A revolução cubana, Fidel Castro e a busca de um projeto hegemônico


A revolução cubana, Fidel Castro e a busca de um projeto hegemônico

O Exército Rebelde liderado pelo comandante Fidel Castro chegou a Havana no dia oito de janeiro de 1959. A sua marcha até a capital de Cuba se inicia no dia três de janeiro. A demora em chegar ao seu destino, no entanto, não se deveu à resistência da ditadura de Fulgêncio Batista; que havia fugido da ilha às pressas com sua família na madrugada de 1º de janeiro, nem tão pouco dos que o apoiavam e ficaram para negociar a derrota. A razão foi mais inusitada: A marcha a Havana era interrompida por multidões que queriam festejar a coluna e ver pessoalmente o líder Fidel Castro, o que dificultava o seu avanço. O que comprova a popularidade do Exército Rebelde e de seu comandante (C.f. Nuñez Jiménez, 1982).

Ora, o apoio popular ao Exército Rebelde era naquele momento inquestionável. A rádio rebelde - que talvez tenha sido o principal instrumento da guerrilha - era escutada em toda a ilha. A rádio noticiava a vitória da guerrilha e a iminente chegada de Fidel Castro e da sua coluna a Havana. O governo do ditador Batista, por sua vez, estava completamente desgastado. Havia poucos setores da população que ainda o apoiavam em Cuba e é precisamente por isso que a ditadura de Batista se desmoronou sem que houvesse qualquer combate militar na capital do país. Na realidade, nem os Estados Unidos da América ou qualquer outra nação demonstra qualquer resistência à queda do governo Batista em 1959. No museo de la revolución em Havana se pode verificar o modesto equipamento militar com que o Exército Rebelde fez a revolução cubana de 1959. O que corrobora a tese de que o Departamento de Estado dos Estados Unidos da América não avaliou que a queda da ditadura de Batista pela revolução poderia ser uma ameaça relevante aos seus interesses em Cuba, nem tampouco, a posterior ressonância da revolução em toda América Latina e, muito menos, a possibilidade da ilha se tornar um aliado da União Soviética em “seu próprio quintal”.

Os Estados Unidos da América não intervieram naquele momento porque não acreditavam nas possibilidades da revolução cubana e do seu quase desarmado Exército Rebelde vir a se tornar capaz de fazer resistência à sólida política norte-americana na ilha. Ademais eles não viam o líder dos rebeldes, Fidel Castro, como um radical de esquerda, por ele ser filho de grandes proprietários rurais cubanos e por nunca ter, até então, se aproximado do partido comunista cubano (antigo PSP) além de não manter quaisquer relações com a União Soviética e, até por isso, os rebeldes contavam com pouco arsenal bélico durante a guerrilha. O único partido ao qual Fidel Castro havia sido filiado era o Partido Ortodoxo Cubano que era visto como um partido populista moderado como tantos outros na América Latina. Desta forma a inteligência norte-americana acreditava que com diplomacia tudo seria contornado e que não seria assim necessária uma intervenção direta de Washington.

O PSP, Partido Socialista Popular, (sigla que o partido comunista cubano passou a utilizar, segundo seus próprios militantes, devido ao profundo sentimento anticomunista na ilha) não apoiou ao exército rebelde e sua ofensiva insurrecional até 1958, prestes à queda de Fulgêncio Batista e somente quando já havia uma convergência nacional junto à revolução. Nesse sentido, Pérez-Stable (1993, p.124) afirma:

Sin embargo, los comunistas, al igual que la oposición moderada, sólo alentaron la rebelión armada cuando prácticamente no existian otras formas de enfrentamiento a Batista.

Acreditava-se então que a revolução cubana de 1959 era mais um movimento com faceta populista-reformista e que, ao chegar ao poder seria facilmente contornado ou subornado, assim como em tantos outros momentos em Cuba e na América Latina. As rebeliões na América Latina e no Caribe eram encaradas como pequenos “abalos de terra” que ocorriam sistematicamente em um ponto ou outro na região, o governo norte-americano, utilizou a diplomacia primeiramente, como lhe era de praxe, para conter esses movimentos “sísmicos” tão comuns, contudo previsíveis e contornáveis.

O próprio suceder dos acontecimentos no início de 1959, com a aprovação do Pacto de Caracas pela guerrilha dava a impressão que o governo revolucionário seria moderado e integraria todos os grupos e movimentos que se opunham a Batista. O Pacto de Caracas assinado em 20 de julho de 1958 estabeleceu como estratégia três pontos: o primeiro seria a unidade e luta para derrocar a ditadura de Batista, o segundo criar um governo provisório e em terceiro realizar um programa mínimo que garantisse castigo aos culpados, restabelecesse a paz, a liberdade, o cumprimento dos compromissos internacionais e o progresso econômico da nação.1 Conjuntamente com a aprovação do Pacto de Caracas foi nomeado o moderado Manuel Urrutia a presidente do Governo Provisório (que inclusive lhe deu amplos poderes para escolher o Primeiro – Ministro e o restante do gabinete) o que levaram aos Estados Unidos da América a acreditar que a revolução de 1959 não era mais que uma convergência cívica contra a ditadura de Fulgêncio Batista. E devido a essas proposições decidiu não intervir diretamente. Mesmo que o governo norte-americano houvesse apoiado a ditadura de Batista, não encontrava necessidade da permanência de um governo tão impopular. Contudo desde os primeiros dias do Governo Provisório podia-se notar que Fidel Castro e o Exército Rebelde não se contentariam com tão pouco como supunham os seus futuros adversários. Fidel Castro não assume o poder que ele e o Exército Rebelde conquistaram. Aceita todas as imposições do Pacto de Caracas, mas mantém o poder militar e passa desde logo a articular uma nova etapa para a revolução:

Fidel Castro não se sentia seguro quanto à lealdade de seu movimento, particularmente com relação ao setor que ele qualificava como a ala burguesa de direita. A principal base de apoio político de Fidel era o Ejército Rebelde, cegamente leal. Porém, o “Ejército Rebelde”, composto basicamente por camponeses em sua maioria analfabetos, não poderia fornecer administradores em nenhum nível, muito menos em nível ministerial. Por este motivo, Fidel Castro, desde as primeiras semanas em Havana procurou estabelecer contatos e aproximar-se dos comunistas do Partido Socialista Popular. (Máo Júnior, 2007, p. 322).

Desta forma a decisão de não participar e tampouco indicar nomes de seus companheiros para o gabinete ministerial do governo provisório, deixa em evidência que esse não era o governo em que Fidel Castro e o Movimento 26 de Julho apostavam. De fato, acreditamos que ele trabalhava a idéia de construir uma alternativa ao governo de Manuel Urrutia, que não tinha apoio popular, e preparava pacientemente a conjuntura ideal para uma sucessão de poder. Desta forma o governo provisório foi visto apenas como mais uma etapa da consolidação institucional, constitucional e diplomática do processo revolucionário cubano. Enfim, os principais lideres revolucionários: Fidel Castro, Ernesto Che Guevara, Raúl Castro entre outros, preparavam-se e, ao mesmo tempo, construíam as condições necessárias para se estabelecer; de fato a revolução que, para eles estava inacabada e, diferentemente do que pensava a inteligência norte-americana, não se restringiria à queda da ditadura de Fulgêncio Batista.

Sintonizado com o ponto de vista da historiografia comunista próxima ao PSP cubano, Máo Júnior (2007), afiançado na posição de Carlos Rafael Rodríguez (1983), que era um dos principais dirigente do PSP, a aproximação de Fidel Castro ao PSP devia-se exclusivamente a um único fator: Fidel Castro não tinha quadros para dar prosseguimento à revolução cubana. O que é contraditório. Ora, por um lado havia um Exército exemplar na luta e que mesmo sem o apoio do PSP e da União Soviética, conduziram à derrubada da ditadura de Batista. Mas, ao mesmo tempo, esse exército formado por camponeses analfabetos seria incapaz de assumir a dura vida burocrática ministerial. Já os quadros urbanos do Movimento 26 de Julho seriam todos, segundo o autor, vistos por Fidel Castro como a ala da burguesia de direita do movimento revolucionário2. Desta forma, para Máo Júnior (2007), Fidel Castro necessitava de quadros preparados e foi à busca dos militantes do PSP. Ora não há dúvida de que Fidel Castro tenha tido no Exército Rebelde e em seus comandantes: Ernesto Che Guevara, Raúl Castro, Camilo Cienfuegos entre outros, a principal base de apoio dentro do Movimento 26 de Julho e da revolução. Ademais havia de fato a divergência interna dentro do Movimento 26 de Julho: entre o Exército Rebelde da “Sierra Maestra” e os setores urbanos, chamados de “Llano” (planície). Mas a partir daqui é preciso ampliar a análise e não ficar preso a uma suposta falta de quadros.

O principal conflito dentro do Movimento 26 de Julho era tático: guerrilha urbana ou rural; qual seria mais viável para a queda da ditadura Batista. Porém como um todo o Movimento 26 de Julho era “fidelista”, e essa liderança estava acima da disputa interna. Já o PSP foi, a princípio, contra o movimento como um todo e condenava ambas opções: a do campo, que eles acusavam de maoísta, e a urbana que eles viam como golpista. Segundo Máo Júnior após o fracasso da greve de abril, em 1958, se acentuaram as divergências. E diante destas divergências internas, “a estrutura clandestina do PSP havia se tornado, aos olhos de Fidel, mais confiável do que o setor urbano do Movimento 26 de Julho (MÁO JÚNIOR, 2007, p. 323).

Nessa afirmação de Máo Júnior (2007) há, evidentemente, uma tentativa de legitimação histórica e política. Entretanto, o Movimento 26 de Julho surgiu após o fracasso do assalto ao quartel Moncada, liderado por Fidel Castro em 26 de julho de 1953; não seria pelo fracasso da greve geral 1958 que os “Llanos” cairiam em desgraça na visão do líder. Divergências internas havia, e o resultado da greve geral fortaleceu a tese da luta armada no interior de Cuba como a melhor tática, e deu mostras a Fidel Castro de que era preciso ampliar o apoio ao Movimento 26 de Julho nas grandes cidades. Mas isso não significa que o PSP passava a ser tão ou mais importante que o setor urbano do Movimento. Deve-se ressaltar que o PSP, fiel à orientação política do Partido Comunista da União Soviética, acusou os integrantes do grupo que participaram do assalto ao quartel Moncada, sob a liderança de Fidel Castro, de golpistas e aventureiros, além de excluir de suas fileiras os militantes da Juventude Comunista que haviam participado direta ou indiretamente da operação; entre eles inclusive, estava Raúl Castro.

O PSP foi até o ano de 1958 um ferrenho adversário do Movimento 26 de Julho como um todo, e não somente dos “Llanos”. Não era admissível para um partido marxista-leninista ortodoxo aceitar um movimento que não se definia ideologicamente e que era sustentado apenas na convergência insurrecional contra uma ditadura. Além disso, o Movimento 26 de Julho teve posições e militantes que eram adversários da hegemonia soviética como alguns maoístas, trotskistas, nacionalistas etc. Fidel Castro, enquanto líder do movimento foi o principal responsável pela recusa do debate ideológico e pela proposta de convergência nacional. A posição de Fidel Castro tinha um objetivo preciso: defender um movimento amplo e evitar que os conflitos ideológicos pudessem causar fissuras internas e para isso se referenciava apenas em José Martí e na tradição da luta nacional-independentista de Cuba. O que não quer dizer que Fidel Castro não defendesse que taticamente a luta armada travada pelo Exército Rebelde em Sierra Maestra era mais eficaz do que as ações nas cidades; no entanto, não deixou de dar apoio aos “Llanos” e sempre cumpriu o papel de líder para sedimentar o grupo. Outro ponto importante é que após a morte de Frank Pais e do fracasso da greve geral em 1958 os “Llanos” haviam reconhecido a hegemonia da Sierra na luta armada em Cuba e seus principais líderes inclusive se tornaram combatentes e comandantes do Exército Rebelde; aliás, não foram poucos os que acabaram mortos antes do triunfo da revolução. No entanto a militância urbana do Movimento 26 de Julho, sobretudo em Santiago de Cuba e Havana, mantinha a característica de ser composta em sua ampla maioria de anticomunistas e anti-soviéticos e é por isso de fato que eram considerados pelo PSP como a “ala burguesa” do Movimento 26 de Julho.

Fidel Castro, por sua vez, aproveitando o entusiasmo da população cubana e o seu carisma de líder revolucionário, evitava bater-se com quem poderia ser um futuro aliado. Portanto, a aproximação ao PSP e suas organizações significaria atrair mais forças para uma nova etapa da revolução e não obedeceria à necessidade de quadros bem preparados para compor um futuro governo. Tampouco se deveria à desconfiança nos quadros urbanos do Movimento 26 de Julho, embora seja plausível acreditar que Fidel Castro entre outros lideres de Sierra Maestra desconfiassem dos “Llanos”, isso certamente não significaria que eles confiassem mais no PSP do que no setor urbano do Movimento 26 de Julho. Enfim, o Exercito Rebelde controlava o interior de Cuba, mas precisava de mais suporte em Havana e procurou o PSP entre outros grupos para consolidar a revolução na capital da ilha.

Os principais líderes revolucionários sabiam que deviam obter apoio de todos os setores à esquerda e de quem mais pudesse para a nova fase da revolução. A única forma de poder da qual Fidel Castro acertadamente não abriu mão naquele primeiro momento era o controle absoluto do Exército Rebelde, que ao incorporar o Exército regular se tornara a maior força militar da ilha. O PSP por sua vez tinha pretensões de ocupar cargos burocráticos no futuro governo e isso não era um problema para os líderes revolucionários que haviam desprezado os cargos ministeriais do Governo Provisório.

Nas grandes cidades e em especial em Havana, era impossível evitar o choque ideológico entre o PSP e o Movimento 26 de Julho em meio à luta revolucionária. Eles precisavam travar o debate ideológico e o fizeram com a máxima energia possível, por meio de jornais, nas universidades, nos sindicatos, entre outros fóruns que a vida urbana favorece. Os debates teóricos entre os dois grupos eram muitos: a propósito do humanismo, do socialismo, do futuro de Cuba, da alternativa de guerrilha, etc. Estes debates, em pouco tempo, levaram os militantes do Movimento 26 de Julho e do PSP em Havana a ressentimentos irreconciliáveis. Desta forma, no momento em que Fidel Castro achou conveniente dialogar com o PSP, ele pôde, juntamente com Che Guevara e Raúl Castro – este último, mesmo tendo sido expulso, não escondia sua admiração pelo partido, por seus quadros e pela política do Kremlin – e outros integrantes do Exército Rebelde, ignorar as mágoas do núcleo urbano do movimento. O pragmatismo de Fidel Castro e do marxismo ortodoxo do partido próximo a Moscou, foi o cimento para a consolidação da união entre esses adversários históricos. No entanto, as principais lideranças do grupo urbano do Movimento 26 de Julho como Carlos Franqui e Huber Matos entre outros nunca aceitaram essa aliança.

Assim, desde o inicio do governo provisório de 1959 os debates entre o Movimento 26 de Julho e o PSP estiveram no centro das lutas internas em curso na revolução. O primeiro palco foi a reorganização sindical da CTC - Central dos Trabalhadores Cubanos - que antes da revolução era controlada pelo chamado grupo Mujalista, liderado por Eusébio Mujal, que colaborou diretamente com a ditadura de Batista. Mujal, juntamente com a maioria da direção do sindicato, foge da ilha com temor da justiça revolucionária. Na reorganização da CTC, o Movimento 26 de Julho garantiu a maioria da executiva, mas não conseguiu impedir a presença do PSP e até mesmo de antigos colaboradores de Eusébio Mujal. A esse respeito, Pérez-Stable (1993, p. 120) pondera que

Los líderes sindicales del Movimiento 26 de Julio tomaron el control del ejecutivo, el PSP asumió muchas de las posiciones en la base y algunos dirigentes mujalistas mantuvieron sus posiciones en diversas secciones locales. Sin embargo, los del Movimiento 26 de Julio eran geralmente más jóvenes y menos experimentados que el resto; también eran menos numerosos y no alcanzaban para cubrir todos los puestos que quedaban, por lo tanto comunistas e mujalistas cubrieron ese vacío.

A principal meta da revolução era a desestruturação da hierarquia mujalista, mas os embates entre o Movimento 26 de Julho e o PSP acabaram por desfocar esse objetivo. A contradição era tão grande que ainda em fevereiro de 1959, o Movimento 26 de Julho aliou-se aos quadros sindicais que pertenciam ao Directorio Revolucionario Estudiantil (DRE) na luta contra o PSP e o expulsaram do Comitê Executivo da Central de Trabalhadores Cubanos (CTC). Mas, a experiência dos quadros do PSP, a continuidade dos mujalistas e a impossibilidade numérica do Movimento 26 de Julho de cobrir toda a demanda na base mantêm a luta sindical acesa. A disputa era sectária: o Movimento 26 de Julho pretendia eliminar a influência do PSP no movimento sindical:

Desde el momento en que Fidel Castro proclamo que la ideologia de la revolución no era ni capitalista ni socialista, sino “humanista”, los dirigentes sindicales del Movimento 26 de Julio se hicieron eco de esa declaración (Pérez-Stable, 1993: 128)

Desse modo, Pérez-Stable (1993) esclarece que a facção mais anticomunista do Movimento 26 de Julho formou a Frente Obrero Humanista (FOH). Em contrapartida o PSP fazia duras criticas à direção da CTC por impedir as greves e também por atender constantemente aos pedidos do governo e do Ministério do Trabalho para negociar e evitar as greves. As divergências eram tão declaradas que o jornal Revolución ligado ao Movimento 26 de Julio desencadeou uma campanha contra o PSP, na qual mostrava a história de colaboração do partido em vários governos passados em Cuba, inclusive no primeiro governo de Fulgencio Batista no final dos anos 30 e início dos anos 40. A autora ainda relata que no congresso da CTC, em maio de 1959, Fidel Castro pessoalmente pediu moderação a ambos os lados e que: “De forma similar, insinuó que la cooperación entre el Movimiento 26 de Julio y el PSP era un elemento fundamental en la lucha contra los enemigos de la revolución” (Pérez-Stable, 1993: 129). Contudo as partes não chegaram a um acordo, os ânimos e as acusações eram intermináveis. Fidel Castro vinha concentrando cada vez mais o poder em suas mãos e retorna ao congresso para demonstrar sua insatisfação com o sectarismo:

Fue entonces cuando Fidel regresó al congreso y reprendió a los delegados por su comportamiento casi sedicioso; preguntó qué hubiera pasado si los delegados hubieran estado armados y dijo que procedimentos semejantes socavaban la moral de la clase obrera. Afirmó que él también tenía derecho a hablar en nombre del Movimiento 26 de Julio, y que por eso pedía la unidad de los líderes de la CTC (Pérez-Stable, 1993, p. 129).

Mesmo com o apelo de Fidel Castro não houve um acordo amplo e o máximo de costura política alcançado, mesmo com o empenho do próprio Primeiro-Ministro da revolução, foi um comitê executivo sem os quadros do PSP e os membros da facção radical Frente Obrero Humanista, contudo mantida a hegemonia sindical do Movimento 26 de Julho. Os debates entre o PSP e o Movimento 26 Julho continuaram até meados de 1960 quando a ilha se unifica na luta nacionalista contra o imperialismo norte-americano, sem, contudo desaparecer as contradições entre esses ferrenhos adversários. Estas lutas intestinais descontentavam os principais líderes revolucionários Fidel Castro, Ernesto Che Guevara e Raúl Castro entre outros, e levaram-nos a defender a centralização do movimento social e a construção de um partido único em defesa da revolução, como veremos mais adiante.

A pouco mais de um mês de governo provisório o Primeiro-Ministro escolhido pelo presidente Manuel Urrutia, José Miró Cardona, foi demitido. Na Constituição assinada às pressas no dia 7 de fevereiro de 1959 os poderes do cargo de Primeiro – Ministro haviam sido consideravelmente ampliados. Não por coincidência no dia 13 de fevereiro desse mesmo ano, José Miró Cardona caiu. Fidel Castro assume o poder imediatamente e o Presidente Manuel Urrutia é posto em segundo plano. Desta forma Fidel Castro como líder do Movimento 26 de Julho demonstrou porque não se impôs ao tratado de Caracas: ora ele sabia esperar e novamente surpreendia. Após menos de dois meses o governo já estava nas suas mãos o que demonstra que os comandantes do Exercito Rebelde sabiam quem de fato detinha o poder na ilha.

O governo dos Estados Unidos da América já em 1959 passa a perceber que as principais lideranças da Sierra: Fidel Castro, Ernesto Che Guevara, Raúl Castro, entre outros, tinham um projeto político bem delineado, e começaram as campanhas internacionais contra Cuba. As imagens dos fuzilamentos, “los paredones” tornam-se o alvo de uma campanha internacional contra o governo cubano. Em Cuba essas mesmas imagens tinham outro significado: eram chamadas de: “Tribunales Revolucionarios”. Os tribunais eram públicos e eram inclusive televisionados. A própria população era quem condenava ou não aos julgados. O tema é controverso:

Ao contrário do que era divulgado, as pessoas não eram pegas a esmo (....)

consistia em estabelecer julgamentos públicos de elementos que comprovadamente haviam cometido crimes em larga escala contra a população. Ao se estabelecer os “Tribunais Revolucionários” com seus televisionados julgamentos públicos, a revolução evitou que os populares procedessem a desordenados atos de vingança que poderiam resultar em verdadeiros assassinatos em massa. Partindo do principio de que se o Estado não administrasse a justiça, o povo a faria com as próprias mãos, a justiça revolucionária, na verdade, impediu um verdadeiro derramamento de sangue (Mao Junior, 2007, p. 324- 325).

Não é de se estranhar que após uma revolução a população exija vingança contra os que cometeram crimes no regime passado. O Estado e o Governo Provisório não tinham como ignorar essa exigência de justiça. Mas a afirmação de que o governo revolucionário não intervinha diretamente nos julgamentos públicos tem sido muito discutida pela historiografia sobre a revolução cubana. De fato, há um julgamento público em que ficou notória a intervenção oficial: foi o julgamento de pilotos da antiga força aérea cubana. Pérez-Stable relata que “Pocos protestaron cuando, por órdenes de Fidel Castro, unos pilotos de la fueza aérea, que habían quedado absueltos de los crímenes de guerra que se les imputaban, volvieron a ser juzgados y, esta vez, condenados” (1993, p. 118).

Como podemos perceber, o prestigio de Fidel Castro interferiu diretamente no resultado. Naquele momento a ampla maioria da população cubana queria que se fizesse justiça aos anos de ditadura e aos crimes cometidos por Batista e pedia que condenassem a morte seus principais colaboradores. Sobre isso, Carlos Franqui (1981, p.36) testemunha:

Os crimes e as torturas cometidos pelo regime de Batista foram inumeráveis. Mas incluíam a experiência da revolução frustrada de 1930, que traumatizou a nação. Os criminosos do regime de Machado nunca foram levados a julgamento: eles matavam pessoas, com Batista de 1934 a 1939, e novamente com Batista, de 1952 a 1958. O fato de a justiça nunca ter sido feita acarretou um desejo de vingança. (...) Fidel convocou o povo ao Palácio Nacional. Lá ele perguntou à multidão – inaugurando um estilo que posteriormente chamaria de democracia direta – se achavam que os criminosos de guerra deveriam ser fuzilados. “Ponham eles contra a parede!”, alguns gritaram. Então, um “Sim!” colossal ressoou em resposta à pergunta de Fidel. Uma pesquisa nacional, feita confidencialmente, indicou que 93% dos entrevistados concordavam com as sentenças e as execuções. Eu também concordava.

Dessa forma, o governo cubano, agora chefiado por Fidel Castro, deu à maioria da população cubana a possibilidade de fazer a justiça que ela almejava. Mas o governo não deixou de utilizar esses mecanismos também para eliminar adversários, como foi o caso dos pilotos das Forças Aéreas da ditadura de Batista. É importante não esquecer que embora a revolução tivesse o apoio da ampla maioria dos cubanos, ainda havia opositores, sobretudo nas serras do Escambray.


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Fonte:
RICKLEY LEANDRO MARQUES: "A CONDIÇÃO MARIEL: memórias subterrâneas da experiência revolucionária cubana - 1959-1990". (Tese         apresentada         ao           Programa              de           Pós-graduação em História da Universidade de Brasília, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Doutor em História. Orientador: Prof. Dr. Jaime de Almeida). Brasília- DF, 2009.



Notas:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese.
As notas e referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.
O texto postado é apenas um dos muitos tópicos abordados no referido trabalho.
Para uma compreensão mais ampla do tema, recomendamos a leitura da tese em sua totalidade.
Disponível digitalmente no site DOMINIO PUBLICO

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