Dos delírios de Dawkins - I


“Se este livro funcionar do modo como pretendo, os leitores religiosos que o abrirem serão ateus quando o terminarem”
(DEUS, UM DELÍRIO, p. 23).

Tomei por bem aceitar o "desafio" de Dawkins!


Vejamos até que ponto os “argumentos contundentes e muito bem embasados para questionar a tese do design inteligente e a própria existência de Deus” são capazes de persuadir um “fundamentalista religioso”!

Bom. Quem já leu o ateu Nietzsche, com seu estilo audacioso e linguagem cheia de cores, talvez desista de Dawkins já no início do seu “Delírio”. Bom, mas talvez Dawkins não tenha lido Nietzsche. Sendo assim, é sempre bom dá-lhe um desconto! ((rs))

É certo que todos conhecem a profundidade de um pires!

Pois é...

(Todas as citações a seguir, em negrito, fazem parte do livro "Deus, um Delírio", de Richard Dawkins, publicado pela Companhia das Letras).

E vamos aos pires...

“E nunca me canso de chamar a atenção para a aceitação tácita, por parte da sociedade, da rotulação de crianças pequenas com as opiniões religiosas de seus pais. Os ateus precisam se conscientizar da anomalia: a opinião religiosa é o tipo de opinião dos pais que — por consenso quase universal — pode ser colada em crianças que, na verdade, são pequenas demais para saber qual é sua opinião. Não existe criança cristã: só filhos de pais cristãos. Use todas as oportunidades para marcar essa posição”
(p. 12, 13).

Oh, sim!
O indiozinho não é índio, é apenas uma criança; o filho de cigano não é cigano, é apenas uma criança. Sim, porque se seus pais não fossem índios e ciganos, elas certamente não receberiam os “rótulos” de índios e ciganos. Talvez até fossem ateus ou pequenos dawkinianos, porém índios e ciganos, jamais!

O que seria, afinal, mais proveitoso? Incentivar uma criança a dançar ao ritmo de “Jesus Alegria dos homens” (de Bach) ou estimulá-la desde pequena a ler pequenas porções literárias do grande Richard Dawkins ou, quem sabe, oferecer-lhe "Darwin em Quadrinhos"?

Para
Dawkins há apenas duas alternativas aos pais católicos que têm filhos pequenos e que gostam de freqüentar os templos nos fins de semana: desistir de ir à missa ou deixar o garotinho de 5 anos em casa sozinho, quem sabe aprendendo soletrar D-A-W-K-I-N-S! Sim, afinal, levá-lo à igreja seria uma violência “comparável até ao abuso sexual” (sic).

Na verdade, aprofundidade dos argumentos do senhor Dawkins nos leva a ponderar seriamente sobre a possibilidade de deixemos à mercê dos nossos pequeninos o direito de escolherem, quando enfermos, o remédio que quiserem tomar, a roupa que quiserem vestir, a escola que quiserem freqüentar e assim por diante... Uma anarquia juvenil a serviço da ciência, quem sabe!

A par disto, deveriam os pais católicos, estando com seus filhos, evitar benzerem-se ao passar frente a um templo, a fim de “preservar” o sacrossanto direito de escolha de cada um deles? Devem os religiosos transformar suas orações em rituais secretos, distantes dos filhos, a fim de que estes não sejam “contaminados” pelos “maléficos” ritos religiosos?

Vamos supor que um pai religioso proíba o seu filho de imitar seus gestos religiosos em benefício de sua futura capacidade de escolha. Qual seria a possibilidade desta criança em imitá-lo mesmo em face à proibição? Todos conhecem o jargão popular que diz que “o fruto proibido é mais apetecido!”




E vamos aos pires...

Fazendo uso de uma retórica bastante encontradiça em certos tipos discursos, que consiste em apresentar os argumentos contrários e, em seguida, refutá-los,
Dawkins procura transmitir a falsa impressão de que tais argumentos poucos dizem acerca da realidade dos fatos. Mas, será isso mesmo?

Vejamos alguns pontos extraídos de resenhas, que, segundo
Dawkins, são os mais negativos contra sua obra. Comecemos por este:


"VOCÊ É TÃO FUNDAMENTALISTA QUANTO AQUELES QUE CRITICA"


- Quem, eu? indagaria Dawkins!

-
“Não, por favor, é fácil demais confundir uma paixão capaz de mudar de opinião com fundamentalismo, coisa que nunca farei ” (p. 13).

- Oh, sim! Eu não tenho o perfil fundamentalista de Kurt Wise. Eu posso naturalmente mudar de opinião. Posso até aceitar críticas ao meu estimado e idolatrado darwinismo! Mas, pode mesmo?

Façamos então uma ligeira comparação:

KURT WISE:

"...se todas as evidências do universo se voltarem contra o criacionismo, serei o primeiro a admiti-las, mas continuarei sendo criacionista, porque é isso que a Palavra de Deus parece indicar " (citado por Dawkins).

RICHARD DAWKINS:
“Se eu estou correto, isso significa que mesmo que não exista qualquer prova factual para a teoria de Darwin, é certamente justificável aceitá-la acima de todas as outras teorias” (“The Blind Watchmaker”, p. 337).

O quê?
Parece que Dawkins anda esquecendo aquilo que escreve! ((rs))

Ou seja, qualquer semelhança entre DAWKINS
, um ATOR e um HIPÓCRITA a etimologia grega explica. Sim, porque quem conhece ainda que superficialmente a postura militante pró-ateísmo de Dawkins, dificilmente acreditará nesta sua manifestação de fingidas virtudes.

Bom, mas dizem que Lênin, ao sentir a chegada da “indesejada das gentes”, exclamou: “Cometi um grande erro. A sensação de viver perdido num oceano de sangue derramado por inumeráveis vítimas, persegue-me!”

E Dawkins
então continua...

“Cristãos fundamentalistas são apaixonadamente contra a evolução, e eu sou apaixonadamente a favor dela. Paixão por paixão, estamos no mesmo nível. E isso, para algumas pessoas, significa que somos igualmente fundamentalistas”
(p. 13).

Se o texto se finalizasse por aqui, estaríamos, eu diria, diante de um fato inusitado, digno de uns bons encômios ao zoólogo inglês. Todavia, porém, contudo, entretanto... Segue ele:

"Mas, parafraseando um aforismo cuja fonte eu não saberia precisar, quando dois pontos de vista contrários são manifestados com a mesma força, a verdade não está necessariamente no meio dos dois. É possível que um dos lados esteja simplesmente errado. E isso justifica a paixão do outro lado.
Os fundamentalistas sabem no que acreditam e sabem que nada vai mudar isso” (p. 13).

Aqui ele descreve com exímia maestria a sua própria postura diante daquilo que o conduz!

E faz menção de Kurt Wise, acrescentando:


"A diferença entre esse tipo de compromisso apaixonado com os fundamentos bíblicos e o compromisso igualmente apaixonado de um verdadeiro cientista com as evidências é tão grande que é impossível exagerá-la. O fundamentalista Kurt Wise declara que todas as evidências do universo não o fariam mudar de opinião. O verdadeiro cientista, por mais apaixonadamente que "acredite" na evolução, sabe exatamente o que é necessário para fazê-lo mudar de opinião: evidências”.


Sinceramente eu não entendo como certas pessoas são incapazes de vislumbrar ainda que minimamente a tamanha impostura de Richard Dawkins! Sim, porque uma pessoa a qual, na ânsia por respeitabilidade científica para sua crença no Darwinismo Universal, chega a colocar a seleção natural na mesma posição de uma divindade, sinceramente só pode estar de pilhéria!

E, aqui, mais outro argumento que
Dawkins tenta refutar:


"VOCÊ SEMPRE ATACA O QUE HÁ DE PIOR NA RELIGIÃO E IGNORA O QUE HÁ DE MELHOR"


"Você persegue oportunistas grosseiros e incendiários como Ted Haggard, Jerry Falwell e Pat Robertson, em vez de teólogos sofisticados como Tillich ou Bonhoeffer, que ensinam o tipo de religião em que acredito.

Se o predomínio fosse só dessa espécie sutil e amena de religião, o mundo sem dúvida seria um lugar melhor, e eu teria escrito outro livro.
A melancólica verdade é que esse tipo de religião decente e contido é numericamente irrelevante. Para a imensa maioria de fiéis no mundo todo, a religião parece-se muito com o que se ouve de gente como Robertson, Falwell ou Haggard, Osama bin Laden ou o aiatolá Khomeini. Não se trata de testas-de-ferro; são todos influentes demais e todo mundo hoje em dia tem de lidar com eles”
(p.11).

Não tenho dúvida de que esta resposta de
Dawkins faria muito sentido caso ele estivesse se referindo ao que a religião fez, por exemplo, durante a Idade Média. Todavia, afirmar que a boa religião de hoje “é numericamente irrelevante”, além de uma nítida demonstração de desonestidade, revela na mesma proporção uma jibóica falta de conhecimento acerca do que realmente se passa nos círculos religiosos em geral!

Mas é claro!
Dawkins está apenas preocupado em provar que a religião é má. Daí as constantes referências a exemplos do tipo jihadistas. Obviamente não se pode esperar honestidade de alguém que "ingenuamente" foi capaz de escrever que não acredita que haja um ateu no mundo que demoliria Meca — ou Chartres, a York Minster ou Notre Dame, o Shwedagon, os templos de Kyoto ou, claro, os Budas de Bamiyan (p. 259).




Em "The Atheist Syndrom", por exemplo, John Koster revela:

“Hitler e Stalin assassinaram mais vítimas inocentes do que as que morreram em todas as guerras religiosas na história da humanidade. Eles não assassinaram essas vítimas enganados pela idéia de salvar as suas almas ou punir os seus pecados, mas por serem competidores na questão do alimento e obstáculos ao “progresso evolutivo”.


Muitos humanitários, cristãos, judeus, ou agnósticos compreenderam a relação entre as idéias de Nietzsche e as equipes de assassinato em massa e os crematórios de Hitler. Poucos, porém, voltaram um passo atrás fazendo a ligação com Darwin, o “cientista” que inspirou diretamente a teoria do super-homem de Nietzsche e o corolário nazista de que alguns indivíduos são subumanos. A evidência estava toda ali — o termo neodarwinismo foi usado abertamente para descrever as teorias raciais nazistas.


A expressão “seleção natural”, como aplicada a seres humanos, foi encontrada na Conferência de Wannsee no principal documento do Holocausto...
Podemos ver os eventos na Alemanha de Hitler e na Rússia de Stalin como uma coleção sem sentido de atrocidades que tiveram lugar porque os alemães e os russos são pessoas perversas, nada parecidas conosco. Ou podemos compreender que a imposição das teorias de Huxley e Darwin, de que a-vida-é-patológica, de depressão clínica disfarçada em ciência, desempenhou um papel crítico na era das atrocidades. E que isso nos sirva de aviso. As pessoas têm de aprender a deixar de pensar em seus semelhantes como se fossem máquinas e aprender a pensar neles homens e mulheres possuidores de uma alma...” (p.187-189.).

E, para finalizar, vão aqui estes pertinentes comentários de Alister McGrath, em “O Delírio de Dawkins":

“A visão ingênua e pueril de
Dawkins de que os ateus nunca cometem crimes em nome do ateísmo tropeça nas cruéis pedras da realidade. Um exemplo será suficiente. Em seu excelente estudo sobre Peter Tutea (1902-1991), intelectual e dissidente romeno de confissão cristã, o pesquisador de Oxford Alexandru Popescu documenta a degradação física e mental que Tutea sofreu devido à perseguição sistemática à religião na Romênia, ocorrida durante a era soviética e até a queda e execução de Nicolae Ceausescu. Durante esse período, Tutea passou 13 anos como prisioneiro por crime de consciência e 28 anos em prisão domiciliar. Seu relato pessoal é muitíssimo elucidativo para os que desejam compreender o poder da fé religiosa para consolar e manter a identidade pessoal exatamente sob as formas de perseguição que Dawkins acredita não existir. Dawkins nega o lado mais sombrio do ateísmo, o que o torna um crítico da religião menos que confiável. Possui uma fé fervorosa e inquestionável na bondade universal do ateísmo, que ele recusa sujeitar a um exame crítico.


Sim, existe muita coisa errada na religião contemporânea e muito a ser corrigido, mas o mesmo se aplica ao ateísmo, que precisa se sujeitar a um auto-exame, a um julgamento moral e intelectual que os sistemas religiosos estão dispostos a aplicar a si.

A verdade dos fatos é que os seres humanos são capazes tanto de violência quanto de excelência moral — e que ambos podem ser provocados por visões de mundo, religiosas ou não. Não se trata de uma constatação confortável, mas nos alerta para as faltas e os perigos de identificar qualquer grupo de pessoas como a fonte da violência e dos males da humanidade. Isso pode ajudar a criar um bode expiatório, mas nunca a fazer avançar a causa da civilização" (p. 11,112).

É isso!

Um comentário:

  1. Simplesmente fantástico Iba. Parabéns. Você conseguiu resumir neste post muitas das coisas que penso e sempre tive vontade de dizer.

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