Alfred Wallace e o Espiritismo

É fato comum as religiões tentar achar na ciência indícios que corroborem com seus preceitos ou doutrinas. O Espiritismo é um caso exemplar. Daí a proliferação de livros sobre o assunto. Por exemplo: “Darwin e Kardec: um diálogo possível”, “Fundamentação da Ciência Espírita”, “A Ciência dos Espíritos”, “O Espiritismo Perante a Ciência” etc. Especificamente em relação a este último título, o conteúdo a seguir me chamou atenção, não pelas “evidências científicas” apresentadas, mas por uma carta atribuída a Alfred Wallace, que versa sobre fenômenos de natureza espiritualista.

É bem verdade que Wallace era um espiritualista confesso. Ao contrário do naturalista Charles Darwin, que se utilizou da Seleção Natural para explicar todos os fenômenos relacionados à vida, Wallace nunca foi capaz de aplicá-la à mente humana. Isso explica em partes porque a maioria dos intelectuais elegeram Darwin como o baluarte da evolução. Mas essa é uma outra história...

Vamos à suposta carta de Alfred Wallace à revista Times (o “suposta” é por não ter encontrado o ano e a edição do referido periódico onde a missiva teria sido publicada):

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“Pode parecer ridículo colocar-se alguém diante de uma mesa e acreditar que um dos seus finados parentes venha conversar por meio desse móvel. É isto, porém, uma verdade, e entre os milhares de fatos narrados pelos mais honoráveis homens de ciência citaremos a seguinte carta de Alfred Wallace, não só por ser particularmente probante, como porque o autor está acima de qualquer suspeita.

Carta de Alfred Russel Wallace ao editor do Times.

“Senhor. Apontado por muitos de vossos correspondentes como um dos homens de ciência que crêem no Espiritismo, seja-me permitido estabelecer, ligeiramente, as provas sobre as quais se funda minha crença.

Comecei minhas investigações há cerca de oito anos, e considero circunstância feliz para mim que os fenômenos maravilhosos fossem, nessa época, menos comuns e muito menos acessíveis que hoje; isto me levou a experimentá-los em larga escala, na minha casa e em companhia de amigos, nos quais podia confiar.

Tive, assim, a satisfação de demonstrar, com o auxílio de grande variedade de experiências rigorosas, a existência de ruídos e movimentos que não podem ser explicados por nenhuma causa física conhecida ou concebível.

Assim, familiarizado com esses fenômenos, cuja realidade não deixa a menor dúvida, estive em condições de comparálos com as mais poderosas manifestações de médiuns de profissão e pude reconhecer a identidade de causa entre uns e outros, em vista de semelhanças não muito numerosas, mas bastante características.

Consegui igualmente obter, graças a paciente observação, provas certas da realidade de alguns fenômenos dos mais curiosos, que me pareceram e ainda me parecem dos mais concludentes. Os pormenores dessas experiências exigiriam um volume, mas talvez me fosse permitido descrever sucintamente uma delas, pelas notas tomadas no momento, a fim de mostrar, por um exemplo, como é possível evitar as fraudes de que o observador paciente é vítima, muitas vezes, sem o suspeitar.

Uma senhora, que nunca vira um desses fenômenos, pediunos, a minha irmã e a mim, que a acompanhássemos a um médium de profissão, bem conhecido Lá fomos e tivemos uma sessão particular, em plena claridade, por um dia de verão. Depois de grande número de movimentos e pancadas, como de hábito, nossa amiga perguntou se o nome da pessoa falecida, com quem desejava comunicar-se, podia ser
soletrado. Sendo afirmativa a resposta, a senhora apontou, sucessivamente, as letras de um alfabeto impresso, enquanto eu anotava as que correspondiam às três pancadas afirmativas.

Nem minha irmã nem eu conhecíamos o nome que nossa amiga desejava saber, como ignorávamos o de seus defuntos pais; não pronunciara ela o próprio nome e nunca havia visto o médium antes.

Descreverei exatamente o que se passou, alterando apenas o nome da família, por não ter autorização para publicá-lo. – As letras que notei foram: Y, R, N, E, H, N, O, S, P, M, O, H, T. Pronunciadas as três primeiras letras, Y, R, N, disse minha amiga: é um contra-senso, seria melhor recomeçar. Justo, nesse instante, seu lápis estava na letra E, e as pancadas foram dadas. Veio-me uma idéia (tinha lido um fato semelhante, sem ter sido nunca testemunha), e disse: – Peço que continue; penso saber o que isto quer dizer.

Quando minha amiga acabou de soletrar, apresentei-lhe o papel; ela não viu sentido nenhum. Fiz uma divisão depois da primeira letra H, e pedi à senhora que lesse as duas partes, às avessas. Com grande espanto seu, surgiu, corretamente escrito, o nome Henry Thompson, que era o de seu filho morto e de quem ela queria informações. Justamente, por essa época, eu ouvira falar, à saciedade, da destreza maravilhosa da médium no apanhar as letras do nome que os visitantes enganados esperavam, apesar do cuidado que tinham em passar o lápis nas mesmas, com perfeita regularidade. Essa experiência (de que garanto a exata descrição feita no relato precedente), era e é, a meu ver, a refutação completa de todas as explicações apresentadas até aqui sobre os meios empregados para indicar, por pancadas, os nomes das pessoas falecidas.

Sem dúvida, não espero que os céticos, quer se ocupem ou não de ciência, aceitem tais fatos, de que poderia, aliás, citar grande número de minha própria experiência, mas também, por seu lado, não devem eles esperar que eu ou milhares de homens inteligentes, a quem foram dadas provas assim irrecusáveis, lhes adotemos o curto e fácil modo de explicação.

Permiti que faça, ainda, algumas observações sobre as idéias falsas que grande número de homens de ciência conceberam, no que toca à natureza destas pesquisas. Tomarei como exemplo as cartas de vosso correspondente Dircks.

Parece ele considerar como argumento contra a realidade dessas manifestações a impossibilidade de produzi-las e mostrá-las à vontade; outro argumento é o de que não podem ser explicadas por nenhuma lei conhecida. Mas, nem a catalepsia, nem a queda das pedras meteóricas, nem a hidrofobia podem ser produzidas quando se quer; entretanto, são fatos. O primeiro foi algumas vezes simulado, o segundo negado outrora e os sintomas do terceiro grandemente exagerados; por isso nenhum desses fatos foi definitivamente admitido no domínio da ciência, e entretanto ninguém se servirá desse argumento para recusar-se a deles ocupar-se.

Além disso, é estranho que um homem de ciência motive sua recusa em examinar o Espiritismo, no estar este em oposição a todas as leis naturais conhecidas, especialmente a da gravitação, e em contradição aberta com a química, a fisiologia humana e a mecânica. Ora, os fatos, se são reais, dependem de uma ou de muitas causas, capazes de dominar ou contrariar o efeito daquelas diferentes forças, exatamente
como elas contrariam ou dominam outras. Deveria ser isto forte estímulo para levar um homem de ciência a examinar o caso.

Não pretendo o título de verdadeiro homem de ciência; há muitos, entretanto, que merecem esse nome e que não foram absolutamente considerados especialistas pelo vosso correspondente. Julgo como tais o finado Dr. Robert Chambers, o professor William Gregory, de Edimburgo, e o professor Hare, de Filadélfia, infelizmente mortos, bem como o Doutor Guilly de Malvern, sábio médico, e o juiz Edmonds, um dos melhores jurisconsultos da América, os quais fizeram as mais amplas pesquisas no assunto. Todos esses vultos estavam não só convencidos da realidade dos fatos maravilhosos, senão ainda que aceitavam a teoria do Espiritismo moderno como a única que poderia englobar todos os fenômenos e explicá-los. Conheço também um fisiologista vivo, de elevada posição, que é, ao mesmo tempo, hábil investigador e fervoroso crente.

Para concluir (aviso a Bersot), posso dizer que, apesar de ter ouvido falar em grande número de embustes, nunca os descobri; e se a maior parte dos fenômenos extraordinários são burlas, só podem ser produzidos por máquinas ou aparelhos engenhosos, e estes ainda não foram descobertos. Não exagero declarando que os principais fatos estão agora bem estabelecidos e são tão fáceis de estudar como qualquer outro fenômeno excepcional da natureza, cuja lei ainda não se conhece.

São fatos de grande importância estes para a interpretação da História, cheia de casos semelhantes, assim como para o estudo do princípio da vida e da inteligência sobre o qual as ciências físicas lançam fraca e incerta luz. Creio firme, convictamente, que cada ramo da filosofia deve ser permitido, até que seja escrupulosamente examinado e tratado como constituindo parte essencial dos fenômenos da natureza
humana.

Seu muito respeitador Alfred R. Wallace.”

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É isso!

Fonte:
Gabriel Delanne: “O Espiritismo Perante a Ciência”. Edição Digitalizada.

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