Eu li isso...

"No aspecto mais geral, é impossível dissociar o que ocorre na escola, com a disciplina Biologia Educacional e o esforço modernizador do qual o Brasil fora tomado, e o contexto internacional, no qual a Biologia tinha papel destacado. Em 1918 fora fundada a Sociedade Eugênica de São Paulo, que tinha o Dr. Renato Kehl como presidente (eleito com o voto de Fernando de Azevedo), que depois se destacaria na proposta daquela pedagogia nova. Esta sociedade, juntamente com a Liga Pró-Saneamento do Brasil, fundada por Belisario Penna, patrocinou a edição do livro de Monteiro Lobato, denominando-o emblematicamente de Problema Vital.

A década de 1920, em época anterior aos campos de concentração nazistas,
o ideário eugênico deixou a condição de construto teórico, passando a lastrear a implementação de políticas públicas que promoveram uma ondade esterilizações em massa na maioria dos países ditos adiantados. As campanhas de esterilização se multiplicaram nos Estados Unidos e em países como Suécia, Dinamarca, Noruega, Finlândia, Estônia e Suíça. Legislação específica foi aprovada por parlamentos democráticos disciplinando a eugenia, ou higiene racial, como foi chamada na Alemanha. De fato, a política demográfica de Hitler, logo após ascender ao poder em 1933, foi a de incentivar o número de filhos dos casais pela instituição de um imposto matrimonial anual correspondente a 26 libras esterlinas (valor nominal de 1937), do qual se abatia 25% com o nascimento de cada filho. Na mesma época, Mussolini prometia um retrato autografado no nascimento do sexto filho, promessa que causou menos entusiasmo do que a de Hitler.

Não se sabe exatamente quantas pessoas foram esterilizadas durante
esse período, mas os dados revelados em 1997 apontam para uma estimativa próxima a dezenas de milhares apenas nos países escandinavos. A Suécia teria esterilizado cerca de 62 mil pessoas, a partir da criação do Instituto de Biologia Racial, em 1921. Na Dinamarca a campanha de esterilização teve início em 1926, atingindo cerca de 11 mil indivíduos. Na Suíça, o cantão de Vaud aprovou uma lei eugênica em 1928, disciplinando a higiene racial, em vigência até 1976. Nos diferentes estados norte-americanos, o número de esterilizações compulsórias, apenas na década de 1930, chegou a 60 mil pessoas.

É compreensível, que os esforços modernizadores da intelectualidade
brasileira refletissem o contexto europeu e norte-americano da época, que não se restringia, de maneira alguma, ao ideário nazi-fascista. De fato, movimentos importantes de esquerda adotavam programas eugênicos como plataforma política. Na Inglaterra, comunistas, como J.B.S. Haldane, que traduzia Dialética da Natureza, de Engels, à época, inserindo-lhe um proêmio verdadeiramente emblemático, e mesmo socialistas, especialmente os ligados à Fabian Society, como o grande novelista irlandês George Bernard Shaw, o casal de ativistas socialistas e sindicais, e reconhecidos intelectuais, Sidney James Webb e sua esposa Beatrice Webb, o escritor Herbert George Wells, autor de Guerra dos Mundos (1898), e mesmo Julian Huxley, com sua grande obra teórica e destacada atuação política, foram defensores de programas eugênicos. Comunistas norte-americanos, como Hermann Muller, que passara bom período na União Soviética, defendiam a eugenia, inclusive na forma do conhecido Manifesto dos Geneticistas, publicado na conceituada revista científica britânica Nature, em 1939, conclamando as nações a adotarem políticas eugênicas.

Portanto, até a década de 1960 o ensino de Genética e Evolução, não foi
objeto de pressões de grupos religiosos fundamentalistas, como no caso de países como os Estados Unidos, e foi justificado no âmbito da saúde, sobretudo nos cursos de formação de professores. Nessa década, as Ciências Biológicas assumem especialização maior na universidade, substituindo os cursos de História Natural. A formação de professores passa a ser preocupação específica, inclusive dos legisladores. A formação de professores em área multidisciplinar, como é o caso das Ciências Biológicas, irá trazer dificuldades adicionais, em especial a partir da reforma universitária de 1968, com a Lei 5.692, de 1971, e a normatização que lhe seguiu, visando a formação de professores para o I e II Graus. Hoje o ensino de ciências biológicas, tanto no Ensino Fundamental como no Ensino Médio, se ressente das deficiências introduzidas pelo modelo de formação daquela época, o qual leis e normas posteriores não modificaram essencialmente."

Prof. Dr. Nélio Bizzo (Univers
idade de São Paulo): "Um Pouco de História Brasileira das Ciências Biológicas no Brasil".

É isso!

Um comentário:

  1. Olá, li este texto do professor Bizzo e fiquei interessada em saber a data dele. Procurei por vários sites e nao achei nada! Seria possivel precisar esta informação? Obrigada!

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