A "complexidade" em Edgar Morin

O Significado do Termo “complexidade”
"É importante ressaltarmos que para Morin o termo complexidade vai além do que comumente se entende e que aparentemente dá um sentimento de que a complexidade esteja sendo reconhecida, embora não compreendida. Na verdade, o que normalmente designamos como complexo é algo entendido como sinônimo de dificuldade, daquilo que não temos condições de entender, de maneira que “não estamos dando uma explicação, mas sim assinalando uma dificuldade para explicar. Designamos algo que, não podendo realmente explicar, vamos chamar de ‘complexo’“ (MORIN, 1996c, p. 274).

Contudo o termo ‘complexo’ não deve ser compreendido como sinônimo de dificuldade, mas entendido como termo que abrange vários elementos que são membros e participantes do todo, como ele afirma “complexus – o tecido que junta o todo” (MORIN, 1997d, p. 15). Elementos estes que são complementares e que por isto precisam ser compreendidos em suas inter-relações. Por esta razão, em sua Filosofia da Complexidade Morin busca fazer uma relação entre os diversos saberes, conceitos, buscando não cair numa análise reducionista, pertencente ao Paradigma da Simplificação por ele rechaçado.

Se por um lado, Morin não possui a ‘paternidade’ do termo, de outro seria

imperativo creditar a Edgar Morin o papel do grande artesão do pensamento complexo e da idéia de complexidade. Caminhando transversalmente sobre os domínios da biologia, da física, da teoria da informação, da filosofia, das ciências da cognição, entre outros domínios, esse pensador errático tem-se posto a prefigurar as possibilidades de um conhecimento verdadeiramente transdisciplinar (CASTRO, 1997, p. 30).

De um início, digamos tímido no uso do termo, Morin passou a, posteriormente, no desenvolvimento do seu pensamento, tê-lo como elemento chave de sua filosofia. Sobre isto faz a seguinte afirmação

desde os meus primeiros livros, confrontei-me com a complexidade, que se tornou o denominador comum de tantos trabalhos diversos que a muitos pareceram dispersos. Mas a própria palavra complexidade não me vinha ao espírito, foi preciso aguardar os finais dos anos 60 para que ela surgisse veiculada pela teoria da informação, pela cibernética, pela teoria dos sistemas, pelo conceito de auto-organização e para que emergisse sob a minha caneta, ou antes, sobre o meu teclado (MORIN, 1990, p. 10).

De periférica no seu pensamento, a complexidade passou a ser o centro de seu propósito, compreendendo-a como atitude de religar, rejuntar; e “antes de ser uma teoria, um paradigma, um modelo para pensar a matéria, a vida e o homem, é mais propriamente um atributo de toda a matéria” (ALMEIDA, 1997, p. 31), de maneira que “o homem, a sociedade, o meio ambiente, os sistemas de idéias interagem entre si, por meios de trocas, porque são sistemas abertos” (ALMEIDA, 1997, p. 31).

O termo complexidade desencadeia, em alguns momentos, duas ilusões que desviam as reflexões sobre um pensamento desta natureza. Segundo Morin, a primeira idéia é acreditar que a complexidade elimina a simplicidade. Na verdade, a complexidade surge na brecha da simplicidade. Naquilo que o pensamento simplificador não dá conta, a complexidade surge e

Enquanto o pensamento simplificador desintegra a complexidade do real, o pensamento complexo integra o mais possível os modos simplificadores de pensar, mas recusa as conseqüências mutiladoras, redutoras unidimensionais e, finalmente, ilusórias de uma simplificação que se toma pelo reflexo do que há de real na realidade (MORIN, 1990, p. 9).

O pensamento complexo não promoveria um mero abandono do pensamento simplificador, mas algo muito mais compensador: sua superação.

A segunda ilusão é confundir a complexidade com completude. Ainda que almeje o conhecimento multidimensional, o pensamento complexo sabe que “o conhecimento completo é impossível: um dos axiomas da complexidade é a impossibilidade, mesmo em uma teoria, de uma omnisciência” (MORIN, 1990, p. 9), de maneira que reconhece sua incompletude. Assim, Morin (1997b, p. 266) afirma que a complexidade “não é tudo, não é a totalidade do real, mas é o que melhor pode, ao mesmo tempo, se abrir ao inteligível e revelar o inexplicável”, numa tentativa de religar o que o pensamento guiado pelo Paradigma da Simplificação disjuntou.

O Paradigma da Complexidade
Retornando ao uso de simbolismos, Morin apresenta o pensamento da complexidade como um edifício de muitos andares, sendo suas bases formadas a partir das teorias da informação, cibernética e sistema. No segundo andar estão as idéias de Von Neumann, Von Foerster e Prigogine sobre o que chama de auto-organização.

Assim como o Paradigma da Simplificação possui seus elementos de inteligibilidade, também os tem o Paradigma da Complexidade, os quais Morin notadamente apresenta: princípio dialógico, princípio de recursão e o princípio hologramático. O Paradigma da Complexidade seria então o “conjunto dos princípios de inteligibilidade que, ligados uns aos outros poderiam determinar as condições de uma visão complexa do universo (físico, biológico e antropossocial)” (MORIN, 1998b, p. 330).

O princípio dialógico permite unir dois princípios ou noções antagônicas que aparentemente não têm nenhum elo de ligação entre si, “que deveriam se repelir simultaneamente, mas são indissociáveis e indispensáveis para a compreensão da mesma realidade” (MORIN, 2000a, p. 204). Efetua-se deste modo uma “associação complexa (complementar, concorrente e antagônica) de instâncias necessárias junto à existência, ao funcionamento e ao desenvolvimento de um fenômeno organizado” (MORIN, 1997b, p. 201).

O princípio da recursão “é um círculo gerador no qual os produtos e os efeitos são eles próprios produtores e causadores daquilo que o produz” (MORIN, 2000a, p. 204). E finalmente, o princípio hologramático que coloca “em evidência esse aparente paradoxo de certos sistemas nos quais não somente a parte está no todo mas o todo está na parte” (MORIN, 2000a, p. 204).

Observa-se de forma clara a diferença entre os elementos do pensamento complexo e os princípios de explicação pertencentes à visão clássica de Ciência. Diferente desses princípios que possibilitam uma visão mutiladora e limitadora, os princípios do pensamento complexo tornam possível pensar nos conceitos sem nunca dá-los por concluídos, evitando sua prisão em compartimentos estanques; objetiva-se apresentar condições de (r)estabelecer as articulações entre os diversos saberes, até mesmo entre aqueles que se rechaçam, construindo um conhecimento não cristalizado; propondo-se ainda a buscar a compreensão dos diversos elementos constituintes de um fenômeno e o dinamismo no qual está inserido.

O pensamento complexo indicaria caminhos para a ampliação do saber, evitando a mutilação do conhecimento, estimulando a produção do conhecimento, a interpretação das ambigüidades, o caráter de multidimensionalidade do real."

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É isso!


Fonte:
MARIA DA CONCEIÇÃO DE MELO AMORIM: “O HUMANO EM EDGAR MORIN: CONTRIBUIÇÕES PARA A COMPREENSÃO DA INTEGRALIDADE NA REFLEXÃO PEDAGÓGICA”. (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação. Orientador: Prof. Dr. Ferdinand Röhr). Universidade Federal de Pernambuco. Recife, 2003.

Nota:
O título e a imagem inseridos no texto não se incluem na referida tese.
As referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.

Um comentário:

  1. O que posso dizer: __Obrigado, pela excelente oportunidade de conhecer um pouco mais sobre Morin.
    Prof. Dr. Plinio Sabino Sélis.

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