“Pare de sofrer”: fique rico!

“Na oferta da Igreja Universal chama a atenção uma mensagem que é muito presente em seus cultos e mídia. A Igreja Universal apresenta a fórmula do “Pare de sofrer” ao mostrar o que considera serem as causas do sofrimento e pôr em cena a fórmula de como se libertar de tal sofrimento. O sentimento religioso constituído pela Igreja Universal do Reino de Deus é de medo dos outros, do diferente, sentimento de ser consolado e também da promessa de libertação.

Por intermédio da fórmula “Pare de sofrer”, seus representantes garantem que a felicidade se encontra aqui e agora; prometem saúde, prosperidade financeira e amor. Só não pára de sofrer quem não quer fazer parte da “grande família iurdiana” ou ainda não foi tocado por Deus. É o que fica implícito nessa mensagem.

Na IURD, todas as pessoas são acolhidas, há esperança para todos. Deus tem um plano grandioso para suas vidas. Essas palavras são proferidas tanto pelos pastores, como pelos fiéis. A IURD oferece a promessa mais sedutora repetindo à exaustão o lema “Pare de sofrer”. Afirma Mariano (1999, p. 59) que “sua promessa mais sedutora - porque mais utópica ou mais incongruente com a condição humana -, repetida a exaustão em emissoras de rádio e TV, é o lema ‘Pare de sofrer’”.

“Pare de sofrer” é uma mensagem presente no discurso da Igreja Universal que exerce o controle do medo e sugere a inclusão social. Em um dos cultos, durante o trabalho de campo, o pastor Ricardo disse:

Ser pobrezinho, viver na miséria, é coisa do diabo. Arranca teu povo desse sofrimento, não é justo que esse povo saia daqui do mesmo jeito que chegou em pânico, cheio de dúvida, de desespero. Em nome de Jesus, com poder e glória (11/10/2008).

A IURD tem a oferta, tem a proposta para o convertido. Ela explica, pelo menos aparentemente, o mundo, as razões do sofrimento de homens e mulheres. A Igreja, como se percebe, tem uma proposta que é intencional. Segundo Corten et alli (2003, p. 14), essa Igreja consegue apresentar uma concepção do religioso que leva em conta os problemas cotidianos de pessoas que se encontram maltratados pelas mudanças sociais e econômicas.

A mensagem “Pare de sofrer” pode ser compreendida a partir do entendimento de sua proposta de libertação do mal e do sofrimento encarnados e provocados pelo demônio e pelo exorcismo. O exorcismo, segundo Bittencourt (1996), implica dar nome ao inimigo e causador dos males, que é o demônio. O exorcismo seria a resposta a problemas que vão desde desemprego até as lesões irreversíveis em crianças.

A vantagem é que agora se dispõe de um poder para enfrentá-lo, afirma Bittencourt (2003). Esse poder é assumido pelos representantes da Igreja Universal. O líder da Universal explica como as pessoas podem vir a ter problemas. Segundo Macedo (2004), isso se dá por intermédio da possessão demoníaca. Macedo (2004, p. 59-60) elenca alguns dos sintomas de possessão: nervosismo, dores de cabeça, insônia, medo, desmaios ou ataques, desejo de suicídio, doenças que os médicos não descobrem as causas, visões de vultos ou audição de vozes, vícios, depressão. Ele afirma que quase todas as pessoas que pedem oração e sofrem de um ou mais desses males são possessas.

A Igreja Universal apresenta-se como aquela que é capaz de libertar as pessoas desses espíritos e, conseqüentemente, de resolver seus problemas cotidianos. Ela tanto enumera os sinais de possessão, como identifica a origem de tais demônios. Eles se apoderam das pessoas, afirma Macedo (2004, p. 38-43), por hereditariedade, pela participação direta ou indireta em centros espíritas, por trabalhos e despachos, por maldade dos próprios demônios, por envolvimento com pessoas que praticam o espiritismo, por comidas sacrificadas a ídolos, por rejeitarem a Cristo.

Dessa forma, o sofrimento é causado pelo diabo, manifestando sintomas psicossomáticos ou incapacidade de prosperar nos negócios. “O demônio está amarrando a vida das pessoas”, afirma o pastor da IURD. Esse fenômeno religioso desresponsabiliza o sujeito de suas ações, explica Almeida (2003, p.334-335).

Enquanto o protestantismo histórico exigia do indivíduo uma conduta moral diante do mundo, a Igreja Universal lida com certa ambigüidade quanto à noção de responsabilidade pessoal. Embora afirme, em alguns momentos, a condição pecaminosa da pessoa humana, seu entendimento da figura do diabo, no que diz respeito a sua atuação na vida das pessoas, tende a retirar do sujeito a responsabilidade sobre as ações ditas pecaminosas.

Nesse sentido, segundo Almeida (2003), converter-se à IURD implica eliminar do sujeito a idéia de pecado, de culpa pessoal, e a necessidade de arrependimento consciente. Numa de suas falas, Antonio diz que todas as coisas que vivenciou não eram suas idéias em prática, mas de Satanás. Na verdade, em sua opinião, ele estava sendo manipulado por Satanás. É provável que esse seja um elemento facilitado para o sujeito suportar o enfrentamento de seus problemas.

Pelo caminho da libertação, que valoriza a figura do diabo e sua possessão inconsciente, ficaria mais fácil para o fiel. Nesse caso, não foi a pessoa que escolheu o mal, mas foi possuída por este, diz Mariz (2000).”

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É isso!


Fonte:
Miguel Pereira da Silva: “A Reconstrução Psicossocial da Identidade Religiosa: Estudo dos conversos à Igreja Universal do Reino de Deus”. (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões da Universidade Federal da Paraíba, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Ciências das Religiões, na linha de pesquisa Religião, Cultura e Produções Simbólicas sob a orientação do professor Dr. Fabrício Possebon. Universidade Federal da Paraíba). João Pessoa, 2009.

Nota:
O título e a imagem inseridos no texto não se incluem na referida tese.

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