A idéia de Nietzsche da "vontade de poder"

“Esta idéia do além-do-homem concorda com outra de suas idéias mais significativas, a idéia da vontade de poder. Ele afirma que a vida é vontade de poder. Embora seja difícil dizer exatamente o que significou por esse termo, pode ser descrito como algo que é a base como o ser humano pensa, comporta e atua em todas as circunstâncias. Ele vê que o ser humano está em um esforço constante para extinguir seu próprio desejo. Isto é mostrado no contexto do poder usado para excluir desejos de outros que está em conflito ao seu, o poder que é usado para conseguir o que deseja. Uma coisa viva procura sempre descarregar sua força, não apenas para sobreviver, mas para poder; e este pode resulta r às vezes em comportamento violento, o que é alegado por Nietzsche como intrínseco à natureza dos homens. Entretanto, a maneira da vontade pode ser diferente, construtiva ou destrutiva. Assim, talvez possa se afirmar então que em um além-do-homem a vontade de poder é para influenciar criativamente e dominar os pensamentos de outros, de geração a geração. Nesta maneira, sua existência e poder vive uniformemente depois que morre.

O que é então o que chamamos de nossa “vontade”, a qual Nietzsche era tão ligado? Em outras palavras, é a nossa autonomia, o nosso poder de escolha e de agir, a nossa finalidade e a nossa subjetividade. E isto é o completo oposto do que é passivo, desacoplado da objetividade associado à racionalidade, ou seja, aqueles milênios de contemplações filosóficas sobre um suposto mundo imutável dualista que talvez não tenha atingido no total nada de útil a todos. Nietzsche entende que a prisão ao modelo metafísico por milênios privou a humanidade de viver sua vontade de poder e escreve:

Em quase todos os pontos, os problemas filosóficos são novamente formulados tal como dois mil anos atrás: como pode algo se originar do seu oposto, por exemplo... Já a filosofia histórica… o mais novo dos métodos filosóficos, constatou, em certos casos (e provavelmente chegará ao mesmo resultado em todos eles), que não há opostos. Salvo no exagero habitual da concepção popular ou metafísica e que na base dessa contraposição está um erro da razão. [...] Falta de sentido histórico é o defeito hereditário de todos os filósofos... Não querem aprender que o homem veio a ser… Mas tudo veio a ser; não existem fatos eternos: assim como não existem verdades absolutas
(NIETZSCHE, 2005, p. 15-16).

Diante disso, para o pensador, é imprescindível que o ser humano assuma, em um primeiro momento, uma postura de ruptura com a tradição metafísica de até então. Para que, definitivamente seja “liberto da fantasia transcendente de um além-do-mundo, com a qual ele entorpece a dor de sua finitude, tragédia de sua existência” (GIACOIA, 2000, p. 59). Modelo este, que supostamente ao impor seu sistema de valores, despreza a própria vida aqui e tudo que está ligada a ela e ao que o homem é. Esta negação, portanto, deve ser banida para que seja possível viver a vontade de poder. De outra forma, o homem permanece o “camelo”, sem, contudo, jamais vir a ser “criança”. Na essência da vontade de poder está o desejo pela vida.

Todavia, para que o homem moderno possa corresponder a esse desejo íntimo da vida e se colocar em sintonia com ela, é antes de tudo necessário que tenha se libertado daquele ressentimento que lhe foi inoculado pela tradição metafísica: o desprezo pela vida, pela terra, pelo mundo, pelo corpo, pelo vir-a-ser, por tudo aquilo que foi até agora caluniado em nome do “verdadeiro mundo” (GIACOIA, 2000, p. 59).

Outra postura, também imprescindível, é que o homem assuma, ao mesmo tempo, uma atitude de apropriação. Assim, deve ele apropriar da sua natureza de vontade de poder, a qual criativamente constrói os seus próprios valores.

Para que o homem moderno possa ainda criar para além dele mesmo, é necessário que se aproprie dessa natureza, ou seja, de sua vontade de poder. Somente desse modo poderá realizar aquilo que, por meio dele, constitui o fervoroso desejo da vida: superar-se a si mesma, rompendo a camisa-de-força em que a encerrou a moderna civilização ocidental – a rigidez da autoconservação a qualquer custo
(GIACOIA, 2000, p. 59).

Essa vontade tão destacada na filosofia de Nietzsche é o que distingue o humano de máquinas, de animais reativos e daqueles “escravos” que podem apenas seguir as ordens de outros. É a nossa liberdade, a nossa capacidade de fazer e implementar as nossas próprias escolhas, em outras palavras desenvolver-se. A nossa "vontade" é o nosso poder de fazer tornar -se, de implementar os nossos valores, mesmo diante da adversidade e da oposição. Assim, tem que lutar pela "vontade", pelo controle sobre a própria vida. E nisso reside à causa de conflitos e de progresso, do ódio e do amor. É a causa da 'humanidade' em toda a sua majestade e proibições.

A luta pela existência é apenas uma exceção, uma temporária restrição da vontade de vida; a luta grande e pequena gira sempre em torno da preponderância, de crescimento e expansão, de poder, conforme a vontade de poder, que é justamente vontade de vida
(NIETZSCHE, 2007c, p. 244).

Preservar a nossa vontade é um aspecto essencial do ser humano, de ser capaz de empregar aquelas aptidões humanas superiores, nossa criatividade, nossa imaginação, nossas habilidades. Mas para que fim? Aqui Nietzsche vai focar na criação de valores:

O homem de espécie nobre se sente como aquele que determina valores, ele não tem necessidade de ser abandonado, ele julga: “o que me é prejudicial em si”, sabe-se como o único que empresta honra as coisas, que cria valores. Tudo que conhece de si, ele honra: uma semelhante moral é glorificação de si
(NIETZSCHE, 2006c, p. 156).

Seria isto apenas “auto-glorificação”, como muitos comentadores têm afirmado? Para ampliar, ele usa o termo em relação a si mesmo. Nietzsche não tinha nada, além do desprezo pelos homens de sua época, àqueles fracos humanos “escravos” que negam a sua própria humanidade, que deixam ser intimidado, ser controlados por “mestres”, que esperam pacientemente ser dito o que devem fazer. A idéia aqui é de que as pessoas podem se recusar a assumir qualquer responsabilidade por suas próprias ações, ao mesmo tempo, exigir que outros assumam responsabilidades que por eles são totalmente rejeitadas. Esperar que esses “outros” humanos fortes assum am a responsabilidade, não apenas para os seus próprios comportamentos, mas àqueles que são estranhos também é absurdo, mesmo em princípio. A auto-proclamação de escravos invariavelmente os levam a obter aquilo que eles merecem na opinião de Nietzsche, se eles nunca escolherem a ajudar a si próprios! Nietzsche escreve: “A inclinação a se rebaixar, a deixar-se a roubar, iludir, explorar, poderia ser o pudor de um deus entre os homens” (NIETZSCHE, 2006, p. 62).

No entanto, ele também afirma que todos os seres humanos devem “pensar bem” de si mesmos, eles devem a si mesmos a sua própria liberdade de ação, por que do contrário, eles transferem o seu direito de liberdade simplesmente a outros seres humanos. Certamente isso os torna “escravos”. Sua afirmação da necessidade de uma “reavaliação de todos os valores” então relaciona com os valores contrastantes impostos pelas pessoas de “fora” e entre aqueles que são relevantes para a própria pessoa internamente. Ele vê um grande contraste entre estes dois tipos de valores. O que nós somos como seres humanos são muito diferentes, na opinião de Nietzsche, o que todo o sistema tenta fazer é igualar. Neste sentido, vemos a alegria em que a criativa individualidade que mais tarde veio a ser
proeminente em não religiosos.”

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É isso!


Fonte:
Humberto Duarte de Medeiros: “A visão de Homem em Nietzsche e Paulo”. (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre. Orientador: Prof. Dr. Álvaro Luiz Montenegro Valls). Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS. São Leopoldo – Rio Grande do Sul, 2008.

Nota:

A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese.

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