastada do poder por Sêneca. “[...] numa conspiração palaciana, Sêneca praticamente afasta sua antiga protetora do poder e torna-se o senhor de fato do Império Romano” (LI, 1993, p.13).

Essa política adotada por Sêneca atrapalhava os planos de Agripina, cujo objetivo era, por meio da influência sobre Nero, dominar o Império. Nesse mesmo ano, Britânico, filho legítimo de Cláudio, também morreu assassinado por ordem de Agripina, que fazia de tudo para manter seu filho no poder e por meio dele governar.

Segundo
Willian Li (1993), o caráter de Nero foi corrigido, freado, porém mais tarde a tirania teve o predomínio. A grande culpada disto era Agripina, que na realidade queria governar por meio de seu filho e por isso não suportava a influência que Sêneca e Afrânio exerciam sobre Nero. Este, não mais ouvindo os conselhos de Sêneca, em 59, planejou o assassinato da própria mãe. Coube então a Sêneca, usando de todo o seu talento retórico, escrever o discurso que Nero iria ler no Senado, justificando a morte de sua mãe.

De acordo com G.D. Leoni (1957), após esse fato, como maneira de fugir das noites de
pesadelo e do terror em que vivia, Nero passou a frequentar os espetáculos e a embriagar-se, gerando uma grande desonra para a nobreza, o Senado, os cidadãos e os soldados romanos.

Essa
forma de vida assumida por Nero era reprovada por Sêneca e Burro, o que levou o imperador a dispensar as orientações dos dois conselheiros e a assumir plenamente o poder, no ano de 62.

Isso teve como consequência um progressivo afastamento de Sêneca do imperador. Tal situação se agravou com a morte de Burro, levando o filósofo a pedir permissão para se desobrigar das suas funções, com a justificativa de que precisava cuidar do seu espírito e dedicar-se a reflexões filosóficas, e a pôr à disposição todos os bens que havia recebido do imperador. Respaldado na lei, aprovada no tempo de Cláudio, que proibia aos senadores afastar-se de Roma por uma distância superior a sete milhas sem permissão do imperador, Nero negou a solicitação de Sêneca, alegando razões de interesse público. Para Nero, o afastamento de Sêneca poderia ser interpretado como uma desaprovação da política imperial (PEREIRA MELO, 2007b)

Em
65, foi descoberta uma conjuração contra o imperador, da qual Sêneca foi acusado de fazer parte. Mesmo sem prova, Nero condenou seu antigo conselheiro ao suicídio. Sêneca abriu as veias do pulso, mas como a morte demorava a chegar, decidiu cortar as veias dos pés, e para logo acabar com o sofrimento, bebeu uma porção de cicuta e em seguida tomou um banho de água quente, para apressar o seu fim. Compreende-se que Sêneca enfrentou a morte sem medo, aliando à sua teoria a sua prática, pois pregava que a morte era uma forma de libertação da alma, convicção que é apresentada frequentemente em suas obras.

As obras de Sêneca: filosofia de uma vida
Passando-se da vida às obras de Sêneca, pode-se dizer que os seus escritos são compostos por tragédias e tratados de caráter filosófico de cunho moral. As produções de conteúdo literário de Sêneca compõem-se de dez tragédias, que, em uma suposta ordem de produção (os anos dos seus aparecimentos são imprecisos) podem ser organizadas da seguinte forma: As loucuras de Hércules, As troianas, As fenícias, Medéia, Fedra, Édipo, Agamênnon, Tiestes, Hércules no Fta, Apocolocintosis e Octavia (que foi a ele atribuída).

A tragédia, teatralmente morta com Lúcio Ácio no início do século precedente, firmava-se como a forma de arte preferida da classe aristocrática romana. Era destinada à leitura nos círculos literários com o fim de debater concepções filosóficas ou políticas.

Pelo próprio título das tragédias de Sêneca percebe-se que são temas gregos que já haviam
sido desenvolvidos por poetas do período arcaico latino. No entanto, isto não o desmerece, pelo contrário, sua contribuição foi dotá-los de algo novo e adaptá-los à linguagem mais objetiva e informal, sem negligenciar a preocupação maior com a discussão dos males que atormentavam a humanidade.

As
tragédias senequianas perdem em teatralidade, mas são ricas em fatos, em exames psicológicos e em inspirações morais, pois Sêneca quer levar ao palco não o drama de Hércules, Tiestes, Agamênon, Édipo, mas as dores da sua alma. Dos ares das grandes paixões heroicas saem as meditações a respeito do destino, do mistério do universo, do trabalho espiritual do homem. Seus personagens devem pensar, e não agir, devem falar, e não lutar; devem ser interessantes, mas não devem se comover. Todos são iguais, ou seja, são todos filósofos de orientação estoica, e como estoicos devem morrer sobre o palco (LEONI, 1957).

A
atividade literária de Sêneca parece contradizer a sua índole contemplativa, porém as tragédias não apontam caminhos que o distanciem de suas reflexões de âmbito moral; e com as inovações que Sêneca lhes impôs, elas influenciariam celebridades literárias como William Shakespeare (PEREIRA MELO, 2007b).

Já com relação às obras de caráter filosófico, pode-se dizer que se apresentam em forma
de diálogo, mas não como os diálogos de Platão, pois Sêneca interpreta os dois interlocutores, ou seja, o próprio Sêneca e o destinatário dos escritos, a quem Sêneca trata de forma familiar, construindo uma fluente conversação.

As datações dessas obras também são imprecisas, porém há condições de ordená-las
de maneira cronológica, de acordo com o pensamento de Sêneca e o assunto por ele tratado. Os trabalhos filosóficos são: Consolação a Márcia, Da Ira, Consolação a Hélvia, Consolação a Políbio, Tratado sobre a Clemência, Sobre a vida feliz, Da constância do sábio, Sobre os benefícios, Das questões naturais, Da Providência, Sobre a tranquilidade da alma, Sobre a brevidade da vida, Sobre o ócio e Cartas a Lucílio. Estes quatro últimos tratados terão uma atenção especial, por serem os principais trabalhos de Sêneca que tratam os assuntos referentes à educação para formação do sábio, ficando reservada a este momento apenas uma apresentação concisa destas quatro obras do autor.

Considera-se
como o primeiro escrito de caráter filosófico de Sêneca o livro Consolação a Márcia, escrito provavelmente entre 37 e 41 d.C. Nesse tratado Sêneca procura consolar Márcia, filha do historiador Cremúcio Corda, pela perda de entes queridos. Está presente a doutrina estoica do controle das paixões, pois o pensador tenta convencer Márcia de que quanto mais ela cultivasse sua dor, mais esta se enraizaria em sua alma. Diz ainda que lamentar a perda de entes queridos é normal, desde que haja moderação. Para isso é preciso deixar-se guiar pela natureza, que fortalecerá a alma, preparando-a para receber todos os males, até mesmo a morte. Utiliza como argumentos a dor universal, da qual o homem não pode se isentar, a importância da morte como libertação e a virtude dos que já se foram. Neste livro já estão presentes os grandes temas que o filósofo trabalhará durante toda a sua vida.

Os
livros Da ira”, “Consolação a Hélvia” e “Consolação a Políbio foram escritos no período em que Sêneca estava exilado na ilha de Córsega (41 – 49). Da ira (ano 41) é dedicado ao seu irmão mais velho Novato e se compõe de três livros. O primeiro destes trata de questões gerais desta paixão, ou seja, da ira; o segundo diz respeito à sua origem e o terceiro tem a responsabilidade de ensinar maneiras de controlá-la e de moderá-la, apresentando-a como um sentimento não ligado à natureza. Porém o foco central do diálogo era atingir aqueles que detinham o poder, uma vez que foiescrito no período em que Sêneca havia sido exilado pela ira do imperador Cláudio. Com este tratado o filósofo propõe uma espécie de preparo filosófico para que as pessoas não se deixassem dominar pela paixão, colocando o seguimento da razão como o caminho seguro para isso.

Consolação a Hélvia (
ano 42-43) é endereçado à sua própria mãe, no intuito de consolá-la da perda momentânea do filho, ou seja, o próprio filósofo. Este se prende ao ensinamento estoico, o qual diz que, apesar de todas as dificuldades, deve enfrentá-las corajosamente, e mostra-se calmo e feliz diante de provas tão duras, tentando convencer sua mãe e a si próprio de que o exílio não é nada. Demonstra a necessidade de suportar as dificuldades da vida: para o sábio, o exílio não é nada além de uma transferência de casa, situação que não o deixava infeliz (LEONI, 1957).

Este
diálogo contém um bom número de dados biográficos e familiares do autor, como também fornece informações sobre como era um exílio na sua época, descrevendo a paisagem, os habitantes, a língua e os costumes da ilha, na qual viveu por oito anos.

Consolação a Políbio
, escrito provavelmente entre os anos de 43 e 44 d.C, é destinado a Políbio, um dos libertos de Cláudio, de grande influência junto ao imperador. Partindo de um fato doloroso da vida de Políbio, a morte do seu irmão caçula, Sêneca aproveita a oportunidade para endereçar um pedido de perdão indireto ao imperador, pois conhecia o poder de Políbio e esperava que este intercedesse por ele junto a Cláudio, fazendo que este revogasse a condenação; porém esse objetivo não foi atingido.

Do início ao fim, Sêneca propõe a Políbio remédios para curar o mal que o magoa, como:
lembrar-se das boas qualidades do irmão morto, pensar na grandeza de Cláudio e desfrutar de sua companhia, e refletir que a morte não traz mal algum ao homem.

De volta do exílio de Córsega em 49, Sêneca passa a ser o preceptor de Nero, e com o retiro espiritual forçado na ilha de Córsega, tem o desejo de pôr em prática tudo o que aprendera nesse tempo, pois sentira na própria pele a tirania do imperador Cláudio, e tem como
objetivo persuadir o futuro princeps da importância e beleza da clemência e da bondade. Os trabalhos desse período são: Sobre a brevidade da vida”, “Sobre a tranquilidade da alma”, “Tratado sobre a Clemência”, “Sobre a vida feliz”, “Da constância do sábio” e “Sobre o ócio”.

O objetivo de
Sobre a brevidade da vida, escrito entre 49 e 55 d.C., era convencer Pompeu Paulino, ocupante de cargo público na estrutura administrativa do Império Romano e pai de sua esposa, Pompéia Paulina, a abandonar seu posto e dedicar-se ao estudo da Filosofia.

Em
Sobre a tranquilidade da alma (ano 61), Sêneca tem como objetivo amenizar as inquietações que perturbavam a alma do discípulo e amigo Sereno, convertido ao estoicismo. Nesse diálogo, Sêneca foi levado a abordar assuntos relativos aos remédios oferecidos pela filosofia para a inquietação e a instabilidade da alma. Entre os fatores que afetam a tranquilidade da alma estão: a participação na vida pública, a escolha dos amigos, as consequências da riqueza, os inconvenientes dos altos cargos públicos, entre outros.

Tratado sobre a Clemência
, escrito para Nero, provavelmente no ano 56, é considerado uma obra não de caráter filosófico, mas uma espécie de “manual” de governo, ensinando o novo imperador a não ser um tirano. Nesse escrito Sêneca faz um elogio à clemência, para ele, a qualidade que deve ter um príncipe preparado para governar, estabelecendo assim uma aliança com seus súditos baseada no amor; porém nessa relação também deveria existir o sentimento de temor dos súditos para com o príncipe, não um temor exagerado, mas um temor que impusesse respeito. A clemência senequiana caracteriza-se pelo equilíbrio entre o amor e o temor, pois ela não é a piedade, não é um sentimento, uma emoção, mas um julgamento fundado na razão e um aspecto da virtude estoica.

Ainda nesse
livro, Sêneca elege a figura de Augusto como um verdadeiro modelo de virtude, buscando também na história recente de Roma exemplos de imperadores que este tratado suprimia, como Tibério, Calígula e Cláudio.

Sobre a vida feliz (
ano 59), dedicado também ao seu irmão Novato, é uma defesa da filosofia, particularmente da doutrina estoica. A grande preocupação desse tratado é a felicidade humana e a necessidade de se fazer o bem e de se conciliar a filosofia com o modo de vida na prática.

Neste
tratado Sêneca reconhece que não levava uma vida de sábio, pois vivia em meio à fortuna; mas defende-se dizendo que a sua riqueza não fora conquistada de maneira ilícita, e que dela sabia fazer bom uso. Declara-se pronto a renunciar a tudo e viver como convém a um sábio.

Em
Da constância do sábio (ano 55-56), Sêneca tem como objetivo mostrar a seu amigo Sereno as dificuldades da vida e como superá-las ou aceitá-las, fortalecendo o caráter e preparando a alma para atingir a tranquilidade e indicando o sábio como ideal a ser perseguido. O sábio seria aquele que não se abala com as ofensas, pois possui a alma tranquila e impassível a tudo que o destino determinar. A constância vem disso: uma atitude de receber de bom grado o que a sorte lhe traz. É outro livro de Sêneca muito importante para esse estudo, pois discute sobre o sábio, este que era o objetivo a ser alcançado pela educação ofertada pelo pensador estoico.

Em
Sobre o ócio, obra escrita entre os anos de 57 e 62 d.C., Sêneca responde às críticas de Sereno, que o acusara de não estar vivendo segundo os princípios da doutrina estoica. Nessas reflexões, ele defende a possibilidade de se praticar o ócio sem deixar de ser estoico.

Os
livros Dos benefícios”, “Cartas a Lucílio”, “Das questões naturais” e “Da providência” foram escritos nos últimos anos da vida de Sêneca, quando não mais participava da vida pública.

Dos benefícios
, cuja composição se encontra entre os anos de 54 e 64 d.C., constitui-se de sete livros, que tratam de questões como o desapego dos bens materiais e principalmente das relações de generosidade e reconhecimento que dirigem as relações dos homens. O filósofo, que vivenciara a experiência da ingratidão humana durante sua carreira política, reflete sobre as recíprocas obrigações entre aqueles que recebem o benefício e aqueles que o outorgam.

Para
Sêneca, muitos são os benefícios e muitas também são as maneiras de concedê-los e de aceitá-los, porém a gratidão por esses benefícios é um dever que muitos não cumprem. O sábio não é um ingrato ao tirano por este ter-lhe concedido benefícios, pois com os bons conselhos que lhe retribui em maior medida qualquer benefício (LEONI, 1957).

Das questões naturais
, constituído de sete livros e escrito entre os anos de 62 e 63, é desenvolvido pelo filósofo no final da vida, quando, desiludido com os rumos tomados pelo governo imperial, dirigido pelo seu “ex-ouvinte” Nero, volta-se ao estudo do universo como meio de atingir a sabedoria sem que, com isso, suas ideias viessem a provocar ainda mais a ira imperial.

O
livro escrito para Lucílio tem por objetivo demonstrar a este que a natureza é racional. O universo não foi feito para os homens, mas com o bom uso da razão estes são capazes de entendê-lo e de se adaptar a ele, a partir do momento em que tomarem consciência das realidades morais e da forma como devem conduzir suas vidas. O estudo dos fenômenos naturais permite ao homem entender o princípio estoico de viver de acordo com a natureza (OLIVEIRA, 1998). Para Sêneca, para conhecer a virtude e a divindade fazia-se necessário, antes, estudar a natureza nas suas mais diversas manifestações.

Da Providência
, que foi escrito nos últimos anos de sua vida, mas cuja data é incerta, tinha a preocupação de mostrar a Lucílio que os sofrimentos, pelos quais passam os homens mais dignos, devem ser considerados como provas para melhor pôr em evidência suas virtudes. Os homens bons não sofriam, pois compreendiam e aceitavam aquilo que o destino lhes tinha reservado. As divindades punham em prova sua virtude e força de espírito e, desta forma eles deveriam seguir em frente, rumo a um destino preestabelecido (LEONI, 1957).

Cartas a Lucílio
, escrito entre os anos de 62 e 65 d.C., constitui-se de cento e vinte e quatro cartas, distribuídas em vinte livros, nas quais Sêneca acompanha os progressos de seu discípulo, indicando-lhe o caminho a seguir e respondendo às suas dúvidas e inquietações. São consideradas, pelos estudiosos da obra de Sêneca, como o mais importante dos seus trabalhos, tendo-se em vista seu caráter pedagógico.

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Fonte:
THAIS WATAKABE: “SÊNECA E A EDUCAÇÃO PARA FORMAÇÃO DO SÁBIO”. (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, Área de Concentração: Educação, da Universidade Estadual de Maringá, como um dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Educação. Orientador: Prof. Dr: JOSÉ JOAQUIM PEREIRA MELO). Maringá, 2009.

Nota
:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese.
As notas e referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.
O texto postado é apenas um dos muitos tópicos abordados no referido trabalho.
Para uma compreensão mais ampla do tema, recomendamos a leitura da tese em sua totalidade.
Disponível digitalmente no site: Domínio Público

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