“De acordo com Mariano (2005), A Teologia da Prosperidade nasceu nos Estados Unidos na década de 40 do século passado, porém, somente a partir dos anos 70 se constituiu como um movimento doutrinário que fez entrada nos grupos evangélicos carismáticos norteamericanos.Os críticos dessa teologia a rotulam de Health and Wealth Gospel, Faith Movement, Faith Prosperity Doctrines, Positive Confession.
O surgimento das doutrinas sobre a prosperidade está ligado ao fenômeno do televangelismo norte-americano. Diz Mariano (2005):
Pressionados pelas despesas crescentes de seus projetos, que foram se tornando cada vez mais ambiciosos, os televangelistas refinaram as formas de levantar fundos, integrando os apelos financeiros à teologia, que, entre os anos 50 e 60, passou a absorver os ensinos de Hagin [...] Não é à toa que a Teologia da Prosperidade ingressou no Brasil e se espraiou em diversos segmentos evangélicos por meio dos neopentecostais, justamente os mais ativos difusores do televangelismo entre nós.(p.152).
Segundo essa teologia, Deus reserva toda sorte de bênçãos para aqueles que lhes são fiéis. As promessas de Deus, contidas na Bíblia, são destinadas a todas as pessoas. Porém, para se chegar ao gozo das promessas divinas, o fiel deve promover e articular toda a sua existência a partir da fé. Assim pode ser evidenciado o testemunho de uma fiel pertencente à igreja Universal do Reino de Deus, em programa veiculado pela TV Record em 29 de outubro de 2008:
Eu tinha ataque epilético, tinha problema de nervosismo, angústia, depressão, problemas com a família. Tudo pra mim dava errado. Problemas também na vida financeira, no trabalho. Foi quando eu decidi vim participar dessa vigília, da oração e foi onde a minha vida mudou. Hoje eu sou curada da epilepsia, não tenho mais convulsões, nem depressões, nem angústia. Minha família é transformada e hoje eu sou feliz.
No entanto, a experiência de fé não pode se constituir como súplica ou pedido a Deus. Ter fé equivale a determinar ou exigir de Deus o que está posto como promessa. Diz Soares (2004):
Também na ilha de Malta, após um naufrágio, o apóstolo Paulo, sabendo que o pai do maioral da ilha estava acamado, orou e, em seguida, o homem ficou curado. O que Paulo fez? Ele determinou, e o milagre ocorreu (Leia Atos 28.8). [...] Os homens que fizeram grandes coisas no passado não eram especiais, privilegiados. Também não eram pessoas a quem Deus dotara de um poder diferente e, por isso, faziam o que queriam. A diferença entre eles e nós é que eles tinham o entendimento de como as coisas espirituais funcionavam. Hoje qualquer um que aprende a tomar posse da benção também pode agir e fazer semelhante aos irmãos do passado. Não somos diferentes deles. Temos o mesmo Deus e as mesmas promessas. Se não ocorre conosco o mesmo, deve ser porque não temos agido como eles agiam. Determinar é viver o cristianismo no mais alto nível. (p. 55).
É nesta mesma direção que se pode evidenciar a compreensão de Macedo (2005):
Note, amigo leitor, que Jesus não ordenou que fizessem orações para os doentes, enfermos e endemoninhados, mas deu-lhes ordem para curá-los, libertá-los, etc. Está aí a chave do sucesso da Igreja Universal do Reino de Deus. Nós não oramos a Deus pelos doentes e enfermos, nem pedimos para que ele liberte o oprimido, não! Absolutamente! Fazemos isso através da fé em nome do Senhor Jesus Cristo! Entretanto, para que isso possa ser realizado, ordenamos a satanás que deixe a criatura. (p.74).
No entanto, a realidade do sofrimento se faz presente na vida de todas as pessoas, independente de elas professarem ou não alguma fé. A infidelidade no cumprimento das prescrições bíblicas e a ação destruidora do diabo são os campos a partir dos quais os discursos neopentecostais indicam como responsáveis pela existência do sofrimento e pela ausência da tomada de posse das bênçãos prometidas por Deus. Sem conversão e libertação dos domínios do diabo, torna-se impossível ao fiel usufruir das bênçãos divinas.
De acordo com Soares (2004), Jesus, junto à sua missão salvífica, veio também ensinar a todos o que é necessário fazer para conquistar as bênçãos divinas. A conquista dessas bênçãos corresponde a um itinerário composto de cinco passos.
Primeiro passo. É necessário que o indivíduo tenha fé. Conduzido pela fé o fiel manifesta a confiança que Deus realizará todas as suas declarações a respeito dos seus filhos. Nesta direção, o crente deve recusar qualquer outra declaração, mesmo que lhe pareça correta. Segundo passo. A maturidade do fiel é manifesta quando ele determina ao sofrimento ao qual está acometido que saia da sua vida. Deus já realizou a parte dele para que as bênçãos se efetivem na vida de seus filhos. A palavra, na vida da pessoa de fé, remove as montanhas.
Terceiro passo. O fiel jamais pode permitir que a dúvida habite em seu coração. Ao determinar que os problemas sejam resolvidos e que o diabo seja afastado de sua vida, se ainda existir uma mínima dúvida, a benção não é conquistada. A presença da dúvida seria, na verdade, a demonstração da falta de fé naquilo que se faz.
Quarto passo. O fiel deve crer que aquilo que foi determinado será realizado. Se isso não ocorre imediatamente, ele deve continuar determinando durante o intervalo de tempo necessário para que a benção se realize. Ao acreditar no cumprimento da determinação proclamada, o fiel manifesta confiança na Palavra do próprio Deus.
Quinto passo. Este último passo é reservado a Deus. Aqui se inscreveria o plano do cumprimento das promessas. Assim diz Soares: “Depois que seguir os quatro passos, você deve considerar a obra feita, mesmo que os sintomas continuem. Este é o método de Deus: o da fé”. (Soares, 2004, p.81).
Segundo Mariano (2005), a Teologia da Prosperidade tem promovido uma grande inversão no interior do sistema axiológico pentecostal. Diferentemente da pregação pentecostal que acentua a ideia da salvação, enquanto experiência de redenção após a morte, no neopentecostalismo pode-se observar uma ênfase do retorno da fé nesta vida. Outro aspecto relevante de mudança operada diz respeito à desvalorização de temas bíblicos relativos ao martírio, à cruz e ao sofrimento. Enquanto esses temas são cruciais para o universo pentecostal, no neopentecostalismo eles cederam lugar para uma preocupação voltada para a operacionalização da fé em Deus como forma de obter saúde, dinheiro, sucesso e felicidade. É nesta direção que podemos evidenciar o que diz Coelho:
Há poucos meses, ocorreu em Brasília um congresso que mostrava os princípios para enriquecer. Um dos temas foi ‘Como se apossar das riquezas dos incrédulos’ (...) A Teologia da Prosperidade que tira a cruz do crente (...) Não se trata de masoquismo espiritual. Isto é uma lei da vida. No mundo há sofrimento (...) A Teologia da Prosperidade é alienante, parcial, injusta, setorial e elitista. (Coelho apud Mariano, 2005, p.158).
Para os defensores da Teologia da Prosperidade, o desígnio de Deus é estabelecer um pacto ou sociedade com aqueles que lhes são fiéis. Se o pecado de Adão e Eva quebrou a aliança existente entre Deus e o ser humano, é através do sacrifício de Jesus Cristo na cruz que esta sociedade é refeita. Neste sentido afirma Macedo (2000):
Dessa maneira, Jesus Cristo vem a ser o caminho de volta a Deus. Através do seu sacrifício, Ele removeu para sempre a nossa condenação e derrubou as barreiras que estavam entre nós e Deus, de modo que somos agora bem-vindos ao retorno da Sua presença, onde podemos outra vez ter a vida abundante. (p.17).
O fiel, em busca da sustentação de sua responsabilidade no contrato de sociedade com Deus, deve conduzir-se moralmente de acordo com as exigências bíblicas e, de modo especial, é chamado a acolher e viver um compromisso financeiro celebrado através do dízimo e das ofertas. Diz Macedo (2000):
Dar o dízimo é se candidatar a receber bênçãos sem medida, de acordo com o que diz a Bíblia, sob os aspectos físico, espiritual e financeiro. Quando pagamos o dízimo a Deus, Ele fica na obrigação (porque prometeu) de cumprir a Sua Palavra, repreendendo os espíritos devoradores que desgraçam a vida do homem, atuando nas doenças, nos acidentes, nos vícios, na degradação social e em todos os setores de atividade humana, fazendo com que o homem sofra eternamente. (p.54).
Segundo essa teologia, não existe outra saída para Deus senão realizar as permanentes bênçãos na vida daqueles que se submeteram às determinações de sua palavra. O contrato firmado permite, assim, que os fiéis também exijam de Deus a fidelidade e o compromisso com a promessa feita.
De acordo com Mariano (2005), durante os cultos da Igreja Universal do Reino de Deus, os fiéis são chamados para que, além do dízimo e das ofertas, se disponham a deixar de ser empregados abrindo seus próprios negócios.
A Teologia da Prosperidade tem se afirmado também fora do campo do neopentecostalismo. Nota-se sua entrada em igrejas protestantes renovadas como a Quadrangular, a Brasil para Cristo, a Casa da Benção e até mesmo a Assembléia de Deus.”
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É isso!
Fonte:
Márcio Antônio Gonçalves: “Modos de Subjetivação e Demandas de Cura nas Igrejas: Neopentecostais: a ética do sexo, poder e dinheiro”. (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia – Mestrado, do Instituto de Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia, como requisito parcial à obtenção do Título de Mestre em Psicologia Aplicada. Área de Concentração: Psicologia Aplicada Orientador: Prof. Dr. João Luiz Leitão Paravidini). Universidade Federal de Uberlândia. Uberlândia, 2009.
Nota:
O título e a imagem inseridos no texto não se incluem na referida tese.
A ideologia da Prosperidade - II
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