"Creation": o marketing criativo de Darwin

A Origem das Espécies de Darwin, publicado pela primeira vez em 1859 foi considerado a maior idéia individual da história do pensamento”.

Com esta introdução, de cara já se nota o tom elevadamente encomiástico do filme . Considerar o conceito de Seleção Natural como a maior idéia individual da história do pensamento, é um absurdo socrático, para não dizer também platônico e aristotélico. Ademais, não se trata propriamente de uma “idéia individual”. Muito antes de Darwin já se falava e se escrevia sobre seleção natural. E, mesmo que se diga que Darwin o sofisticou e o aprimorou, ainda assim não é possível atribuir esta primazia ao naturalista, pois é mais que notório que Alfred Wallace, se não o antecipou, ao menos menteve-se aparelhado com ele neste objetivo.

No que concerne à proposta do filme, ao contrário do que se faz transparecer, a idéia do filme não é exatamente a de abordar o drama vivenciado por Charles Darwin, quanto ao choque de suas novas idéias com a visão religiosa predominante naquele momento. Muito mais que isso, Jon Amiel deixa patente o seu desejo em aumentar a aceitação e fortalecer a imagem da pessoa do naturalista e, consequentemente, tornar mais conhecida a ideologia que se mantém fortalecida em torno dele, ou seja, o darwinismo.
- O senhor matou Deus, diz a personagem que interpreta Thomas Huxley. Em todo o filme o confronto entre fé (fixismo) e "ciência" (transformismo) se faz presente como uma maneira de enfatizar o grande desafio de Darwin em destronar o homem de seu pedestal divino. Um bom exemplo refere-se à introdução no enredo de um chimpanzé adestrado, que metaforicamente parece representar o bíblico Adão, enquanto Darwin (Paul Bettany) faz o seu papel de criador.

Parece consensual o fato de que a esposa de Darwin, Emma,
(Jennifer Connely), morreu convicta em sua fé na crença bíblica da criação sobrenatural. Ao término do filme, porém, ela, que até então se mostrara relutante em aceitar as novas idéias do marido, declara heroicamente: - Voce finalmente me tornou sua cúmplice. Que Deus nos perdoe!

Outro desacerto no filme recai no fato de se querer atribuir ao
conflito religioso entre o naturalista e sua esposa Emma à demora dele em publicar o seu livro "A Origem das Espécies". Embora esta tese possa ser levada em consideração, o que realmente parece ter sido preponderante na tardança de Darwin diz respeito à inconsistência empírica de suas idéias; e o que o apressou foi o receio de ser superado por Wallace.

É claro. Não se pode negar que o filme contenha cenas de beleza e poesia. Vá lá, para isso é suficiente o dramático caso da morte da filha de Darwin. Contudo, ao que tudo indica, por trás dessa ficcção prevalece o anseio de fazer dissipar a mácula do darwinismo social que ao longo da história sempre esteve associado à pessoa de Darwin, além, é claro, de uma tentativa de popularização da teoria evolutiva.

É isso!

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