Classe social no Brasil

“Para Guimarães (idem, pg.14), o conceito de classe social no Brasil surgiu dentro de uma disputa entre a antropologia e a sociologia. A primeira tratava o conceito de maneira descritiva, ou seja, relacionada aos estudos de comunidade, e a segunda reivindicava um tratamento explicativo para os fenômenos sociais, que seriam os estudos histórico-estruturais da sociologia, e daí seria possível conhecer a origem, estrutura e a dinâmica das sociedades de classes. Com o fortalecimento da corrente sociológica e da consolidação das economias industriais ao longo do século XX, as relações sociais determinadas pelo processo de industrialização passaram a explicar diversos fenômenos no Brasil e no mundo. A busca pelo desenvolvimento e o fortalecimento do socialismo geraram uma expectativa de que as classes sociais poderiam adquirir consciência da sua condição (de classe) para assumir seu papel histórico (GUIMARÃES, 2002 : 16). Ao buscar os agentes do processo de industrialização, a sociologia brasileira se deparou com o papel preponderante do Estado que acabou por ocupar a posição de sujeito das transformações do desenvolvimentismo capitalista, deixando de lado o papel dos atores sociais autônomos, ou não.

Outros estudos buscaram uma vertente culturalista para analisar o Brasil (FREYRE, 1969; HOLANDA, 1936; FAORO, 1958). Nestas análises, as classes sociais foram colocadas em segundo plano em prol da busca de um ethos nacional. Neste sentido, o Estado foi colocado em primeiro plano a partir de seu viés patrimonialista, nacionalista, populista e autoritário. Posteriormente, apenas quando se percebeu que não haveria a consecução de uma revolução burguesa no Brasil (FERNANDES, 1974) é que se buscou analisar outros sujeitos políticos que não apenas a burguesia.

Para Guimarães, (2002: 20) os estudos sobre a classe trabalhadora realizados antes do golpe de 1964 foram fortemente marcados por um viés sociológico estruturante, onde se buscava o potencial político daqueles trabalhadores, algo que foi solapado com o golpe militar. Segundo o autor, na década de 70, estes estudos foram retomados no ritmo da resistência à ditadura, mas a partir daí, buscavam reinterpretar criticamente a relação entre a classe trabalhadora e o sindicalismo.

O que se buscava neste momento era uma explicação teórica para as limitações deste grupo como sujeito da história. O que surgiu de mais profícuo neste momento foi a constatação quase generalizada de que a mudança social não viria do combate entre dois Estados Nação, como se depreendia da ideologia nacional-desenvolvimentista, mas sim que poderia surgir da luta de classes, como pregava o marxismo clássico. Neste momento também surgiram com bastante vigor os conceitos de Gramsci, Poulantzas e Althusser, como guerra de posições, categorias sociais, bloco histórico, hegemonia, frações de classe e tantos outros.

Ainda em Guimarães (2002 : 29-30), os estudos sobre a classe operária no Brasil se dividiram em quatro vertentes:
- Estudos sobre o sindicalismo, baseados em uma perspectiva de representação política e estrutural das classes;
- Estudos de valores e atitudes da classe operária, que percebiam as classes como associações e não como comunidades, e a identidade surgiria das características de sociabilidade de seus membros;
- Estudos do processo de trabalho e de seu cotidiano. Neste momento, as classes foram vistas como determinadas pelo mundo da produção e a organização política como espaços para tutelagem estatal ou corporativista;
- Estudos de cidadania, que partiram da hipótese de que os indivíduos realizavam e atualizavam direitos civis de natureza coletiva.

Como fica possível depreender destas categorias criadas por Guimarães (idem: 37), a teoria de classes no Brasil acabou por acumular alguns vícios que a tornaram uma simples análise abstrata de categorias reificadas.

O sistema político por outro lado, se tornou mais acessível à representação dos interesses dos indivíduos, que não necessariamente poderiam ser classificados como interesses de classes. Quando muito, poderiam ser vistos como interesses corporativos. Além disso, as camadas subalternizadas da sociedade também ganharam espaço para apresentar algumas de suas demandas, o que amplia sua importância para a análise sociológica e política.

Neste sentido, é preciso desvincular um conceito de classe descritivo, ou seja, que parte da análise da estrutura hierárquica, associada aos bens econômicos, culturais e privilégios, de um conceito teórico de classes que possa representar sociologicamente uma sociedade. Por conseguinte, em países como o Brasil, com forte discriminação racial, uma visão descritiva da sociedade pode erroneamente apontar o racismo como um problema de classe, já que ele implica em desigualdades sociais. Sobre isto, Robinson (1983) aprofunda o debate ao buscar as origens da variável raça conforme conhecemos na história contemporânea e relacionar o desenvolvimento deste conceito ao surgimento do capitalismo e posteriormente do movimento socialista”.

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É isso!

Fonte:
GUSTAVO FREITAS AMORA: “RAÇA E REPRESENTAÇÃO POLÍTICA: Uma análise das eleições para Deputado Federal no Distrito Federal, 2006). Dissertação de mestrado apresentada como requisito parcial à obtenção do título de mestre em Ciência Política do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília - IPOL/UnB. Orientadora: Profa. Dra. Flávia Millena Biroli Tokarski). Brasília – DF, 2008.

Nota:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese.
As referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.

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