A paixão cega por uma causa cega

Num trecho que corrobora o título de seu livro “O Relojoeiro Cego”, Richard Dawkins aponta a Seleção Natural como o único e exclusivo proceso pelo qual a vida originou-se e se desenvolveu. Escreve ele:

“O argumento de Paley é defendido com uma sinceridade apaixonada e informado pelo melhor saber biológico do seu tempo, mas está errado, gloriosa e absolutamente errado. A analogia entre um telescópio e um olho, entre um relógio e um organismo vivo é falsa. Pese embora a todas as aparências em contrário, o único relojoeiro da natureza são as forças cegas da física, se bem que desdobradas de forma muito especial. Um verdadeiro relojoeiro tem antevisão: concebe as suas engrenagens e molas e planeia as suas inter-relações com um objetivo futuro, com os olhos da sua imaginação. A seleção natural, o processo cego, inconsciente e automático que Darwin descobriu e que hoje sabemos ser a explicação para a existência e para a forma aparentemente intencional de toda a vida, não imagina qualquer objetivo. Não tem imaginação nem olhos da imaginação. Não planeia para o futuro. Não tem visão, nem antevisão, não tem qualquer sentido da vista. Se se quiser atribuir-lhe qualquer papel de relojoeiro na antureza, será o relojoeiro cego” ("O Relojoeiro Cego": Tradução de Isabel Arez Capa. Edições 70. Lisboa).

Exatamente acerca deste trecho do livro de Dawkins, comenta Michael Behe, em seu livro “
A Caixa Preta de Darwin”, publicado e traduzido no Brasil pela Editora Zahar:

“Paley expressa t
ão bem o argumento do planejamento que desperta o respeito até de evolucionistas ferrenhos. Richard Dawkins tirou o título de seu livro, O relojoeiro cego, da analogia do relógio traçada por Paley, mas alega que a evolução, e não um agente inteligente, representa o papel do relojoeiro:

Paley apresenta seu convincente ponto de vista com belas e reverentes descri
ções da maquinaria dissecada da vida, começando com o olho huma­no... O argumento de Paley é exposto com apaixonante sinceridade c baseado na melhor erudição biológica de sua época, mas é errado, gloriosa e totalmente errado... Se podemos dizer [que a seleção natural] representa o papel do relojoeiro na natureza, é o do relojoeiro cego... Uma coisa que não farei é depreciar a maravilha dos "relógios" vivos que tanto inspiraram Paley. Muito ao contrário, tentarei passar minha certeza de que, neslc particular, Paley poderia ter ido ainda mais longe.

Os sentimentos de Dawkins em rela
ção a Paley são os de um conquistador em relação a um inimigo valoroso, mas derrotado. Magnânimo na vitória, o cientista de Oxford pode se dar ao luxo de render homenagem ao clérigo que compartilhava de seu próprio encanto com a complexidade da natureza. Certamente Dawkins tem razão em considerar Paley derrotado: poucos filósofos ou cientistas a ele se referem, mesmo de passagem. Os que o fazem, como Dawkins, agem assim apenas para ignorar, e não para discutir seu argumento. Paley foi enterrado juntamente com a astronomia centrali­zada na Terra e a teoria do flogístico — outro derrotado na luta da ciência para explicar o mundo.

Mas exatamente em que ponto, poder
íamos perguntar, Paley foi refuta­do? Quem rebateu seu argumento? De que maneira foi produzido o relógio, sem um planejador inteligente? É surpreendente, mas verdadeiro, que o principal argumento do desacreditado Paley nunca foi refutado de fato. Nem Darwin nem Dawkins, nem a ciência nem a filosofia explicaram como um sistema irredutivelmente complexo como um relógio poderia ser produzido sem um planejador. Em vez disso, o argumento de Paley foi desviado do alvo por ataques a seus exemplos mal escolhidos e por discussões teológicas despropositadas. Paley, é claro, merece censura por não ter ordenado seu ponto de vista com maior precisão. Mas muitos de seus detratores também são censuráveis por se recusarem a discutir seu argumento principal, bancando os bobos para chegar a uma conclusão que lhes fosse mais aceitável.”

E conclui Behe:

"Pobre Paley. Seus advers
ários modernos sentem-se justificados em supor pontos de partida imensamente complexos (como um relógio ou uma retina), se pensam que podem explicar um melhoramento simples (tal como a tampa do relógio ou a curvatura do olho). Nenhum outro argumento é apresentado, nenhuma explicação é dada da complexidade real, da complexidade irredutível. E afirmam que a refutação dos exageros de Paley é uma refutação de seu principal argumento, mesmo aqueles que sabem que não é bem assim” (A caixa Preta de Darwin”. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997, p. 217, 218).

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É isso!

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