Entrevistando Darwin - III

O problema populacional

As “respostas” de Darwin, a seguir, foram todas extraídas do seu livro “A Origem do Homem e a Seleção Sexual”, da tradução para o português de autoria de Attílio Cancian e Eduardo Nunes Fonseca, publicado pela Hemus Editora. São Paulo, 1974.

H.D.:
Mister Darwin, é sabido que a população mundial cresceu de forma assustadora. Calcula-se que no início da Era Cristã, havia cerca de 250 milhões de pessoas em todo o globo; em 1650, esse número aumentou para 500 milhões; em 1850, 1 bilhão; em 1940, 2 bilhões; em 1975, 4 bilhões. Atualmente o número de habitantes na terra já ultrapassa 6 bilhões. O que o senhor tem a dizer sobre esta questão no que concerne à sua sobrevivência?

DARWIN:
“O primeiro e fundamental obstáculo para o contínuo incremento do homem consiste na dificuldade em conseguir meios de subsistência e de vida confortável. Que esta seja a razão, é o que podemos deduzir do que nos é dado ver, por exemplo nos Estados Unidos, onde a sobrevivência é cômoda e fácil e as habitações são em número suficiente. Se tais meios se duplicassem repentinamente na Grã-Bretanha, o nosso número se dobraria rapidamente” (p. 58).

H.D.:
Na sua opinião, que fatores contribuem para contrabalançar o número de pessoas nas nações desenvolvidas e naquelas considerdas subdesenvolvidas?

DARWIN:
“Nas nações civilizadas, este obstáculo basilar age sobretudo pela restrição que se faz ao número dos matrimônios. Muito importante é também o maior número de mortes em idade infantil nas classes pobres; assim como o é também a maior mortalidade em todas as idades, pelas diversas dificuldades e descomodidades, entre os moradores de casas aglomeradas e miseráveis. Os efeitos das graves epidemias e das guerras são subitamente contrabalançados e mais do que balançados nas nações que gozam de condições favoráveis. Também a emigração vem em auxílio como freio temporário, mas nas classes extremamente pobres não está muito difundida” (p. 58).

H.D.:
No que concerne à capacidade de reprodução das populações, o senhor pode apontar um grupo em especial que seja assim mais prolífero ou fecundo?

DARWIN:
“Conforme observou Malthus, existe motivo de se suspeitar que atualmente o poder reprodutivo é menor nas raças sem cultura do que naquelas civilizadas. Nada sabemos de positivo sobre este ponto, visto que não se fez nenhum recenseamento dos selvagens; mas, com a ajuda do testemunho de missionários e de outros que têm residido durante muito tempo no meio destes povos, parece que via de regra as suas famílias são exíguas e só raramente numerosas” (p. 59).

H.D.:
E como exatamente o senhor explica isso?

DARWIN:
“Isto talvez possa ser parcialmente explicado com o fato de que as mulheres aleitam os bebês durante muito tempo; mas é muito provável que os selvagens, que muitas vezes sofrem privações e não têm tantos alimentos nutritivos quanto os povos civilizados, sejam atualmente menos prolíficos. Numa obra anterior fiz ver que todos os quadrúmanos e as aves domésticas e todas as plantas cultivadas são mais férteis do que as espécies correspondentes num estado selvagem. Também não serve de válida objeção a esta hipótese o fato de que os animais nutridos imprevistamente com demasiado alimento ou gorduras em demasia bem como muitíssimas plantas de uma hora para outra transplantadas de um solo muito pobre para um outro muito rico se tornam mais ou menos estéreis. Por isso era de se esperar que os homens civilizados, que num certo sentido são mais "domésticos", fossem mais prolíficos do que os selvagens” (p. 59).

H.D.:
Essa vantagem fecundativa daqueles que o senhor chama de civilizados pode ser explicada com algo mais?

DARWIN:
“É também provável que a aumentada fertilidade das nações civilizadas se torne um caráter hereditário, como acontece com os animais domésticos: pelo menos se sabe que no gênero humano existe nas famílias uma tendência a gerar gêmeos” (p. 59).

H.D.:
Quais fatores limitativos o senhor pode apontar para a redução daqueles a quem o senhor denomina de “selvagens?”

DARWIN:
“A dificuldade que os selvagens têm de conseguir os meios de subsistência limita o seu número de maneira mais direta do que entre os civilizados, visto que todas as tribos sofrem periodicamente de duras carestias. Nestes períodos os selvagens são obrigados a alimentar-se muito mal, do que se ressente a sua saúde; muitas notícias têm sido veiculadas sobre a saliência do estômago e dos membros emagrecidos depois e durante tais carestias. Nesses períodos são também forçados a andar errantes por muito tempo e, conforme me tem sido asseverado na Austrália, grande número dos seus filhos perece. De vez que as carestias são periódicas, dependendo principalmente das estações mais duras, todas as tribos variam de número. Elas não podem aumentar duradoura e continuamente, enquanto não houver aumento artificial nas provisões de alimento. Quando atingidos duramente, os selvagens invadem uns os territórios dos outros, provocando a guerra; mas na realidade quase sempre estão em guerra com os vizinhos. Ficam expos tos a muitos riscos por mar e por terra, em sua procura de alimento e em muitas regiões sofrem muito em virtude do grande número de animais ferozes. Na índia distritos inteiros foram despovoados pelas incursões dos tigres” (p. 60).

H.D.:
Além desses fatores, os quais foram tratado por Thomas Malthus em seu famoso "Tratado sobre os princípios da população", há outros que o senhor pode indicar como relevantes nesse processo?

DARWIN:
“Malthus debateu estes numerosos obstáculos, mas não enfatizou aquele que provavelmente é o mais importante de todos, ou seja o infanticídio, especialmente perpetrado contra os bebês meninas, e o costume de provocar o aborto. Atualmente estas práticas prevalecem em muitas partes do mundo e o infanticídio parece que prevaleceu uma vez em escala ainda mais ampla, conforme demonstrou M'Lennan" (p. 60).

H.D.:
E qual teria sido a origem dessa prática, segundo o senhor?

DARWIN:
“Parece que esta prática se originou dos selvagens que se viam a braços com a dificuldade, ou antes a impossibilidade, de manter todos os filhos nascidos. Aos obstáculos supracitados se pode acrescentar a depravação, mas esta deriva da falta de meios de subsistência, embora haja motivo para se crer que em alguns casos (como no Japão) tenha sido encorajada propositalmente como meio para conter a população” (p. 60).

H.D.:
Algo mais, para finalizar?

DARWIN:
“Em alguns casos, a diminuição da fertilidade poderá ser explicada com a corrupção das mulheres (conforme ultimamente entre os taitianos), mas Fenton demonstrou que esta explicação não é suficiente em nenhum modo para os neozelandeses e os tasmanianos” (p. 224).

É isso!

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