Eu li isso...

"O livro Origin of species publicado em 1859 produziu um grande impacto dentro da comunidade científica britânica constituída principalmente por anglicanos que acreditavam que as espécies eram fixas. Charles Darwin defendia nessa obra que as espécies se transformavam umas nas outras e que o processo evolutivo ocorre principalmente de maneira lenta e gradual através de acúmulo de pequenas modificações sobre as quais age a seleção natural. A seleção natural seria para ele, o principal mecanismo de transformação das espécies, embora não o único. Apesar de admitir que a transformação de espécies pudesse também ocorrer em um único passo, considerava que isso teria uma importância mínima no processo evolutivo. Além disso, Darwin aceitava a existência de herança com mistura (às vezes chamada de hereditariedade “soft”) que era um modo pelo qual a natureza podia conservar a uniformidade das espécies apesar da variabilidade que ocorria em cada geração. Alguns anos mais tarde, para explicar a herança, ele propôs a hipótese da pangênese que permitiria a produção de uma variabilidade suficiente para que a seleção natural pudesse atuar. Porém, a teoria de Darwin tinha problemas, pois não explicava adequadamente como as variações sobre as quais a seleção natural agia eram produzidas.

Muitos investigadores acreditavam que a seleção natural não era suficiente para produzir uma diversidade nas espécies.No final do século XIX vários estudiosos como Karl Ernst von Baer (1792-1876), Rudolph Albert von Kölliker (1817-1905) e Karl Wilhelm von Nägeli (1817-1891) criticavam a seleção natural e procuravam explicar as variações que ocorriam nos organismos de modo diferente, considerando a influência do meio. Nesta época havia diversos estudos sobre a influência direta das condições do meio sobre a variação na estrutura dos organismos e discutia-se se os fatores responsáveis pela mesma estavam relacionados ao própr io meio ambiente ou à seleção natural. Vários deles admitiam que o grau de salinidade da água, por exemplo, poderia alterar a estrutura de protozoár ios, crustáceos e ouriços do mar.

Os estudos sobre a hereditariedade sofreram uma grande mudança depois da adoção dos princípios mendelianos, a partir de 1900. A proposta de Mendel que apareceu em seu artigo sobre a formação de híbridos (1866) baseada principalmente em estudos envolvendo cruzamentos experimentais de ervilhas do gênero Pisum admitia a existência de elementos celulares encontr ados nos gametas responsáveis pela transmissão das características hereditár ias os quais não se misturavam e que seguiam determinados padrões que não eram universais.

William Bateson (1861-1926) publicou a tradução para o inglês do artigo de Mendel em seu livro Mendel’s principles of heredity: a defence (1902), já trabalhava com cruzamentos experimentais envolvendo não apenas vegetais mas também animais como borboletas e galinhas. Juntamente com seus colaboradores (Leonard Doncaster, Reginald Crundall Punnett e Edith Saunders) procurou verificar se os princípios que Mendel tinha encontrado em ervilhas se aplicavam aos outros organismos. Além disso, buscou desvios dos padrões mendelianos propondo novas leis, desenvolvendo o chamado “ programa de pesquisa mendeliano”. Os resultados obtidos nos cruzamentos experimentais que Bateson realizou reforçavam a idéia da descontinuidade das variações e minimizavam o papel da seleção natural no processo evolutivo, priorizando o papel da evolução saltacional8. Na época, além de Bateson, diversos pesquisadores como Thomas Hunt Morgan (1866-1945), por exemplo, consideravam que a seleção natural sozinha, não poder ia dar conta da formação de novas espécies.

O livro Mendel’s principles of heredity: a defence, de autoria de Bateson, foi uma resposta às inúmeras críticas que haviam sido feitas por parte do biólogo Walter Frank Raphael Weldon (1860-1906) e do matemático e estatístico Karl Pearson (1857-1936) não apenas aos princípios mendelianos como também à forma pela qual Bateson os interpretava. Pearson e Weldon desenvolviam estudos estatísticos em populações sobre a herança de características que eram herdadas de modo contínuo como, por exemplo, a estatura do povo inglês, em cuja herança existe uma gradação de possibilidades entre estaturas mais baixas e as mais elevadas. Este tipo de estudo substanciava, portanto, a idéia de que a evolução era principalmente gradual e conferia um papel importante à seleção natural no processo. As diferentes interpretações acerca do processo evolutivo bem como de aspectos relacionados à hereditariedade provocaram uma das mais acirradas controvérsias da história da biologia: a controvérsia mendeliano-biometricista. Esta se deu principalmente entre 1902 e 1906 na Grã Bretanha, envolvendo por um lado William Bateson, Charles Chamberlain Hurst e outros e, por outro lado, Weldon e Pearson e outros. Esta dizia r espeito, entre outr os, a aspectos relacionados ao processo evolutivo (continuidade / descontinuidade das variações) e a relevância da seleção natural no processo” (p. 5-8).

Fonte:
Waldir Stefano. “Os estudos experimentais de Herbert Spencer Jennings com protozoários (1908-1912): aspectos evolutivos e genéticos". (Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em História da Ciência, sob a orientação da Profa. Doutora Lilian Al-Chueyr Pereira Martins. São Paulo, 2009).

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