O ideário iluminista : os elementos da razão no cenário brasileiro

"O iluminismo, revolucionário movimento intelectual que surgiu na Inglaterra no século XVIII e depois se disseminou por toda a Europa - com mais força na França e também na Alemanha - tinha como um de seus pressupostos o esclarecimento racional, ou seja, o uso da razão para explicar os acontecimentos e os fenômenos em todos os campos: religião, ciências, direito, economia e Estado.

A metáfora com as luzes, usada inclusive no próprio nome do movimento, evidencia a idéia de que a razão é a única forma aceitável de explicação do mundo, representante do conhecimento a iluminar as mentes e opositora das trevas, que simbolizam a escuridão da ignorância e da irracionalidade. Para o pensamento iluminista, a razão é um instrumento de mudança, cujas ferramentas são a observação e a experimentação. Os iluministas consideravam que o homem poderia se emancipar através da razão e do saber, ao qual todos deveriam ter livre acesso. Eram contra tudo o que fosse desprovido de base racional e, portanto, as formas de explicação do mundo baseadas na fé cristã e na vontade dos soberanos eram rejeitadas nessa concepção.

Em função de tal perspectiva, repudiavam o poder absoluto dos reis, os quais, para exercê-lo se escudavam na justificativa de que ele provinha de Deus. Assim, as idéias iluministas representavam uma ameaça à estabilidade dos governos absolutistas, porque pregavam a igualdade civil e o fim das monarquias.

Em termos de preocupações filosóficas, os pensadores iluministas podem ser divididos em dois grandes grupos: um grupo que elege como tema fundamental as questões políticas e sociais e o outro, que trata dos aspectos relativos à liberdade econômica e a não regulamentação da economia pelo Estado. Dentre os primeiros destacaram-se Montesquieu, Voltaire, Rousseau, Diderot e D’Alembert. No segundo grupo destacaram-se, dentre outros, Quesnay e Adam Smith.

Conforme se evidencia na literatura, os principais representantes de cada grupo tiveram suas idéias divulgadas por todo o mundo, sendo que a Europa foi onde primeiro produziram frutos estes ideais, passando o continente, por isso, a ser um modelo de civilização a ser imitado pelas nações, representando o ideal de perfeição e o mais conveniente estilo de vida. Conforme assinalam diferentes autores, as idéias iluministas tiveram influência decisiva no processo de Independência Americana (1776) e, principalmente, na Revolução Francesa (1789).

Quanto à situação no Brasil, também se fez presente a influência dos ideais iluministas. Eles entraram no país de várias formas, sendo que a mais comum foi pelas mãos dos filhos de famílias ricas, muitos deles da região das minas, que iam completar seus estudos na Europa, principalmente em Coimbra e voltavam imbuídos dos ideais iluministas que impregnavam a Europa. Em sua bagagem traziam muitos livros que eram lidos e discutidos em reuniões e, em suas mentes fervilhavam idéias para reformar este país da América, tão primitivo e diferente dos países do Velho Mundo.

Sendo assim, em função da experiência vivenciada e incorporada pelos estudantes a partir do modelo vigente na Europa, o pensamento iluminista encontra condições de despertar nos brasileiros a consciência e o desejo de libertação. Dentre eles, os mais contaminados foram os mineiros, porque estavam insatisfeitos com a posição de Portugal em relação às restrições ao comércio e à excessiva taxação sobre o ouro.

Desta forma, a região das minas foi onde despontaram os representantes mais ativos desta mobilização, talvez porque ali fosse o lugar onde a insatisfação estivesse mais evidente e também porque aquela sociedade, que já conhecia o pensamento iluminista, estivesse pronta para reivindicar mudanças. Além disso, a urbanidade possibilitou-lhes uma fácil comunicação, a rápida disseminação das idéias e a capacidade de mobilizar e aglutinar a sociedade. As idéias iluministas representaram, então, naquele momento, a compreensão de que havia uma possibilidade de reverter a situação de dominação em favor dos brasileiros.

RODRIGUES, no prefácio do livro Colonizador- Colonizado de autoria de Eliane Lopes, destaca que:

“As idéias dos pensadores iluministas franceses, bem como as da Independência Americana, se estavam presentes- e estavam- com a liderança da Inconfidência Mineira, só estavam porque o terreno se encontrava preparado para recebê-las e incorporar seletivamente o que era mais útil para o momento.” (LOPES, 1985, p.14)

Considerando os aspectos apontados, verifica-se que estes constituem fatores relevantes a se considerar, haja visto que as idéias somente podem produzir ações e se concretizarem quando representam uma resposta para algo que já está sendo buscado. Ao que tudo indica, assim aconteceu com a Inconfidência Mineira, quando as idéias iluministas de libertação e independência encontraram naquela sociedade um terreno propício, decorrente da insatisfação dos mineiros com a situação de exploração que vivenciavam.

Assim, em função de tal situação, os mineiros que compartilhavam o desejo de liberdade se reuniram, se organizaram e planejaram libertar o país do jugo português e aqui estabelecer a República, uma forma de governo que era diferente da adotada na Europa e que havia sido implantada nos Estados Unidos. Nessa ocasião cogitou-se inclusive, de instalar-se a futura capital desta República em São João d’El-Rei.

Entretanto, os idealizadores deste projeto para o Brasil foram traídos e os seus planos denunciados. O governo, ao ser informado do que se tramava, suspendeu a programada derrama, ocasião na qual se deflagraria o movimento e os insurgentes passaram a ser identificados como “inconfidentes” – indignos de confiança - porque haviam cometido uma traição à Coroa.

Em decorrência desses fatos, naquele momento o movimento foi abortado e a Independência não se concretizou no século XVIII, sendo que os mentores da revolta foram severamente punidos e considerados, ainda, traidores da pátria. Entretanto, a Independência foi apenas postergada, porque os brasileiros, naquele momento, se conscientizaram de que era possível combater a espoliação vigente, fazendo-lhe face, a fim de tornar este país livre e independente. Portanto, é no intuito de construir um nova nação em tudo diferente do estado em que viviam anteriormente, que, após a Independência, cresce, no Brasil, o desejo de progredir, não só na agricultura, pecuária, comércio e manufatura, mas, também, no que diz respeito às artes e ciências.

Complementando este quadro histórico, e face à necessidade de entender a dinâmica das instituições – biblioteca, imprensa e sociedade literária – naquele contexto, apresenta-se de forma sintética a situação das mesmas como elementos fundamentais à compreensão das ações de Baptista Caetano de Almeida.

O delator foi Joaquim Silvério dos Reis, que revelou os planos da revolta em troca da promessa de perdão da dívida que possuía com o fisco.

Só por meio da propagação das luzes se consegue o progresso das Artes e Ciências e, com estes a grandeza e o florescimento dos Estados.” (FIGUEIREDO, 1899, p.839)"


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Fonte:
Rosemary Tofani Motta: "BAPTISTA CAETANO DE ALMEIDA: um mecenas do projeto civilizatório em São João d’El-Rei no início do século XIX - a biblioteca, a imprensa e a sociedade literária". (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Escola de Biblioteconomia da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Ciência da Informação. Área de Concentração: Informação e Sociedade Orientadora: Profª. Alcenir Soares dos Reis EB/UFMG Co-Orientadora: Profª. Marta Eloísa Melgaço Neves – EB/UFMG). Belo Horizonte, 2000.

Nota
:
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As referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas.

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