Verificacionismo versus falsificacionismo

VERIFICACIONISMO VERSUS FALSIFICACIONISMO

Segundo Popper podemos deduzir que uma crença científica é falsa, mas nunca podemos induzir que ela seja verdadeira. Dito de outra maneira, as generalizações empíricas não são verificáveis, mas apenas falsificáveis. A maioria das hipóteses são generalizações e a descoberta de muitos exemplos ilustrativos específicos para sustentá-las jamais prova que elas são verdadeiras num sentido absoluto, porque normalmente é impossível examinar todos os exemplos concebíveis.

Por outro lado, uma generalização pode ser refutada quando se encontram exemplos onde ela não é verdadeira. Como disse Popper, a coerência não pode estabelecer a verdade, mas a incoerência e a inconsistência sem dúvida estabelecem a falsidade. O crescimento do conteúdo empírico de uma teoria, aumentando seus falsificadores, acarretará maior probabilidade de a teoria ser refutada pela experiência. Uma teoria falsificável em mais alto grau diz mais sobre o mundo da experiência.

Há circunstâncias em que nós podemos dedutivamente falsificar uma crença científica do ponto de vista lógico, mas não há circunstâncias em que nós podemos indutivamente verificá-la. Popper fixa a ordem metodológica da falsificação nesta assimetria. A epistemiologia popperiana reflete a força do erro. Um sistema empírico deve ser refutado pela experiência.

Sobre esta assimetria é construído o edifício popperiano. A preocupação com a verificação dá lugar à da possibilidade de refutação. Esta assimetria entre verificação e falsificação não é tão nítida como Popper declarou que fosse.

“When, for example, we draw a right-angled triangle on the surface of a sphere using parts of three great circles for its sides, and discover that for this triangle Pythagoras' Theorem does not hold, we may decide that this apparently negative instance is not really negative because it is not a genuine instance at all. Triangles drawn on the surfaces of spheres are not the sort of triangles which fall within the scope of Pythagoras' Theorem. Falsification, that is to say, is no more capable of, yielding conclusive rejections of scientific belief than verification is of yielding conclusive acceptances of scientific beliefs. The asymmetry between falsification and verification, therefore, has less logical significance than Popper supposed” (Gower, 1997, p. 203).

(Trad. livre: Quando, por exemplo, nós traçamos um triângulo de ângulo reto na superfície de uma esfera usando partes de três grandes círculos para seus lados e descobrimos que para este triângulo o Teorema de Pitágoras não se aplica, nós podemos sustentar que esta instância aparentemente negativa não é realmente negativa porque ela não é absolutamente uma instância genuina. Triângulos traçados na superfície de uma esfera não são a espécie de triângulo que incorrem na perspectiva do Teorema de Pitágoras. A falsificação, é necessário reconhecer, não é mais capaz de ajudar conclusivamente na rejeição de uma crença científica do que a verificação é na ajuda conclusiva da aceitação da mesma. A assimetria entre falsificação e verificação, portanto, tem menor significado lógico do que supôs Popper.)

Popper rejeitou firmemente a indução, mas ela é a base do programa popperiano da refutabilidade, desta maneira vemos que Popper não está muito distante de Francis Bacon:

“Anyone who takes evidence seriously in any way at all in deciding what to believe, or tentatively to accept as true, or to ‘prefer’, is an inductivist in this broad sense. Inductivism in this broad sense is more or less equivalent to empiricism … And Popper the arch anti-inductivist is certainly an empiricist of sorts” (Musgrave, 1993, p. 173-174).

(Trad. livre: Qualquer um que leve seriamente a evidência em consideração, em qualquer sentido, na decisão do que acreditar, ou tentadoramente aceitar como verdade, ou ‘preferir’, é um indutivista no senso largo. Indutivismo nesse senso largo é mais ou menos equivalente ao empiricismo... E Popper, o arqui anti-indutivista é certamente uma espécie de empiricista.)

Mas, Putnam alerta que não é um bom conselho para um pesquisador:

"… Popper is not right in maintaining that induction is unnecessary. Even if scientists do not inductively anticipate the future (and, of course, they do), men who apply scientific laws and theories do so. And ‘don't make inductions’ is hardly reasonable advice to give these men" (Putnam, 1992, p. 122).

(Trad. livre:… Popper não está correto em afirmar que a indução é desnecessária. Mesmo que os cientistas não antecipassem indutivamente o futuro (e, certamente, eles o fazem), homens que aplicam leis e teorias científicas antecipam. Não é um bom conselho a dar a estes homens ‘que não façam induções’.)

Putnam compara os esquemas indutivista e popperiano, concluindo que eles não são muito diferentes:

"Theory implies prediction (basic sentence, or observation sentence); if prediction is false, theory is falsified; if sufficiently many predictions are true, theory is confirmed. For all his attack on inductivism, Popper's schema is not so different: Theory implies prediction (basic sentence); if prediction is false, theory is falsified; if sufficiently many predictions are true, and certain further conditions are fulfilled, theory is highly corroborated"(Ibid., p. 123, grifo de Putnam)."

(Trad. livre: Teoria implica em predição (sentença básica ou sentença observacional); se a predição é falsa a teoria é falsificada; se um número suficientemente grande de predições são verdadeiras, a teoria é confirmada. Por todo seu ataque ao indutivismo, o esquema de Popper não é tão diferente: teoria implica em predição (sentença básica); se a predição é falsa a teoria é falsificada; se um número suficientemente grande de predições são verdadeiras, e certas condições futuras são preenchidas, a teoria é altamente corroborada.)

E Putnam (Ibid., p. 124) dá um alerta: “in a great many important cases, scientific theories do not imply predictions at all” (Trad. livre: na grande maioria dos casos importantes, teorias científicas não implicam absolutamente em predições).

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Fonte:
LUIZ CARLOS SEVERO: “ESTABILIDADE DA CIÊNCIA BIOLÓGICA: Uma epistemologia evolucionista, sem refutações e revoluções”. (Dissertação apresentada à Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Filosofia, para obtenção do Titulo de Mestre em Filosofia.Orientador: Profº Dr. Eduardo Luft). Porto Alegre, 2003.

Nota:
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