Guerra ao espartilho


O texto, a seguir, escrito bem nos primórdios do longo século XX, aborda uma questão que, ainda hoje, é tema rotineiro nos veículos que discutem problemas relacionados à saúde: o preço da vaidade. É comum, por exemplo, abordar-se a utilização do salto alto por parte das mulheres. Muitos médicos vêem no uso excessivo desse utensílio um sério problema de saúde, no entanto, isso parece surtir pouco efeito na vida prática das damas.

Em 1903 o que levantava acalorados debates nesse mesmo âmbito referia-se ao famigerado “espartilho”, que consiste num colete com lâminas de aço ou barbatanas de baleia, usado por mulheres para comprimir a cintura e dar elegância ao corpo. O espartilho era o “preço da vaidade feminina” nos idos anos da Belle Époque, como se pode constar a seguir...


GUERRA AO ESPARTILHO

Recomeça a campanha contra o espartilho, o terrível deformador do corpo, verdadeiro instrumento de suplicio para a mulher. A Alemanha coloca-se resolutamente á frente da propaganda contra esse inimigo da saúde e da beleza da mulher. Os médicos, desde longa data, hão constatado o mal e descrito as suas conseqüências funestíssimas.

Dentro daquele instrumento de tortura, os órgãos internos se apertam, se comprimem, se deslocam. A moda triunfou, a despeito dos avisos e conselhos da ciência. O espartilho continua em uso. Os ocidentais mofam sempre dos chineses pelo habito que têm de encarcerar os pés em sapatos de madeira ou de ferro para impedir o crescimento. Entretanto, ninguém se' lembra de que o espartilho importa ao aplicar ao corpo inteiro aquilo que as chinesas aplicam somente aos pés. Acresce que na China a imperatriz se esforça pela supressão desse costume, ao mesmo tempo estúpido e funesto. E no Japão progressista já existe uma lei proibindo absolutamente o habito de enclausurar os pés.

Os jornalistas da Europa, principalmente os da França, julgam que uma lei de higiene publica que vedasse o uso do espartilho, viria a propósito, agora que se lamenta a diminuição da natalidade. Os alemães, mais práticos que os francesas, procuram livrar suas mulheres da tirania dessa couraça de barbatanas de baleia, pensando ao mesmo tempo em dar-lhes um vestuário, cômodo e pratico: espartilho largo, amplo, saias curtas, calçado com a forma natural do pé, chapéu leve, para não fatigar a cabeça, grosso no inverno ,e.largo nó estio, para proteger contra os ardores do sol, em uma palavra, tudo quanto a lógica da higiene e o senso comum indicam. Oxalá frutifique o exemplo.

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Fonte:
Almanak Historico-Litterario do Estado de S. Paulo. Para o anno de 1903. Monteiro, Oscar (org.), disponível digitalmente no site da biblioteca: Brasiliana - USP

Nota:
Para melhor compreensão do texto, a ortografia utilizada na época foi atualizada para os padrões atuais.
A imagem não se inclui no referido texto.

Fonte da imagem:
Revista "Ilustração Brazileira", edição de 1910,
disponível digitalmente no site: Domínio Público

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