O processo de Hominização segundo Teilhard de Chardin

"A vida é contínua ascensão de consciência e de unidade, por isso, não pára. Na subida rumo a um novo grau de consciência, ela ultrapassa mais um limiar ascendendo à hominização. O conceito de hominização (ou passo da reflexão) é explicitado em O Fenômeno Humano:

Hominização é, antes de tudo, se se prefere, o salto individual, instantâneo, do instinto para o pensamento. Mas Hominização é também, num sentido mais lato, a espiritualização filética, progressiva, na Civilização humana, de todas as forças contidas na Animalidade
.

Isto é, quando as estruturas do organismo são favoráveis, um acréscimo de esforço no eixo da Evolução inverte o equilíbrio interior e acontece o salto.

Teilhard esclarece que isto se dá porque “o que não era senão superfície centrada tornou-se centro. Devido a um acréscimo “tangencial” ínfimo, o “radial” voltou-se sobre si mesmo e saltou até ao infinito para frente [...] Pela primeira vez na Terra, a consciência dobra-se sobre si mesma, até se tornar Pensamento”. É o início de uma outra espécie de vida: a vida interior. É o caminho rumo à civilização: um outro mundo que nasce.

Segundo Chardin, a passagem da espécie imediatamente anterior para a espécie humana foi absoluta, sem intermediário, apesar de ter sido longamente preparada no tempo. “Evidentemente [....] trata-se de um salto do super animal ao pré-hominóide”. Na obra El grupo zoológico humano Teilhard representa graficamente o “feixe dos Hominídios” em um esquema onde os fósseis aparentados são representados por traços semelhantes a “escamas” a humanidade atual por uma espécie de “corola”, que passa de divergente, em seu início, para convergente, fechando-se sobre si mesma.

Nesse movimento de convergência Teilhard indica a existência de um novo passo de organização coletiva da humanidade em um território limitado. A transição da espécie dos primatas aos humanos é representada por um espaço em branco que corresponde ao seu desenvolvimento continuado e desconhecido. Teilhard afirma que “o Homem não é mais do que unus inter pares entre os demais animais”, com uma peculiaridade de nunca ultrapassar o estádio da espécie, diferenciando-se em raças.

A pressão evolutiva chegando à hominização aponta para uma outra mudança de estado, sob a ação da Lei de Complexidade e de Consciência. “O universo é uma evolução; essa evolução é uma subida para o espírito: esse movimento ascendente atingiu com a humanidade um ponto culminante que é a noosfera”. Noosfera é uma fina película, inicialmente quase imperceptível, ao ser comparada com as outras grandezas do universo. É por meio dessa película que se pode apreender e contemplar a Energia Universal.

Teilhard de Chardin define reflexão como “o poder adquirido por uma consciência de se dobrar sobre si mesma e de tomar posse de si mesma como de um objeto dotado de sua própria consciência e de seu próprio valor” capaz de se conhecer e de ser ciente de seu saber. Com o ser humano aparecem a inteligência e a vida interior, pela primeira vez. Para Teilhard, com o surgimento da capacidade de reflexão se ultrapassa mais um ponto crítico da Evolução com uma nova mudança de estado: “após o grão da Matéria, após o grão da Vida, eis o grão do Pensamento enfim constituído” e com ele a gênese da Noosfera. A noosfera tem origem por um processo exatamente igual ao surgimento da vida, devido a um enrolamento conjugado da consciência sobre si mesma.

Teilhard explica que, com a noosfera, “a Terra ‘muda de pele’, melhor ainda, encontra sua alma”. Com o novo passo da Reflexão, inicia-se o desenvolvimento do Espírito – a Noogênese: nova organização e expansão das energias.

Se o avanço da Evolução foi acontecendo por “tateio”, “invenção” e “mutação”, com o surgimento de grupos zoológicos e do próprio homem como a flecha dessa evolução, ao cruzar o limiar do Pensamento a Terra dá mais um passo, desencadeando o desenvolvimento do Espírito. “Quando, pela primeira vez, num ser vivo, o instinto se avistou no espelho de si próprio, o Mundo inteiro deu um passo”.

Acontece, portanto, um novo movimento de centralização, de ordem interior, de organização consciente. Há uma passagem singular feita sem intermediários. A consciência humana, assim, apropria-se de uma nova ordem de organização, adquirindo uma tripla capacidade de centrar-se: a si mesmo, o mundo ao seu redor e o outro. Em palavras teilhardianas, isso significa avançar rumo a uma megassíntese no Tangencial. “E, por isso mesmo, um salto para diante das energias radiais, segundo o eixo principal da Evolução. Cada vez mais complexidade e, portanto, cada vez mais Consciência. [...] Evolução = Ascensão de consciência. Ascensão de consciência = Efeito de união.”

Fonte:
MARIA APARECIDA DE SOUZA: “CRIAÇAO E EVOLUÇÃO em diálogo com Teilhard de Chardin” (Dissertação apresentada, como requisito para a obtenção do grau de Mestre, pelo programa de Pós-graduação da Faculdade de Teologia, na área de concentração em Teologia Sistemática, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul). Orientador: Prof. Dr. Leomar Antonio Brustolin, Porto Alegre, 2007.

Nota
:
A imagem em destaque não se inclui na referida tese.

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