A saúde como instrumento de regeneração nacional

"Outra personagem que inspirou Galton foi seu primo, Charles Darwin. Ao alegar que “a força e a fraqueza, o ajustamento e o desajustamento são qualidades que se herdam”, Darwin ofereceria as bases científicas para o crescimento da eugenia (Wells; Huxley; Wells,1941). Além disso, “a teoria da evolução conferiu um significado especial à variação hereditária nos cruzamentos de animais domésticos” (Castañeda, 1998:30). Destacou também a “luta pela sobrevivência” e a capacidade do mais apto para se reproduzir, resistir às condições adversas e proliferar. Com a eugenia positiva, proposta por Galton, seria possível assegurar (e acelerar) uma seleção natural que garantisse que, de fato, os mais aptos gerariam descendentes (Castañeda, 1998). No livro Hereditary Genius, Galton alegava que a habilidade humana era uma função da hereditariedade e não da educação (Stepan, 1991). Dessa maneira, ele se opunha às teorias do naturalista francês Jean-Baptiste Lamarck da herança dos caracteres adquiridos. O estiramento do pescoço da girafa se tornou um célebre exemplo, de como a modificação que acontece num determinado animal poderia ser transferida para outra geração, aprimorando tal espécie. Entretanto, no contexto britânico, as idéias do francês Lamarck não encontrariam espaço para legitimar a eugenia. Os eugenistas positivos defendiam um novo evolucionismo baseado na teoria da evolução de Darwin. Em 1900, outra personagem resgatada foi o monge Gregor Mendel. A partir da observação do cruzamento de ervilhas, Mendel alegava que os fatores internos (posteriormente denominados genes) não dependiam do meio ambiente no qual tais leguminosas eram cultivadas. Apesar de Galton ter reagido ceticamente a tal afirmação, essa transmissão independente fornecia subsídios para a defesa dos casamentos entre os mais aptos (Castañeda, 1998).

Na Alemanha, da década de 1890, o biólogo August Weismann apresentaria sua teoria da continuidade do “germe plasma”. Weismann classificava as células entre germe plasma e “somaplasma”. Enquanto as primeiras eram responsáveis por carregar o material genético, as últimas serviam como sustentação e nutrição para as células germinativas reprodutivas, ou germe plasma. O biólogo alemão estabeleceria, dessa maneira, a diferenciação entre células sexuais e somáticas (Stepan, 1991; Castañeda, 1998)".

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"O terceiro aspecto relaciona-se à popularização da variante “selecionista” do Darwinismo social, popularizada pelo biólogo Ernst Haeckel e mais tarde legitimada pelo embriologista August Weismann. Haeckel sempre destacava o princípio da seleção como o motor mais importante entre os princípios de Darwin. Apesar de não compartilhar da idéia da transmissão dos caracteres adquiridos e de colocar em xeque tal crença defendida pela primeira geração de darwinistas sociais, Weismann também compartilhava da idéia da importância da seleção, embora defendesse que as características dos indivíduos eram determinadas pelo material hereditário contido em suas células. A eugenia parecia ser a única estratégia prática para assegurar o progresso racial e ao mesmo tempo prevenir sua decadência. Logo, o único meio vislumbrado para eliminar gradualmente o indivíduo inapto (unfit) produzido pela industrialização seria por meio de uma política de “seleção racional” ou higiene da raça. Duas figuras foram fundamentais para o posterior desenvolvimento da eugenia alemã no século posterior: Alfred Ploetz e Wilhelm Schallmayer. Ao primeiro pode ser atribuída a responsabilidade da institucionalização do movimento, graças ao seu talento organizacional e personalidade carismática. Os tratados eugênicos de Shallmayer, por sua vez, definiriam a significância teórica e os problemas práticos dos quais os eugenistas se ocupariam por décadas (Weiss, 1990)".

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"O segundo tratado eugênico de Schallmayer, intitulado Hereditariedade e seleção no processo de vida das nações (Vererbung und Auslese im Lebenslauf der Völker), ficaria conhecido publicamente ao vencer um concurso no qual os candidatos (biólogos, médicos, entre outros) tentariam responder à questão: “O que poderíamos aprender a partir da teoria da evolução sobre o desenvolvimento político interno e a legislação estatal?”. Na realidade, financiado por Friedrich Krupp, um biólogo amador, filho de Alfred Krupp, barão das munições, a comunidade científica personificada na figura de Haeckel buscava demonstrar que as teorias de Darwin não representavam uma ameaça ao estado, nem destruía valores morais. O concurso não serviria apenas para projetar as idéias eugenistas, mas representaria o primeiro passo para a formação do movimento eugenista alemão, seja pela criação do jornal Archiv für Rassen-und Gesellschafts-Biologie, por Ploetz em 1904, seja pela fundação da Sociedade de higiene da raça (Gesellschaft für Rassenhygiene) (Weiss, 1990).

O objetivo dessa sociedade era estudar a relação de seleção e a eliminação entre indivíduos; a herança e variabilidade de seus traços físicos e mentais. Graças à utilização, por Ploetz, do termo raça, como sinônimo de raça branca, a sociedade acabaria atraindo a atenção e a associação de outros que se julgavam nações brancas e civilizadas. Em 1907, a sociedade passaria a ser conhecida como Sociedade Internacional de Higiene da Raça (Internationale Gesellschaft für Rassenhygiene). Muito mais do que propagar as idéias eugenistas, tal sociedade tinha como meta servir de modelo para uma seleção racional que pudesse ser executada. Para seus membros, sucesso material e utilidade posição social seriam critérios que norteariam a classificação das pessoas como “aptas”. Na realidade, havia uma tendência para equacionar aptidão com a classe social à qual o indivíduo pertencia. É interessante observar que, apesar da busca pela preservação do mais “apto” ser uma constante, os termos nórdicos ou germânicos não eram mencionados na lista de tarefas e programas da sociedade. Segundo Ploetz, havia certa dificuldade em se encontrar alguma raça pura na Europa (Weiss, 1990)."

É isso!

Fonte:
ELIZABETE MAYUMY KOBAYASHI. "EUGENIA E FUNDAÇÃO ROCKEFELLER NO BRASIL: A SAÚDE COMO INSTRUMENTO DE REGENERAÇÃO NACIONAL". UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS. INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS (PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA UNICAMP). ORIENTADORA: Profa. Dra. Maria Conceição da Costa CO-ORIENTADORA: Profa. Dra. Lina Rodrigues de Faria.

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