A Seleção Natural em seu devido contexto

Negócio é luta”, escreveu Leo Huberman, em “A história da Riqueza do Homem”, e acrescentou: “Pergunte aos homens de negócios. Ora, todos sabem que na luta os mais fortes vencem os mais fracos. Também nos negócios ocorreu isso. Duas companhias concorrem num certo ramo. Uma dá um golpe na outra, reduzindo seus preços. Esta reage, reduzindo-os ainda mais. E assim por diante. Golpes - na forma de redução de preços - são trocados. Dentro em pouco, os preços estão abaixo do custo de produção. Quem ganhará a luta? É evidente também que quanto maior a escala de produção, tanto menores os custos. Isso significa que as companhias maiores e mais fortes têm vantagem inicial. Mas é a capacidade de resistir que conta. E a capacidade de resistir, nessa luta, é medida pelas reservas de capital, que determinam o tempo de resistência. A firma com maior volume de capital é a mais forte. Os preços reduzidos a deixam assustada, mas deixam seu adversário tonto, e, dentro em pouco, completamente derrotado” (Zahar Editores, 1981).

É fato inconteste que Charles Darwin, ao elaborar seu conceito de Seleção Natural, cujo pano de fundo é a "luta pela sobrevivência", tomou de empréstimo e adaptou as idéias do economista Thomas Malthus à sua teoria sobre evolução. É também notório que este conceito, tanto em Darwin como em Wallace, deu-se num contexto histórico de expansão econômica das grandes nações européias, com mais destaque para a Inglaterra. O lema “a sobrevivência do mais apto”, portanto, neste contexto histórico específico, foi tremendamente oportuno para os gananciosos objetivos dos poderosos capitalistas europeus e americanos. A competição no âmbito do comércio
tornava-se assim mero reflexo da luta sangrenta que se observava na Natureza.

Em a “Era do Capital”, E
ric J. Hobsbawm nos oferece uma pequena visão de como funcionava a lógica e a ideologia desses capitalistas:
Poucos dos milionários da primeira geração fizeram sua carreiras em um único ramo de atividade. Huntington começou vendendo material pesado para mineiros da corrida do ouro em Sacramento. Talvez seus fregueses incluíssem o magnata da carne Philip Armour (1832-1901), que tentou a sorte nas minas antes de entrar no negócio de armazéns em Milwaukee, que permitiu-lhe fazer fortuna no decorrer da Guerra Civil. Jim Fisk trabalhou em circo, garçom de hotel, mascate e vendedor ambulante antes de descobrir as possibilidades de contratos de guerra e, depois, a bolsa de valores. Jay Gould foi, por seu turno, cartógrafo e mercador de peles, antes de descobrir o que se podia fazer com estradas de ferro. Andrew Carnegie (1835-1919) não concentrou suas energias no ferro até completar 40 anos. Começou como telegrafista, continuou como executivo de estradas de ferro – sua renda já feita através de investimentos cujo valor crescia rapidamente –, entrou em petróleo (que iria ser o campo escolhido por John D. Rockefeller, que começou a vida como atendente e livreiro em O hio), enquanto gradualmente seguiu em direção à indústria que iria dominar. Todos estes homens eram especuladores e estavam prontos para seguir em direção do dinheiro grosso, onde quer que ele se encontrasse. Nenhum deles tinha ou poderia ter escrúpulos de forma excessiva, numa era e numa economia onde fraude, suborno, calúnia e, se necessário, revólveres eram aspectos normais da competição. Todos eram homens duros e todos olhariam as questões concernentes à honestidade de suas atividades como sendo consideravelmente menos relevantes para seus negócios do que sua esperteza. Não era por acaso que o "darwinismo social" explicava, de forma dogmática, que aqueles que subiam ao topo de tudo eram os melhores, porque eram os mais capazes de sobreviver na selva humana, teoria que se transformou na teologia nacional do final do século XIX nos Estados Unidos” (p. Paz e Terra, 3ª edição, p. 159).

Em seu famoso artigo “Sobre a tendência das variedades a afastarem-se indefinidamente do tipo original”, o também naturalista Alfred Wallace, considerado o descobridor da Seleção Natural juntamente com Darwin, sintetiza esta visão competitiva entre os seres vivos da seguinte forma:

“A vida dos animais selvagens é uma luta pela existência.
O empenho completo de todas as suas faculdades e energias é exigido para preservar sua própria existência e sustentar sua prole infantil. A possibilidade de conseguir alimento durante as estações menos favoráveis e escapar aos ataques de seus inimigos mais perigosos são as condições primárias que determinam a existência tanto dos indivíduos quanto da espécie inteira. Estas condições também determinarão a população de uma espécie e, por uma consideração cuidadosa de todas as circunstâncias, podemos ser capazes de compreender (e, em algum grau, de explicar) o que à primeira vista parece tão inexplicável: a excessiva abundância de algumas espécies, enquanto outras, proximamente aparentadas, não muito raras.”

“O número anual de mortos deve ser imenso e, como a existência individual de cada animal conta apenas consigo mesma, os que morrem devem ser os mais fracos (os mais jovens, os velhos e os doentes), enquanto que os que prolongam suas existências podem apenas ser os mais perfeitos em saúde e vigor (os mais capazes de obter alimento regularmente e de evitar seus numerosos inimigos). Eis aqui, como observamos de início, “uma luta pela existência”, na qual os mais fracos e menos perfeitamente organizados
devem sempre sucumbir.”

Portanto, a Seleção Natural, e isto o próprio Darwin escreveu numa carta a Lyell, depende da “luta pela existência malthusiana”. Conclui-se assim que, contextualmente, o darwinismo social não pode ser dissociado do principal conceito que norteia os ideais de Darwin e Wallace, ou seja: a Seleção natural. No fundo o que verdadeiramente prevalece é a esperteza ou astúcia dos mais poderosos. A história não nos deixa mentir quanto isso.

É isso!

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