A RE-evolução dos bichos


Como seria a vida dos humanos sem a presença dos bichos?
Seja como alimento, meio de transporte, proteção ou simplesmente pura camaradagem, os animais sempre acompanharam os povos desde os primórdios das civilizações.

A participação dos bichos pode ser notado nos âmbitos mais diversos da cultura universal e em todos tempos. Na antiguidade, por exemplo, era comum atribuir-se aos animais poderes místicos e até divinos. Muitas das antigas divindades eram representadas por alguma espécie de animal, como é o caso dos deuses do antigo Egito. Na mitologia grega e romana isso não era diferente. São deles a criação dos seres místicos e híbridos homem-animal, como as sereias e o minotauro. Na Bíblia os bichos até se tornaram instrumentos divinos para alertar e socorrer os homens, como no exemplo da famosa jumenta de Balaão. Aqui no Brasil eles proliferam a superstição popular. O lobisomem é um caso bem típico.

No campo específico das línguas, os orelhudos e peludos fazem a festa. Por exemplo, muitas doenças por nós conhecidas têm seus nomes ligados a alguns animais. Por exemplo: elefantíase (de elefante), que é uma doença cujo aspecto é uma intumescência mais ou menos volumosa e dura da pele e do tecido celular adiposo; câncer (de um gênero de caranguejos comestíveis, da Europa) que é o nome genérico que se dá aos tumores malignos; sapinho (de sapo) que é uma estomatite micótica das crianças de leite e pessoas debilitadas, causada por fungo e caracterizada pela formação de aftas ou placas brancas. Quando alguém leva uma pancada cria-se na pessoa um “galo”. A angina (síndrome caracterizada por dor constritiva atrás do esterno, por vezes com irradiação à espádua e braço) entre os antigos gregos referia-se ao “sufoco do cão”, quando este estirava a língua para respirar.

Outra aspecto a ser realçado neste mesmo âmbito, diz respeito ao uso dos bichos para qualificar comportamentos humanos específicos. Por exemplo:

Fiel como um cão” (pessoa que guarda absoluta fidelidade”: “O José é fiel como um cão ao seu patrão”.
Amigo da onça” (pessoa em quem não se pode confiar): “Amigo? Só se for amigo da onça!
Porco” (alguém falto de higiene e sujo): “Nossa, que porco!
Burro” (uma pessoa sem inteligência ou que não faz as cousas do modo como era esperado): “Assim não seu burro!
Jumento” (ignorante, rude, grosso): “Pelo tamanho do jumento pensei que o coice fosse menor!
Rato” (ladrão): “Que rato. Puxou a carteira dele e ninguém percebeu!
Gata” ou “gato” (diz-se de uma mulher ou rapaz de beleza indiscutível): “Nossa, que gatinha!”.
Vaca” (termo pejorativo para designar uma mulher que “dá pra todo mundo”): “Viu só? Aquela vaca saiu desta vez com o Paulo!
Galinha” (mulher promíscua ou que sai com qualquer um): “Aquela galinha não respeita nem os próprios filhos!
Camelo” (diz-se de alguém que trabalha exaustivamente): “Caramba. Hoje trabalhei como um camelo!
Cachorro” (um homem sem pudores): “Aquele cachorro sem-vergonha não me engana!
Cobra” (designa uma pessoa de má índole): “A Carmelita é uma cobra venenosa!
Anta” (o mesmo que “burro”): “Assim não, sua anta!
Dragão” (mulher feia): “Deus me livre de beijar aquele dragão!

A malícia e a obscenidade também se apropriaram muito bem dos bichos. “Pinto, rola, perereca e periquito” tipificam um pouco disso.

Os bichos também proliferam nos ditados populares. Por exemplo:
“Periquito come milho, papagaio leva a fama”.
“Cada macaco no seu galho”
“Fazer de gato e sapato”
“Quem nem cachorro magro, comemos e saímos”.
“Quem não tem cão, caça com gato”
“Latir no quintal para economizar cachorro”.
“É um pé de boi”.
“Matar dois coelhos com uma bordoada só”.
“Quem cai na rede é peixe”.
"Bezerro que abandona o bando cai no papo da onça"
"Camarão que dorme, o mar leva."
"Cavalo bom corre no final"
"Cobra que anda com Tatu acaba entrando no buraco errado"
"Feliz é o Pato que não pode usar aliança."
"Galinha que come pedra sabe o cu que tem"
"Papagaio que fala muito é o primeiro a ser vendido."
"Peixe é peixe, boi é boi, peixe-boi é outra coisa."
"Periquito que acompanha morcego acorda de ponta-cabeça"
"Quando o lobo chega a cachorrada vai embora."
"Quem anda com os porcos acaba comendo farelo."
"Quem fala muito dá bom-dia a cavalo"
"Quem nasceu para Peru nunca vai ser Águia."
"Sabiá que voa com joão-de-barro vira servente de pedreiro"
"Se bater na madeira mandasse o azar embora, pica-pau não estaria em extinção."
"Uma raposa não é uma raposa até ela ser pega no galinheiro"
"Vagalume malandro não tem apagão."
“Quando o gato sai de casa, o rato de espalha”.
“Ninguém chuta cachorro morto”.

Embora muitos não saibam, a palavra “capricho” (vontade súbita e mutável) deriva da teimosia da cabra. Uma pessoa fica “amuada” (mal-humorada, enfadada) porque se “emburra” (de burro) ou se “embezerra” (de bezerro). O nome “mulato” (mistura de branco com negro) vem de “mulo” (animal mamífero resultante do cruzamento de jumento com égua, o burro). O famigerado “avacalhar” (realizar algo desleixadamente), usado às vezes como gíria, deriva de “vaca”. Alguém que “avacalha” “age como vaca”. Um ladrão ou larápio sempre foi chamado de “gatuno”, isto porque age sorrateiramente como um gato às escondidas. Recentemente surgiu o verbo “camelar” (de camelo) que é fazer como faz o camelo ou trabalhar sem descanso.

No âmbito darwinista os bichos então fazem a festa! Talvez esteja aí o “Sangri-la” da bicharada. Basta saber que um dia o orgulhoso homem fora uma ameba e depois um certo tipo de macaco. A Teoria da Evolução tem o mérito de ter concedido dignidade aos bichos. Antes o homem reinava absoluto como criação especial divina: o coroamento da obra de Deus. Com Darwin o ser humano tornou-se parte de um processo que envolve a natureza como um todo. O homem é apenas um animal a mais no imenso processo evolucionário universal. Sua inteligência e capacidade de criar, nada mais são do que meras conseqüências de processos cegos e aleatórios, sem qualquer conotação com o metafísico ou o divino.


É isso!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Excetuando ofensas pessoais ou apologias ao racismo, use esse espaço à vontade. Aqui não há censura!!!