A identidade homem-natureza na sua compreensão mítica

A identidade homem-natureza na sua compreensão mítica e metafísica (teleológica)

“A concepção primitiva de natureza, anterior à dos antigos gregos, desenvolveu-se no sentido da sua compreensão mágica. Na crença de um mundo em que a natureza era concebida como a totalidade. As rochas, as montanhas, o firmamento, os espíritos e deuses, os seres humanos, os animais e a vegetação, tudo fazia parte da natureza. Existia uma espécie de analogia entre o homem e a natureza, sendo para ela transportada características humanas numa simbiose entre a ação, os sentimentos humanos, e as forças naturais – fenômeno esse chamado de antropomorfização. Natureza e homem constituíam uma unidade viva.

O mundo que envolvia a mente primitiva era, ao mesmo tempo, bondoso e hostil. A natureza e o divino se confundiam; forças e fenômenos da natureza eram venerados e personificados em divindades ou demônios. Era um mundo em que as atitudes dos homens se traduziam em adoração e temor diante do sagrado.

A magia formava uma concepção de natureza que possuía suas leis, destaca LENOBLE, e era segundo estas leis que os homens pensavam, raciocinavam e que buscavam investigar as formas das coisas. Tal atitude sugere, conforme o autor, que no âmbito do mito já se podia encontrar uma racionalidade, ainda que permanecendo dentro dos limites do mítico. Tanto quanto o pensamento racional, o pensamento mítico buscava uma ordem no universo, embora a sua função básica fosse a de responder à necessidade de sobrevivência, de autoconservação e de enfrentamento do medo.

As cosmologias pré-socráticas fixaram o instante de transição entre “o mito e o logos”, uma demarcação que não é tão visível. Assim mesmo, a importância da escola jônica deve ser considerada, pois ela representa os primórdios da ciência na busca de explicações racionais das causas e fenômenos naturais. Esta escola marcou a história da filosofia grega através das explicações elaboradas sobre a origem e composição do universo inaugurando uma nova forma de ver o mundo.

De início, os filósofos da Escola de Mileto como Tales, Anaximandro, Anaxímenes, Heráclito, formularam teorias cosmológicas no sentido de buscar princípios únicos do mundo. Sem examinar em detalhes cada uma das teorias desenvolvidas por esses pensadores, pode-se dizer, esquematicamente, que elas se aproximam na tentativa de reconhecer e reunir a pluralidade do Universo através de elementos ou substâncias arquetípicas: o ar, a água, a terra, o fogo. Estes elementos davam origem aos fenômenos naturais, formavam os diferentes seres e toda a multiplicidade da natureza.

Uma característica deste período é que o conhecimento não visava transformar a natureza, mas a alcançar uma espécie de saber contemplativo. Conhecer era contemplar, pôr-se ou estar dentro e não separado da natureza. VERNANT quando se refere ao pensamento desta época lembra que a escola de Mileto “construiu uma Razão, uma primeira forma de racionalidade (...) diferente da razão experimental da ciência contemporânea, orientada para a exploração do meio físico e cujos métodos, instrumentos intelectuais e quadros mentais foram elaborados no curso dos últimos séculos, no esforço laboriosamente continuado para conhecer e dominar a Natureza”.

O pensamento de Aristóteles representa, segundo LENOBLE, o primeiro interesse em conhecer a natureza segundo as suas próprias leis e constitui um marco importante para a história da ciência, em particular da biologia. Dando grande realce à observação da natureza, Aristóteles dedicou-se a ela de um ponto de vista mais sistemático, ainda que tenha combinado os métodos metafísico e científico de investigação (método indutivo-dedutivo) para compreender o universo e a natureza.

Uma das características predominantes do pensamento de Aristóteles foi a procura pelas causas. Não apenas as questões relacionadas ao “como” lhe interessavam, mas, sobretudo, as indagações pela razão de ser das coisas. Para ele, a explicação da ação de forças exteriores não era suficiente para se compreender a regularidade da natureza e a capacidade de um organismo desenvolver formas mais complexas. As substâncias naturais deveriam agir de acordo com as suas próprias forças com vistas à realização de um fim, o seu bem, e todos os fenômenos da natureza eram processos ou a manifestação de realização desse bem. Assim, cada ser possuía sua própria natureza. Ou seja, cada ente contém em si mesmo, na imanência da sua natureza, uma substância que o determina essencialmente.

Na concepção teleológica
de natureza de Aristóteles tudo está regido por leis naturais que regulam objetivamente o nascimento, o crescimento e o perecimento das coisas. Nesta sucessão, a natureza mantém-se igual e os seres humanos, e só eles eram considerados imortais; e se tornavam imortais permanecendo na memória dos vivos. A concepção aristotélica de natureza e de universo finito, hierarquizado e governado pelo finalismo, influenciou não apenas o período imediatamente posterior a ele, mas permaneceu no mundo ocidental por muitos séculos.”


---
Fonte:
ELISABETH CHRISTMANN RAMOS: "A ABORDAGEM NATURALISTA NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL: UMA ANÁLISE DOS PROJETOS AMBIENTAIS DE EDUCAÇÃO EM CURITIBA". (Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas/Doutorado. Centro de Filosofia e Ciências Humanas. Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de Doutor em Ciências Humanas. Orientador: Dr. Selvino José Assmann. Co-orientador: Dr. Luiz Fernando Scheibe). Florianópolis - SC, 2006.

Nota
:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese.
As referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Excetuando ofensas pessoais ou apologias ao racismo, use esse espaço à vontade. Aqui não há censura!!!