"Charles Andler, em sua extensa obra sobre a vida e o pensamento de Nietzsche, mostra a influência que ele sofreu de outros autores, seus mestres, que certamente colaborou para a formação de seu conceito de “espírito histórico”. Com esta visão, Nietzsche se convenceu de que a história dos povos, ou das civilizações dos povos da Antiguidade, se constitui de longos períodos de evolução, passando da obscuridade, atingindo o apogeu e caindo novamente na barbárie. Segundo Andler, Nietzsche se convenceu disso a partir da leitura da obra de David Strauss, Dogmática cristã, onde o autor, a partir de diversas seitas do cristianismo primitivo, descreve a origem, a corrupção, a queda e o castigo dos homens, mas também que tudo isso não é eterno, porque, a partir do reconhecimento da perfeição perdida, o homem recomeça tudo de novo (Andler: 1931, vol. III.p. 234). Nietzsche busca nesta história dos povos primitivos este desejo de perfeição que os leva ao esplendor, mas ao mesmo tempo, por erros na escolha dos meios, os leva à queda, a partir da qual há um novo reinício. E assim sucessivamente. Nesta época de sua vida Nietzsche ainda não havia definido os conceitos para esta sucessão dos acontecimentos históricos na vida dos homens, mas já estava claro em sua mente o processo.

D
aí Nietzsche se dedica a estudar com profundidade a história do povo grego, que deu origem à cultura ocidental. Mais do que momentos de alta e de baixa, ele encontra na história dos gregos uma evolução também na capacidade de enfrentar os reveses da vida, e conclui disso que também a inteligência vai se aperfeiçoando na ansiosa busc a do querer-viver. Nesta luta para o querer-viver entram em jogo as forças selvagens e ferozes da natureza biológica do ser humano. E neste ponto Nietzsche junta a história dos povos com os conceitos evolucionistas de Darwin, e principalmente de Lamarck, que ele conhecia e aos quais dava grande importância, mais ao segundo do que ao primeiro.

Nesta luta pela vida, Nietzsche descobre também o sincronismo das forças selvagens para a criação de um meio-ambiente favorável capaz de garantir a sobrevivência e a evolução de si mesmas. É o momento em que se formam as sociedades fortemente estruturadas em organismos tirânicos para evitar a demolição. Novamente é a força que se impõe à própria força. Para Darwin sobrevivem os mais fortes, para Nietzsche sobrevivem os mais espertos, o que não é uma contradição, mas apenas um esclarecimento. E esta esperteza é o resultado das capacidades intelectuais que criam as sociedades. É dentro da sociedade, na vida comum, que as capacidades intelectuais se desenvolvem. Os meios de garantir a vida são encontrados dentro dos limites da vida em comum. Todo conhecimento humano está subordinado à sociedade. Daí a importância de uma teoria da civilização. Na vida em sociedade a luta pela vida continua, mas de forma disciplinada."

É isso!


Fonte:
Valmor Luiz Oselame. A Vontade de Poder é incremento da vida – e nada mais! – na filosofia de Nietzsche. (Tese apresentada à banca examinadora como parte escrita para a obtenção do grau de doutor em filosofia). Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas - Departamento de Filosofia. Porto Alegre, dezembro de 2006

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