Surgimento biológico da vida humana

"Atualmente tem-se que, os progressos científicos avançam num ritmo muito mais acelerado que as ciências jurídicas, causando impacto nas normas e nos conceitos anteriormente simplificados. Até bem pouco tempo, os conflitos em torno do nascituro, não passavam de meros questionamentos doutrinários. Hoje considerá-lo pessoa ou não, e principalmente, definir o momento em que lhe são configurados esses direitos é matéria mais que necessária, porque dessa definição dependerá a ciência para designar quais rumos a biologia moderna legalmente percorrerá, sem assim, tornar suas práticas afrontosas à dignidade e a vida humana.

EMBRIÃO HUMANO

Definição
A definição universal de embrião tem sido uma tarefa difícil para as ciências exatas e, em termos filosóficos, é impossível.

Embrião deriva do grego embryon e significa “qualquer coisa que começa, princípio, aquilo que se apresenta primordialmente em estado indefinido ou confuso” ou, simplesmente, o desenvolvimento humano durante os primeiros estágios de desenvolvimento, mais concretamente até ao final da sétima semana de gestação, passando a partir dessa altura a designar-se por feto.

A professora Maria Celeste Cordeiro Leite Santos define como embrião “...o fruto da concepção no período de tempo entre a fecundação e o fim da oitava semana de desenvolvimento...” e “A Comissão Warnock considerou uma fase embrionária a que se refere às seis semanas imediatamente sucessivas à fecundação. Alguns adotaram o termo “pré-embrião´ para os primeiros quatorze dias de desenvolvimento após a fecundação.”

Quanto a esta definição de embrião, forçoso ainda salientar que a Associação Médica Britânica constituiu a chamada Comissão Peel (Peel Comittee Repori of the panel on human artificial insemination), que publicou o Relatório Mary Warnock , cujo § 11.9, “...reconhece o zigoto como parte de um processo de crescimento do embrião. Uma vez iniciado o processo de reprodução não existe um estágio mais importante do que outro. Todos são partes de um processo contínuo...”.

Visão biológica
Do ponto de vista biológico, não há consenso quanto ao conceito de embrião. Em termos genéticos pode dizer-se que, a partir do momento em que há fecundação, esse patrimônio único e o sexo do ser que daí se vai desenvolver estão definidos e são, consequentemente, passíveis de qualquer estudo genético.

Manifestando um ponto de vista estritamente médico, há quem defenda que “uma vez ocorrida a concepção, começou a existência de uma vida humana individual, que é um contínuo progressivo permanente, até que a morte natural ou artificial ocorra”, enquanto outros autores há que, fazendo a ponte entre a genética e a filosofia, afirmam que a vida humana tem início na fertilização.

Visão ontológica
Durante cerca de 2000 anos, os ensinamentos de Aristóteles serviram de base para o entendimento da origem do ser humano individual.

Aristóteles pensava haver uma resposta científica direta quanto à questão do desenvolvimento no feto, de vários tipos de alma ou vida, considerando a vida racional exclusiva dos humanos. Assim, atribuía ao embrião recém-formado um tipo de vida apenas vegetal (alma vegetativa), que passaria a animal (alma sensitiva) para, apenas aos 40 e 90 dias, consoante fosse de homem ou de mulher, o feto ser capaz de adquirir vida racional ou mental. Para Aristóteles, a alma racional só se uniria ao embrião, se e quando esse adquirisse um aspecto humano.

Na Idade Média, Santo Agostinho retomou a questão anterior numa abordagem já claramente cristã, mas apenas para fazer a distinção entre feto animado e não animado; aproveitou, em certa medida, a filosofia Aristotélica, com a diferença de que os seus pressupostos, em vez de empíricos, eram baseados especificamente na idéia religiosa de alma imortal e salva pela fé.

Nesta linha de pensamento, a Igreja Católica tem uma posição inequívoca - a vida (ou alma) do ser humano provém de Deus e a vida humana é sagrada desde o seu início até a morte.

Visão filosófica
A questão mais delicada quanto ao tema em termos filosóficos, é a da definição de “vida humana”. Se, por norma, os problemas éticos relativos ao embrião humano surgem quando se quer definir exatamente o momento em que se inicia a vida humana, para alguns autores será necessário entender “vida humana” no sentido de “vida pessoal”, enquanto outros questionarão ainda “Que ser é o embrião humano?”. Segundo Mary Warnock, talvez um modo de simplificar toda esta questão do início de vida humana ou de pessoa fosse estimar em que estágio de desenvolvimento do embrião este adquire o estatuto de “moralmente” significativo ou, dito de outro modo, a partir de que altura é que se deve começar a tratar um embrião com o mesmo respeito com que se trata qualquer outro ser humano.

H. Tristam Engelhardt Jr. assume uma posição oposta à da Igreja Católica, considerando frontalmente que o embrião não é pessoa desde o momento da concepção e distingue ainda dois conceitos que são, habitualmente, tomados como sinônimos: ser humano e pessoa. Afirmando que “somente as pessoas escrevem ou lêem livros de filosofia”, pensa que para um ente ser considerado pessoa, tem de ser consciente, racional, livre, autônomo e responsável.

Além destas duas posições basicamente opostas sobre o embrião, há outras intermédias, que valorizam o “potencial”, ou o de “pessoa potencial”. Segundo Paul Ricoeur, a expressão “pessoa potencial”, como resposta à clássica questão de “O que é um embrião? permite “escapar ao caráter dicotômico das considerações ético-ontológicas” o que, em linguagem simples, significa apenas que o embrião não é pessoa nem coisa. Desta noção de pessoa potencial pode inferir-se que o embrião não é pessoa - durante as primeiras semanas do seu desenvolvimento não possui sensibilidade, consciência, nem relação com o meio exterior, só à medida que a embriogênese se vai processando é que aquele ser humano vai adquirindo as condições biológicas e ambientais que lhe permitam vir a ser pessoa; por outro lado, o embrião não pode ser reduzido a coisa, pois tem origem humana e tornar-se-á pessoa, se para isso tiver condições favoráveis. A posição de que o embrião deve ser respeitado como pessoa e ser humano potencial desde o momento da concepção foi também adotada pelo Comité Consultatif National d’Éthique pour les Sciences de la Vie et de la Santé francês, que definiu pessoa como “o único animal que se recorda do seu avô”.

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É isso!


Fonte:
EDILSON FREIRE DA SILVA: “VIDA HUMANA E O CRIME DE ABORTAMENTO” (Dissertação apresentada à banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito na área de Relações Sociais, sob a orientação da Profª Drª Maria Celeste Cordeiro Leite Santos). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2010.

Nota:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese.
As referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.

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