O significado e a arrecadação do dinheiro no “reino” de Macedo

“Ari Pedro Oro afirma que:

se historicamente o dinheiro foi sempre percebido como algo impuro, até certo ponto enquanto cristianização do mal e dos vícios, hoje, no neopentecostalismo, ele assume um sentido positivo, enquanto símbolo que realiza uma mediação privilegiada com o sagrado (...) trata-se de um símbolo que recebe uma graduação de acordo com a lógica econômica”
onde “não apenas ofertar, dar dinheiro para receber benefícios esperados, mas, antes de o ofertar segundo parâmetros quantitativos onde prevalece a crença de que dando mais, mais chances desfruta de alcançar a graça, cuja grandeza depende, inclusive, do valor ofertado.

Ainda segundo o autor, o uso do dinheiro não é exclusividade do neopentecostalismo, pois, todas as religiões oficiais ou populares, especialmente no mundo capitalista, não se desinteressaram pelo usufruto do dinheiro. E isso é verdade. O que chama a atenção na Igreja Universal, não é o uso do dinheiro, mas, as práticas ou estratégias usadas pelos bispos/pastores para o coletarem e, principalmente, o avolumamento das importâncias que circulam diariamente nos templos iurdianos.

Uma das maneiras de mostrar como o dinheiro é apreciado e valorizado na vida daqueles que compõe a membresia iurdiana, é mostrar que enquanto a Igreja Católica, por exemplo, realça que os fies terão uma vida “paradisíaca no além”, a Igreja Universal garante com veemência que Deus agraciará a Seus fiéis aqui na terra, derramando-lhes “bênçãos sem medidas”, oportunizando-lhes assim, uma vida próspera, com saúde física e financeira abundante, pois, aponta Macedo que
Deus criou o homem para que ele vivesse vida abundante e, nos reserva o direito de ser preenchidos em nós os três aspectos da vida humana que podem fazê-la feliz: espiritual, físico e financeiro aqui na terra e não em outro lugar que é, segundo Edir Macedo, distante da realidade do cristão.


Excessivamente falado, almejado e cobiçado, qual seria o significado do dinheiro para os fiéis da Igreja Universal? Quem responde é o próprio Edir Macedo:
o sangue está para o corpo humano na mesma proporção que o dinheiro está para a Obra de Deus. Seria o “sangue da igreja” . Convencidos disso, os fiéis da Igreja Universal não acolhem com bons olhos e nem crêem na possibilidade de que estejam sendo desapossados pelos bispos/pastores, que estariam extorquindo seus rendimentos salariais, apesar de 69% dos 100 inquiridos em Maputo terem dito não saber quem decidia sobre o destino dos recursos financeiros angariados.

Também em Maputo, 83% dos inquiridos assinalaram que o dinheiro arrecadado era usado para o pagamento de contas (água, luz, telefone e aluguel); 67% apontaram que serviria para a construção de novos templos. Isto mostra-nos como o discurso da Igreja Universal é “eficiente”, já que os bispos/pastores comumente insistem em dizer que o dinheiro arrecadado destina-se aos mesmos fins acima mencionados e, os fiéis “reproduzem” ou apenas “repetem” esses dizeres sem questionarem de fato o real uso e sem mencionarem que dessas arrecadações é que são retirados os salários dos bispos/pastores. Como estes não fazem menção a seus proventos, pressupomos que a membresia também não se refere aos salários porque estes não são citados por eles. Apenas oito das 100 pessoas entrevistadas em Maputo apontaram para “
salários de bispos e pastores” como sendo um dos destinos das altas cifras arrecadadas; e somente dois homens e uma mulher disseram que quem dava rumos as arrecadações na igreja era uma comissão formada por bispos e pastores.

Que a Igreja Universal não preste contas para a comunidade que compõe a sua membresia, não nos cria espanto nem estranheza, até porque outras congregações religiosas também não o fazem, como não o faz a Igreja Católica, por exemplo. Segundo Natal Furucho,
a administração do dizimo cabe exclusivamente à igreja e os sacerdotes responsáveis por ela é que devem definir onde e quando utiliza-lo. O que nos chama a atenção, neste caso, é o desinteresse da membresia iurdiana no que tange ao paradeiro dado as suas “valorosas” contribuições, ditas para as “obras de Deus”.

A nosso ver, a explicação cabível para este caso é a de Ari Pedro Oro, já mencionada, segundo a qual os fiéis ofertam na lógica do sacrifício e não na da compra e consideram normal o gasto com o sagrado e o sobrenatural. Segundo Ari Pedro Oro e Pablo Semán, afirmam que
o dinheiro é percebido como uma espécie sagrada nos espaços de troca ritual, coletivo, e massmediatizado, e não somente como um meio de compra, com o uso de exploração, de acordo com uma perspectiva externa. Paulo Bonfatti assegura-nos que na Igreja Universal, o dinheiro adquire funções e qualidades diferentes para os seus freqüentadores, haja vista que quando inserido num ritual ele se reveste de outra conotação, ganha outro sentido, perdendo a importância monetária da moeda 353, assim sendo, o dinheiro continua sendo moeda, porém, passa a assumir conotações simbólicas distintas exclusivamente de compra e venda; ou seja, adquire um simbolismo de um canal de comunicação com Deus, num universo em que nada é dado ou recebido gratuitamente.

Nesse intuito, Natal Furucho diz que

espiritualmente o valor do dizimo transcende o valor literal, pois significa salvação de almas, sendo o principal agente provedor das condições necessárias para que os homens de Deuspossam anunciar nos quatro cantos da Terra as Boas Novas, o evangelho da salvação
.

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É isso!

Fonte:
DOWYVAN GABRIEL GASPAR É DANDO QUE SE RECEBE”: A IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS E O NEGÓCIO DA FÉ EM MOÇAMBIQUE” (Dissertação apresentada junto ao Programa de Pós-Graduação do Departamento de História da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia como pré-requisito parcial para a obtenção do Grau de Mestre em História Social. ORIENTADOR: PROF. DR. VALDEMIR DONIZETTE ZAMPARONI). Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2006 .

Nota:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese.
As referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.

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