A ideologia da prosperidade

"Proveniente da ideologia norte-americana que apregoa o alcance do sucesso em meio à competitividade inerente ao capitalismo, a “Teologia da Prosperidade” ou “Teologia de Resultados” atende ao requisito das formas de permanência do neoliberalismo na América Latina e, assim sendo, no Brasil. A idéia de ascensão social que se encontra impregnada no ideário da educação escolar, é corroborada pelas instâncias da vertente neopentecostal do protestantismo brasileiro. Para tanto, nem se levanta a possibilidade de passagens bíblicas que questionam o apego às riquezas como incoerente ao estado de ser cristão, e muito menos acredita-se na herança dos pobres em relação à preferência de Deus por esta camada socialmente marginalizada.

A aplicação dessa “teologia” na prática consubstancia-se, ao menos em tese, que o
membro da igreja deve preferir “mandar” do que ter que “obedecer” ao chefe do seu trabalho, e isto só é possível na medida em que a pessoa passa da condição de trabalhadora que recebe salário, para dona de uma indústria ou comércio rentáveis do ponto de vista financeiro. Assim sendo, trabalhar com afinco não é, necessariamente, um valor que integra o neopentecostalismo e, sim, o fato de ganhar dinheiro, por meios licitamente aceitos do ponto de vista do capitalismo.

Identifico a “Teologia da Prosperidade” como recomposição do capitalismo por
meios neoliberais, sendo que a religiosidade protestante já serviu ao favorecimento do desenvolvimento deste sistema econômico desde o seu início, conforme discorre Weber, em estudo que realiza sobre as inter-relações entre países capitalistas desenvolvidos e as fortes influências de uma ética protestante, de valorização dos estudos e da ocupação dos melhores postos de trabalho:

Qualquer observação da estatística ocupacional de um país de composição religiosa
mista traz à luz, com notável freqüência, um fenômeno que já tem provocado repetidas discussões na imprensa e literatura católicas e em congressos católicos na Alemanha: o fato de os líderes do mundo dos negócios e proprietários do capital, assim como dos níveis mais altos da mão-de-obra qualificada, principalmente o pessoal tècnico e comercialmente especializado das modernas emprêsas, serem preponderantemente protestantes. (Weber, 1967:19)

Pelo que Weber aponta, no engendrar do capitalismo, os protestantes concediam
maior grau de relevância para os estudos direcionados ao preparo técnico, enquanto que, os católicos, ao seguirem a tradição escolástica, ainda permaneciam voltados para o aprendizado do conhecimento desinteressado, ou seja, sem a preocupação de transformá-lo em preparação para o trabalho, sendo de cunho clássico e humanístico. Porém, a preocupação dos protestantes do século XVI quanto à valorização dos estudos e do trabalho, visando o alcance de certa riqueza, somente, em parte é apropriada e assimilada pela “Igreja Universal do Reino de Deus” e pela “Igreja Internacional da Graça de Deus”. Quanto à primeira delas, a “IURD”, existe uma valorização maior quanto ao ganho de rendimento do que a igreja fundada por R. R. Soares. Mesmo assim, ambas tomam parte no que se conhece como “Teologia da Prosperidade”.

A apropriação relativa do neopentecostalismo em relação aos valores do
protestantismo histórico, refere-se à importância crucial no ganho de dinheiro por intermédio da ocupação de postos altos no mercado de trabalho, com a preferência da aquisição de seu próprio meio de produção. Todavia, os estudos e o trabalho propriamente dito, enquanto elementos propulsores do capitalismo, parecem não estar em vigor dentro do quadro valorativo do pensamento de Edir Macedo e de R. R. Soares. A escolaridade não é fruto de menção acurada por parte destes neopentecostais e no tange ao trabalho, ele é secundário se comparado às somas de dinheiro a serem ganhas. Por isso, considero que os protestantes históricos faziam valer a lógica do capitalismo a partir de trâmites que a sociedade lhes colocava, quer através do esforço nos estudos, quer por meio do esmero no trabalho. De forma até mesmo oposta a este curso regular seguido em épocas anteriores, há uma sobrenaturalização da posse dos meios de produção, quer dizer, se o membro da igreja não vai bem em seus negócios, não é porque não estudou e trabalhou e, sim, porque existe a crença de que espíritos maus o têm impedido de “prosperar”.

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É isso!


Fonte:
RACHEL SILVEIRA WREGE: “AS IGREJAS NEOPENTECOSTAIS: EDUCAÇÃO E DOUTRINAÇÃO”. (TESE DE DOUTORADO). UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS - FACULDADE DE EDUCAÇÃO. CAMPINAS, 2001.

Nota:
O título e a imagem inseridos no texto não se incluem na referida tese.

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